[ENTREVISTA] O conceituado músico internacional guineense, Kimi Djabaté, disse numa entrevista exclusiva ao semanário O Democrata que não sabe explicar a razão porque as estações emissoras do país não passam as suas músicas, que segundo ele, são ouvidas na Europa, nos Estados Unidos e na Asia. ‘Griot – Djidiu’, nome pelo qual é conhecido pela imprensa europeia é conhecido igualmente como especialista em Balafón, é o artista guineense que mais faz ‘furor’ a nível internacional no mundo da música e representa as cores nacionais no festival britânico World Music, com o seu segundo disco intitulado Karan.
Para o griot que deixou o país em 1996, o futuro da Guiné-Bissau sairá das mãos dos guineenses, por isso “devemos valorizar aquilo que é nosso. Se dermos valor àquilo que não é nosso, estamos apenas a perder tempo. Se conseguir alguma coisa, claro que vou levá-la para a Guiné-Bissau. A música não tem nada a ver com qualquer religião, mas sim com o país. Não deve haver racismo entre nós, filhos da Guiné!”
“Eu sou griot, e não devo ter vergonha daquilo que sou, de cantar e de ser djidiu. Realmente, vim de um país onde a tradição griot não é considerada. As pessoas não percebem o valor de djidiu. Griot não se resume apenas em cantar nas festas de casamento e nos batizados ou noutras festas. Desde o século XIII, na África Ocidental foram os djidius que inventaram a música, todos os instrumentos musicais, por exemplo, djimbé, korá, balafón e outros instrumentos tradicionais”, explicou o músico.
Por outro lado, Djabaté também acredita que no futuro bem próximo isso poderá acontecer, já que Madona, confessa que ela é um fã das suas músicas.
O Democrata (OD): É um cantor famoso no mundo da música com grandes sucessos. Como entrou no mundo da música?
Kimi Djabaté (KD): Eu, como sabem, sou ‘griot’ [djidiu]. Quando alguém pergunta a um griot como entrou para o mundo da música, isso parece que a pessoa entrou na música porque quer entrar. Eu nasci na Guiné-Bissau e lá cresci, numa aldeia chamada Tabató, Setor de Bafatá e Região de Bafatá, uma tabanca tradicionalmente de griots. Em Tabató aprendi quase tudo da música, sobretudo de djidiu. Comecei a tocar aos meus três ou quatro anos de idade, especificamente o balafón, instrumento no qual sou especialista.
Muito cedo, ou seja, ainda criança participei nas festas de batizados e casamentos na minha aldeia natal e não só. Desde essa altura que estou ligado à música, cedo descobri que gosto da música. Sou quem viveu entre músicos e tive a oportunidade de ter instrumentos musicais desde muito novo. Comecei a tocar e a dançar. Daí comecei a fazer música, com meu Balafón, deslocando-me para os eventos de batizado e casamentos na companhia dos meus irmãos mais velhos.
Depois saí de Tabató para Europa em 1996 com meu balafón. Na altura, como era a minha primeira vez no velho continente, como podem ver as dificuldades daqui, fiz alguns trabalhos além da música para poder sobreviver. Consegui juntar alguma quantia em dinheiro e de seguida decidi focalizar-me na minha cultura e minha tradição que é fazer a música. É aquilo que eu conheço, desde a minha infância, porque foi a tradição djidiu que os meus pais me mostraram desde quando era criança.
OD: O senhor é compositor, guitarrista, cantor e intérprete. Podia fazer-nos um resumo do seu percurso musical?
KD: Claro! Sou compositor, guitarrista e balafonista, mas quando vim da Guiné-Bissau, não era guitarrista. O balafón ajudou-me bastante a desenvolver o meu domínio em guitarra. Cheguei a Portugal, querendo fazer a música à minha maneira, como djidiu, mas para fazê-lo, precisava de uma pessoa que me acompanhasse nas minhas composições ao meu estilo de griot e na minha língua materna- mandinga, alguém que compreendesse a minha língua, mas cheguei a conclusão que não era fácil.
