Os recentes ataques dos atuais ministros da Educação Nacional e do Comércio contra a classe docente guineense testemunham uma aberração incarnada por uma classe política em deriva. Ambas declarações são de natureza insultuosa com pendor a humilhar o mais humilhado desta sociedade organicamente doente, o professor. Os infelizes posicionamentos além de revelarem a carência da ética e contenção políticas visam igualmente a ganhar protagonismos no seio de um governo sem agenda, nem rumo. Na ausência de um capitão, qualquer membro de tripulação é capaz de autoproclamar-se líder sem se temer de eventuais consequências da sua aventura.
Que se separe bem as águas. Criticar professor, ou toda classe docente, é um exercício normal, democrático, a semelhança de todo e qualquer outra classe ou setor. Qualquer servidor público é passível de críticas, sempre nos limites das responsabilidades. Porém, os últimos pronunciamentos são insultuosos, vergonhosos e atentatórios à dignidade de uma classe social.
Afirmar publicamente que os professores, apesar de serem formados a custo do erário público, são bons nas escolas privadas e “piores” nos estabelecimentos públicos, o titular da pasta de Educação caiu numa tentação de diversão perante uma evidência que até uma criança da escola primária tinha resposta. Nas instituições privadas existe a cultura de rigor e prestação de contas. Nas escolas públicas, geridas pelo Ministério da Educação, só reina a desordem, mais nada.
O ministro, dentro da sua consciência, sabe muto que quem cabe a missão de criar condições necessárias para um ensino quantitativo e qualitativo numa República não é o professor, mas sim o governo. Enquanto membro do executivo, e, sobretudo ministro da tutela, a operação de charme foi desenquadrada e falida de conteúdo. O ministro devia ter a noção da sua responsabilidade enquanto primeiro advogado na implementação da política pública direcionada ao setor do ensino.
Quem elabora os critérios de seleção para admissão de candidatos à formação do professorado? Quem avalia e afeta os professores nas diferentes escolas e com que critérios? Qual o critério de nomeação de diretores das escolas públicas?
Querer atribuir a responsabilidade de caos que tem vindo a afetar o setor do ensino há décadas, é antes de tudo um exagero, senão uma vergonhosa tentativa de manipulação da opinião pública. Num Estado minimamente organizado, pede-se a demissão imediata do ministro. Por se tratar da República atípica da Guiné-Bissau, permite-se quase tudo. Seja como for, a gravidade da declaração do ministro Sandji Fati exige, no mínimo, um pedido de desculpa pública.
Quanto ao seu colega do Comércio, Victor Mandinga (Nado) a forma insolente como atacou a classe docente, propondo a substituição de todos os professores nacionais por estrangeiros, é uma autêntica deriva comunicacional que deixou três pecados.
Primeiro, a luta pelo protagonismo no meio de um governo sem liderança e nem destino. Isto porque apesar de ser membro do governo, Nado não é responsável pelo dossiê do ensino e nem é, ao que se saiba, o porta-voz do governo. Mesmo se fosse “porte-parole” do governo, a elegância e pedagogia são princípios basilares de atuação de um governante. A comunicação de um dirigente deve ser diferente a de um opositor.
Segundo pecado, o encontro com populares foi um momento fértil para manipular as opiniões com a finalidade de transformar professores em bodes expiatórios do estado de anarquia que abala o ensino nacional há várias décadas.
O terceiro pecado evidencia a forma demasiada simplista como o Nado abordou as causas do descalabro no ensino guineense. O ministro deixou transparecer o seu desconhecimento em relação ao dossiê de educação.
O sucesso em cada setor da governação não é resultado de milagre. Tudo se planifica com base na realidade concreta do terreno, em resumo com base em estudos prévios de viabilidade. Como sabe Nado que todos os professores nacionais são maus? Tem indicadores para confirmar essa suposição? Como ex-ministro das Finanças, qual seria o fardo financeiro da contratação de professores estrangeiros para todas as escolas nacionais e por quanto tempo? O que se faria dos professores nacionais, mudariam de profissão? Já houve operação semelhante no mundo?
A qualidade do ensino depende da vontade política e da consciência que acredita que o investimento sério na educação é alavanca de qualquer processo de desenvolvimento. Quando existir, essa consciência deve ser expressa com pedagogia, inteligência por pessoas autorizadas.
Por: Redação