Opinião: CRIANÇAS DE HOJE, DECISORES DE AMANHÃ

Comemora-se o primeiro de Junho como dia internacional de crianças e os primeiros quinze dias do mês são inteiramente dedicados às crianças no continente-berço, África, e a Guiné-Bissau não foge à regra. Neste dia, todas as escolas do Ensino Básico ficam de feriado, permitindo às crianças comemorar a data em comunidade escolar. Sim, neste dia, as crianças guineenses e de muitas outras partes do mundo comemoram aquele que talvez seja o único dia em que se dispensa um tempo de compaixão para com elas.

A pergunta que a mim, particularmente, sempre me passa pela mente neste dia é a seguinte: “Porquê só hoje, se elas encarnam o nosso passado de termos sido também crianças e são a presente base para o futuro das sociedades mundiais?”. Podem ser inúmeras as respostas a esta meticulosa pergunta, mas para atingirmos o seu verdadeiro alcance, talvez nos seja recomendável reconhecer que as nossas práticas, sociais e políticas, estejam longe de considerar que investir no seu futuro (as crianças) constitui o verdadeiro exemplo de valorização do homem enquanto maior riqueza que uma sociedade pode ter: Houve algum Presidente de República que não tenha sido criança? Algum deputado, algum juiz, algum pai, alguma mãe que não tenham passado por esta fase de “inocência necessária” para servir de ocupação dos que verdadeiramente almejam sociedades mais humanistas e mais justas? – Se a resposta a estas questões for NÃO, então voltemos a perguntar: Quantas escolas do Ensino Básico temos no nosso país, particularmente? Como é o currículo escolar neste ciclo de formação de homens e mulheres que amanhã serão os decisores nas nossas famílias e na sociedade que as vamos deixar a herdar? Que professores têm hoje? Como são formados esses professores? Em que hospitais recebem tratamentos? Como são formados os médicos e enfermeiros desses hospitais? São os mesmos hospitais em que se cuidam dos filhos dos bem-aventurados djintons da nossa praça de desigualdades? – Caro leitor, pensemos nestas questões e outras que poderíamos acrescentar a elas, para vermos se as nossas conclusões não seriam que as nossas crianças, aquelas que Amílcar, o imortal, apelidou de “flores da nossas luta e a razão do nosso combate”, transformam-se a cada dia que passa em “flores mais murchas do nosso queimado jardim e a razão dos nossos constantes atropelos, pois a forma como as regámos ontem, é exactamente como hoje estão a dar frutos de que amanhã nos alimentaremos.

Se dúvidas existirem de como as maldades dos pais, encarregados das crianças e, principalmente os nossos decisores políticos, na Guiné-Bissau e pelo mundo, afectam as nossas pobres crianças, basta-nos apenas alguns factos exemplificativos: Quantas delas (as crianças) estão, neste preciso momento em que lê este preocupado escrito, a mendigar para sustentar uma família inteira, ou um mestre que o devia ensinar as letras do sagrado Alcorão, mas de que só conhece alguns trechos? Quantas estão no passeio da avenida principal a vender sorvete, água, etc., exactamente no momento em que os seus colegas estão a aprender o ABC da vida nas escolas, ainda que seja naquelas escolas de quirintim? Quantas delas morrem vítimas de explosões na Síria, na República Centro Africana, no Norte da Nigéria, por exemplo? E quantas tinham acesso livre às escolas e cuidados médicos na Líbia, mas que hoje vivem no abandono, pois muitos nem pais conseguem ver ao redor?

Às crianças que um dia vão ler este modesto exercício, vão as nossas sinceras saudações e votos que quando já não forem mais crianças, tenham outro amor de adulto para com as crianças desse dia: amor que não terá a Educação a Saúde como prioridades apenas em discursos; amor que irá extinguir o fabrico de bombas atómicas e diminuir o fabrico de armas em números apenas para assegurar a segurança dos habitantes do planeta; amor que reconhecerá no outro um homem tão igual como “EU”…

Aos adultos de hoje, crianças de ontem, um apelo: ainda é tempo de deixarmos o nosso jardim acolher as flores que amanhã no darão um digno recanto; e não continuemos a regar aquelas flores que serão o nosso amargo futuro. Pensemos com cabeça!

 

 

 

Por: Sumaila Jaló,

Licenciado em Língua Portuguesa pela Escola Normal Superior Tchico Té e Professor de Secundário no Liceu Dr. Agostinho Neto.

 

 

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