Decidi que tinha que aprender a guitarra para completar a parte que me faltava. Agora sei tocar guitarra, mas não me considero grande guitarrista! Atualmente, toco as minhas músicas seja com balafón, assim como com guitarra.
OD: Depois de aprender a guitarra, como foi a experiência até gravar seu primeiro disco de originais, Teriké [Amigo]. Foi fácil ou não?
KD: Não foi fácil, mas tinha uns amigos de uma banda lusa muito conhecida em Portugal, chamada de “Blasted Mechanism”. É uma banda famosa aqui. Eram meus amigos, na altura do meu primeiro álbum. A banda deles tinha um grande estúdio, onde gravei Teriké. Os elementos da banda acompanhavam-me nas minhas atuações nos bares e restaurantes.
Às vezes convidam-me para participar nos festivais. Um dia alguns membros da banda interpelaram-me e deram uma ideia, dizendo assim: tu tens enorme talento e és nosso amigo. Porque não vais pedir ao Valdjiu o estúdio para gravar um álbum? Não vais pagar nada! Somos teus amigos! Pedro Valdjiu era outro amigo do grupo e era o diretor do estúdio de gravação da banda “Blasted Mechanism”. Respondi-lhes que não estava preparado e nem tinha experiência nos estúdios de gravação, porque na altura não tinha gravado nem sequer uma faixa musical.
Mas depois pensei e decidi ligar ao Pedro Valdjiu. Depois de lhe informar da minha intenção, ele respondeu-me: “embora… e acrescentou os meus colegas já me informaram sobre este assunto, mas se quiser gravar um disco, o estúdio é teu e não vais pagar nada. Vamos dispensar-te o estúdio durante três semanas, mas se ultrapassares as três semanas, vais pagar”. E começou a rir-se comigo, dizendo que eu é que tinha de ariscar, que se tivesse dinheiro poderia ficar um ano nos estúdios, mas que eles tinham-me oferecido apenas três semanas.
Preparei-me então. Na altura contava na minha companhia com alemães, cabo-verdianos, guineenses, italianos, angolanos e portugueses. Decidimos ensaiar antes de entrarmos para o estúdio. E disse à banda comunicar-lhes-ia depois a data em que entraria para o estúdio. Achava muito curto o prazo que me fora dado. Entendi que tinha que estar preparado para poder gravar o disco no prazo que me foi concedido. Ensaiamos durante dois meses. Conclui que as músicas estavam muito bem.
De seguida marquei uma data para entrar no estúdio. Entrámos e conseguimos gravar todo o disco num só dia, faltando apenas alguns músicos entrarem nos temas. Faltava apenas o baixo, a bateria e a introdução da voz. Mas em menos de duas semanas conseguimos terminar o álbum. Foi assim que tudo começou. Na altura da gravação, sendo eu um inexperiente no estúdio, estava atento com os pormenores do técnico de som que trabalhava comigo.
Estava atento, as formas como ligava os microfones a guitarra e o balafón, assim como a parte da voz. Não tinha nenhuma experiência, mas graças a Deus fiquei sempre colado a ele, no momento da mistura. Quando dizia por exemplo, – o som está um pouco alto, eu pedia para baixá-lo e se achasse o som baixo, eu pedia que o subisse. E foi assim, a minha primeira experiência que foi muito interessante!
OD: Entre os três discos já lançados no mercado desde o ‘Teriké’ e até o último ‘Kana Malu’, qual deles projetou o Kimi Djabaté internacionalmente?
KD: Acho que foi o primeiro. É sempre muito importante, porque é onde nos conhecemos a nós mesmos, mas o disco que me abriu o mercado internacional é, ou melhor, foi o segundo álbum “Karan”. Foi ele que me projetou a nível mundial e consequentemente a minha entrada para o World Music. O meu trabalho ficou conhecido internacionalmente graças ao disco Karan.
OD: ‘Kana Malu’ foi o título do seu último álbum… Podia-nos explicar de uma forma sintética o significado desse título?
KD: Isto significa que eu sou griot, e não devo ter vergonha daquilo que sou, de cantar e de ser djidiu. Realmente, vim de um país onde a tradição griot não foi considerada, as pessoas não percebem o valor do djidiu. Griot não se resume apenas em cantar nas festas de casamentos e nos batizados ou noutras festas. Desde o século XIII, na África Ocidental foram os djidius que inventaram a música, todos os instrumentos musicais, por exemplo, djimbé, korá, balafón e outros instrumentos tradicionais existentes na África Ocidental, foram inventados pelos griots.
Naquela época não era quem tinha talento que fazia a música, mas sim os djidius. Por isso, temos que dar valor aos griots, a tradição de djidiu não é apenas tocar em batizados, festas e nos convívios, não!… a verdade é que os nossos ancestrais griots não escolhiam sítios para tocar, porque, também era apenas eles, djidius, que cantavam.
Imaginem só, desde o século XIII, os griots já tinham os seus acompanhantes chamados de ‘Té’, por exemplo, sapateiros, ferreiros e demais pessoas que lhes assistiam. Atualmente, na modernidade, os ocidentais chamam a essas pessoas de assistentes de som. Mas com o tempo, aquelas pessoas, ou seja, assistentes de som – ‘Té’, (sapateiros e ferreiros) transformaram-se também em griots, djidius.
Os griots tinham até escravos que lhes serviam. Eu tenho orgulho de ser djidiu, muitos até podem achar que griot é mau nome, pelo contrário, não é! Por isso, intitulei o meu último álbum de ‘Kana Malu’, reiterando que não tenho vergonha de ser griot. Acho que todo mundo deve ter esta convicção daquilo que é, e sentir-se bem consigo mesmo e com a sua tradição.
OD: Kimi é um músico do estilo ‘Afro Mandinga’ muito bem conhecido no mercado Europeu. Kimi tem uma agência de publicidade ou faz parte de um Multinacional gigante que trabalha na projeção do seu disco?
KD: Sim, fiz parte de uma editora internacional muito conhecida, a norte-americana Cumbancha, que em 2008 ganhou um prémio da World Music. É uma editora que tem distribuidoras no mundo todo, exceto em alguns países como é o caso da Guiné-Bissau. Aqui, em Portugal, tenho uma agência que trata dos meus concertos, da promoção dos meus discos e da minha imagem.
OD: Como é que nasceu a sua ligação com essa editora norte-americana, Cumbancha. Ouviram Teriké, gostaram e contataram Kimi?
KD: Sim! Existia um site ‘My Space’, onde os artistas colocavam as suas músicas. Foi ali que o responsável da editora Cumbancha ouviu quatro faixas musicais do álbum Teriké. Escreveu-me, perguntando se já tinha gravado aquelas músicas, respondi que sim, já. E de seguida disse-me que desejava que lhe enviasse antes de gravar, porque queria trabalhar comigo e que acreditava que era capaz de gravar temas mais bonitos que aqueles que ouvira.
Ele disse que gostou das minhas músicas, enaltecendo que tem a certeza que era capaz de fazer melhores músicas no futuro. –Se nos mantermos em contato, posso gravar o teu próximo disco! Foi assim que aconteceu o nosso encontro com Cumbancha.
Quando comecei a gravar o meu segundo disco, ‘Karam’, enviei quatro temas a Cumbancha, e eles disseram-me, então não era preciso enviar mais músicas, porque estas são suficientes, solicitando que lhes mandasse as condições para concluir o disco. Mandei todas as necessidades, três dias depois o valor solicitado já estava depositado na minha conta.
Antes de terminar os trabalhos do disco, todas as despesas já estavam pagas por Cumbancha, restando na altura apenas o pagamento do estúdio e as pessoas com as quais estava trabalhar. Disseram-me que o resto do dinheiro era todo meu, mas que o disco era da editora Cumbancha, mas deram-me a liberdade de trabalhar o álbum como quisesse.
OD: O álbum tem muita fama na Europa, mas no seu próprio país passa despercebido e nem sequer passa nas rádios. Como explica essa situação?
KD: Não sei explicar isso, também não sei se tem a ver com os jornalistas ou com as leis da Guiné-Bissau. Se as músicas do Mali, do Senegal, da Gâmbia e da Guiné-Conacri passam nas rádios do meu país, porque é que as minhas não passam? Nós é que estamos a perder! Com isso, nós é que estamos a perder. Realmente, isso me deixa triste. Nasci na Guiné-Bissau, antes de vir para a Europa, o único país que conhecia era a Guiné-Bissau além do Senegal. Cresci na Guiné e fiz tudo lá, por isso, imaginem só, se gravo um disco que toca em França, Estados Unidos da América e em muitos países do mundo, se a Guiné-Bissau não orgulhar-se disso, isso me deixa triste, uma pena.
O futuro dos guineenses está nos guineenses, por isso devemos valorizar aquilo que é nosso, se darmos valor aquilo que não é nosso estamos apenas a perder. Se conseguir alguma coisa, claro que vou levá-la para Guiné-Bissau. A música não tem nada a ver com qualquer religião, mas sim com o país, não deve haver racismo entre nós filhos da Guiné!
OD: Em termos internacionais, como avalia a difusão das suas músicas nos média, sobretudo nas rádios?
KD: As minhas músicas passam nas rádios europeias, também em países asiáticos como é os casos da Malásia e Singapura, já estive em ambos os países para concertos. Cheguei a Singapura vi uma fila enorme no hotel com mais de trezentas pessoas aguardando que eu autografasse os meus discos que compraram. No álbum ‘Karam’, fui obrigado a suportar quase 25 horas de voo, para depois chegar e autografar todos os discos e de seguida fui repousar.
Acredito que muitas rádios passam as minhas músicas, porque para chegar a ocupar a segunda posição no World Music Charts Europe, são mais de cinquenta rádios europeias que votam nos músicos concorrentes.
OD: Em que é que se inspira, Kimi Djabaté para cantar?
KD: As minhas inspirações vêm com tudo, seja com o balafón, com a guitarra, mas atualmente componho as minhas músicas mais com a guitarra. Gosto de cantar a política, o amor e a realidade do meu país. A Guiné-Bissau tem que sair do estado em que se encontra atualmente. Guiné-Bissau não merece estar no estado em que se encontra. A minha forma de lutar contra isto, tenho que o fazer através da música. Gosto de cantar a realidade do meu país seja boa ou má, mas gosto de transmitir ao mundo o que está a acontecer no meu país.
OD: Já participou em alguma coletânea ou projetos musicais?
KD: Participei em muitas coletâneas e gravei duetos com muitos músicos lusos, como São Miguel, João Afonso, com a banda Blasted Mechanism e muitos outros nos quais participei e alguns ainda estão por vir. Convites não me faltam. Muitas vezes as minhas agendas me impedem de participar em muitos projetos.
O Democrata (OD): O que é que os produtores procuram nos músicos, sobretudo num cantor como o senhor que canta um estilo puramente africano?
Kimi Djabaté (KM): Acho que os produtores procuram talento, mas além de talento, os produtores procuram a boa conduta de um músico. Na verdade, para ser um bom músico, não basta apenas ter talento ou cantar bem. Ser bom músico tem a ver em grande medida com muita coisa: a sua forma ser, de expressar, a honestidade, porque é bom que os músicos saibam respeitar os acordos firmados.
Cantar bem ou tocar bem não é o suficiente ou bastante para ser um bom músico. É necessário sermos profissionais, respeitar as pessoas, honrar com os nossos compromissos. Aliás, para ser um bom profissional requer respeito por esses pressupostos.
Suponhamos que tens um espetáculo agendado para Dezembro, e se conseguires outro contrato em que vais ganhar mais do que anterior espetáculo agendado, não podes demarcar-se do primeiro acordo, porque isso é errado, de ponto de vista profissional. Qualquer produtor que souber dessa sua conduta, nunca mais vai querer trabalhar contigo. Enfim, os produtores procuram o lado pessoal do músico.
OD: Kimi, recentemente a artista norte americana, Madona, partilhou o seu vídeo na sua página oficial no “Instagram”. Uma partilha que mereceu destaque na imprensa portuguesa, e estamos a falar de um músico com talento reconhecido mundialmente. Como conheceu Madona e como explica esse momento?
KD: Fui convidado para animar um jantar aqui em Portugal, onde Madona era a convidada especial. É um dos centros hoteleiros onde costumo tocar. Quando convidaram a Madona, enviaram-lhe uma lista de muitos músicos portugueses e estrangeiros, onde escolheu três nomes, dentre os quais fui uma das preferências da artista.
Quando chegou o dia fui lá cantar e até cantamos uma das minhas músicas juntos eu e a Madona. Quando cantava ela me pedia para lhe interpretar o significado das músicas. Ela ficou impressionada, depois trocamos contatos.
Depois do concerto perguntou-me das minhas origens respondi que sou da Guiné-Bissau e convidei-a para ir conhecer o meu país. Disse-lhe que devia conhecer ilhas de Bijagós que são fantásticas.
Disse-lhe que se um dia pisar os seus pés nas ilhas de Bubaque nunca mais vai querer voltar para América ou Europa!
Mas muito antes de começar a cantar falamos bastante e perguntou-me se gostava da sua música, eu respondi que sim. Desde logo queria saber por que gostava das músicas dela.
Disse-lhe que a música não tem fronteiras e que era difícil não gostar das músicas dela. Confessou-me claramente que gosta das minhas músicas e foi por isso mesmo que escolheu e aceitou para estar lá naquela noite.
Depois ela filmou um dos momentos da minha atuação e publicou-a na conta virtual instagram.
OD: Não pensa fazer um dueto com a Madona?
KD: É uma coisa que qualquer músico gostaria de fazer, porque artistas com a dimensão de Madona podem fazer subir a carreira de um músico só num dia. Mas acho que ainda é muito cedo. É preciso criar muita uma auto-confiança entre nós.
Acho que no futuro bem próximo isso poderá acontecer, já que Madona é um fã confesso das minhas músicas. Claro que vamos fzer dueto! É algo que qualquer músico que tiver contato com Madona gostaria de fazer.
OD: Para quando irá ao seu país para apresentação do álbum ‘Kana Malu’?
KD: Brevemente vou para Guiné para apresentar o meu novo disco “Kana Malú”, um disco muito conhecido na Europa e na América. Mas na Guiné não é tão conhecido, por isso quero ir lá para falar com pessoas, passar nas rádios, jornais e televisão. Ainda não tenho uma data, mas espero que seja para breve, para poder também fazer alguns concertos.
OD: Como é que avalia o momento atual da música moderna guineense?
KD: acho que a música moderna guineense está num bom caminho, está bem avançado, porque os músicos estão a lutar para fazer cada vez melhor. O que nos falta são os apoios do Estado. Saber fazer música ou um disco não é nada fácil, exige não só condições financeiras, como também dedicação no trabalho.
Por isso precisamos de apoios. Repare os músicos levam o nome do país ao mais alto nível promove facilmente o nome do país. Por exemplo, já cantei para 37 mil pessoas em Malásia, essas pessoas jamais esquecerão o nome da Guiné-Bissau. Essas pessoas sabem que Guiné-Bissau existe porque sabem que eu vim de lá e que certamente há muitos talentos, não só eu. Por isso precisamos de apoios dos nossos governos.
OD: Como vê a evolução da música guineense, em relação às outras músicas dos países africanos?
KD: Em relação às musicas dos países africanos estamos muito atrasados, mas a meu ver isso deve-se ao fator da instabilidade. Vivemos muito tempo na instabilidade, o que não favoreceu a evolução da nossa música.
Penso que agora já começamos a abrir as portas ao mundo, mas precisamos de muito tempo e de fazer muito trabalho, para chegar ao nível de Senegal, Cabo Verde, Mali, Gambia… etc.
Esses países tiveram oportunidade de viver muitos anos de estabilidade o que contribui muito na evolução da música desses países, mas espero que vamos chegar lá um dia.
Não só na música, penso que a Guiné-Bissau já podia se qualificar para o CAN há 20 anos, mas as cíclicas instabilidades políticas acaba por minar tudo.
OD: O que faz além da música, para viver?
KD: Atualmente vivo só da música. Há 18 anos só faço música. Mas já trabalhei na construção civil quando cheguei a Europa, antes de conhecer os circuitos, para poder pagar algumas despesas. Não é fácil conseguir dinheiro suficiente de pagar as contas só da música no início da carreira.
Antes só tocava para a comunidade africana, nas festas e nos encontros dos africanos, o que ganhava ali não era suficiente para pagar todas as despesas. Mas hoje, graças a Deus, estou só ligado à musica.
OD: É possível no futuro um ‘dueto’ entre Kimi Djabaté e o Embaixador de Afro-música guineense, Sambala Kanute?
KD: Sim, claro, é possível. Eu e Sambala somos primos, somos todos “Djidius” tenho grande respeito e admiração por ele e pelo seu trabalho. Ele foi pessoa que lutou muito para afirmação da música afro mandinga na Guiné-Bissau. Dou-lhe os meus parabéns sempre. Muitos jovens hoje estão a fazer a música afro mandinga e com muito orgulho, isso deve-se ao grande trabalho de Sambala Kanuté. Espero um dia poder gravar uma música com ele. Se ele estiver cá quando estiver a gravar, vamos fazer um dueto.
OD: O senhor vive fora do país há muito tempo. Qual é a sua opinião sobre a situação política do país?
KD: Gosto mais de cantar política do que falar dela, às vezes nem tudo que ouvimos por cá é real, ou seja, as coisas nem sempre são como parecem ser. Mas acho que nos devemos unir. Não quero criticar ninguém, nem entrar na critica pessoal. Devemo-nos valorizar e reconhecer os nossos valores, acho que isso que nos falta.
Devemos perceber que a estabilidade vai nos beneficiar a todos, não a um grupo de indivíduos.
Não quero falar muito da politica da Guiné-Bissau, porque é um país que leva política muito a sério. Se criticares alguém pensam logo que estás contra ela, ou que estás a favor de outra pessoa. Isso me dá medo em abrir mais e falar abertamente da política. A única coisa que posso dizer, é que devemos nos unir e pensar no futuro do nosso país, só assim que podemos avançar. Uma pessoa não pode fazer nada, mesmo na banda existem muitos músicos. Uns na bataria, outros na viola baixo ou ritmo, mas vem só nome do artista interpretador.
É possível amarmo-nos uns aos outros e pormos os interesses da nação a cima de qualquer interesse individual.
OD: Além de Portugal e França, em que países que já atuou com o novo disco “Kana Malú”?
KD: Já fui à Espanha, Alemanha, Bélgica e Holanda, mas para próximo ano tenho agendado alguns concertos no estrangeiro.
OD: És um dos músicos guineenses com mais popularidade no estrangeiro, sobretudo na comunidade europeia, como caracteriza o seu publico?
KD: Na verdade o meu publico é mais ocidental. Mas tenho alguns africanos, como senegaleses que conhecem o valor do estilo que canto. Canto mais para os europeus, nos festivais, nos espaços limitados com “Caché” garantido. Nesses espaços mesmo sendo para uma só pessoa recebo o meu cachê.
Por: Alcene Sidibé/ Sene Camará
setembro 2017