[ENTREVISTA] Líder do Partido da Unidade Nacional (PUN), Idriça Djaló, disse que as eleições legislativas agendadas para o mês de março serão uma batalha determinante para o povo guineense escolher se continua com os golpistas ou se aposta nos democratas capazes de apresentar projetos concretos para o desenvolvimento da Guiné-Bissau.
O político fez esta advertência numa entrevista concedida ao semanário O Democrata, com o intuito de apresentar a visão do seu partido relativamente à questão da revisão do sistema político sugerida pelo Chefe de Estado bem como pelos renovadores (PRS) que também pediram a assinatura de um pacto de estabilidade política e governativa pós-eleitoral.
Djaló afirmou que o partido que dirige jamais se associará aos renovadores para a assinatura de um pacto de estabilidade política, porque não compartilham os mesmos valores e princípios, lembrando que o partido fundado por Koumba Yalá passou décadas a subverter a ordem democrática e até participou no golpe militar que afastou o falecido Presidente Koumba Yalá, seu fundador.
No concernente à participação do seu partido nas eleições legislativas, assegurou que vão apresentar-se em todos os seis círculos eleitorais do sector autónomo de Bissau. No interior, apresentar-se-ão apenas no círculo eleitoral 13, que engloba os sectores de Bambadinca e Xitole, região de Bafatá no leste do país. Revelou ainda que no âmbito do fórum de concertação dos partidos políticos democráticos, estão a trabalhar no pacto de estabilidade política e governativa.
“OBJETIVO DESTAS ELEIÇÕES LEGISLATIVAS É FAZER A AUTÓPSIA DO SISTEMA POLÍTICO VIGENTE”
Relativamente à disponibilidade do seu partido para apoiar a iniciativa da assinatura do pacto de estabilidade política e governativa pós-eleitoral sugerida pelos renovadores (PRS), respondeu que no entender do seu partido, o pacto é uma vontade política que reúne pessoas e organizações na base dos seus objetivos. Salientou que o partido que dirige não tem problemas de se juntar a outras formações políticas. Contudo, assegurou que para se juntar a outra formação política é preciso que compartilhem os mesmos padrões e valores.
“Agora um partido não pode estar ao longo destes anos na subversão, no roubo ao partido que ganha a governação, depois vir pedir-nos a assinatura de um pacto de estabilidade governativa. Nós juntamo-nos em torno do fórum porque decidimos que a partir de agora vamos lutar para que a vontade do povo exprimida nas urnas se torne numa realidade na Guiné-Bissau, ou seja, que o partido vencedor das eleições consiga governar o país sem perturbações”, observou.
Vincou que o seu partido jamais poderá juntar-se aos renovadores (PRS) para a governação, porque “não podemos associarmo-nos com um partido como o PRS que em 2005 juntou-se a uma parte do PAIGC e com o falecido Presidente, o General João Bernardo “Nino” Vieira, para subverter a ordem democrática e roubar a governação ao então líder do PAIGC, Carlos Gomes Júnior. O PRS estava lá e liderado pelo falecido Presidente Koumba Yalá”.
“No golpe de 12 de abril, foi o mesmo cenário. Parte do PRS juntou-se a outra parte do PAIGC e com outros partidos, e fizeram o golpe que afastou o Carlos Gomes Júnior. Em 2014, o PAIGC venceu as eleições e convidou o PRS para governarem juntos, mas o PRS deixou o PAIGC e foi juntar-se ao Presidente JOMAV para roubar a governação ao PAIGC. Se o PRS fosse um partido que honrasse os seus compromissos, jamais se iria juntar ao Presidente JOMAV”, criticou para de seguida, assegurando que o seu partido se associou aos libertadores para acabar com a subversão no sistema político, “quer militar quer palaciano”.
Djaló apelou aos renovadores param assumirem as suas responsabilidades como partido político depois de décadas na subversão da ordem democrática na Guiné-Bissau. Lembrou que o falecido Presidente Koumba Yalá fora afastado do poder por um golpe de Estado por militares e incluía alguns dirigentes do PRS, tendo frisado que o PRS, como partido, andou sempre na subversão juntamente com parte do PAIGC.
“A nossa luta permitiu uma clarificação de toda esta situação hoje, dado que a parte golpista do PAIGC assumiu publicamente a sua posição com a criação de um partido muito próximo dos renovadores. Agora cabe ao povo guineense escolher se quer continuar com os golpistas ou se quer apostar nos democratas que são capazes de apresentar projetos concretos para o desenvolvimento da Guiné-Bissau. Portanto, esta será a verdadeira batalha destas eleições legislativas”, espelhou.
Para o político, o objetivo destas eleições legislativas é autopsiar o sistema político vigente, porque “a falta do respeito pelas regras democráticas e golpes permanentes são fonte de todas as matanças que se registaram ao longo de décadas na Guiné-Bissau, como também é o principal suporte de toda a corrupção verificada nesta terra”. Adiantou que o seu partido vai levar a debate ideias francas sobre diferentes assuntos da vida política, social e económica do país e vai centralizar-se sobre a responsabilização individual e coletiva do sistema político guineense.
Solicitado a pronunciar-se sobre a mudança do sistema político vigente e sugerida pelo Chefe de Estado e pelos renovadores, respondeu que a mudança do sistema político que se fala é a maior mentira vendida aos guineenses. Acrescentou que na verdade é preciso fazer um balanço do sistema político guineense, tendo assegurado que as eleições de março serão a ocasião para fazer um balanço nacional do sistema político.
Acrescentou ainda que é importante que, antes da batalha (eleições de março) que considera de muito importantes, que os militantes e dirigentes sejam apetrechados de instrumentos políticos consistentes, que conheçam bem o programa político do partido bem como a sua visão sobre os sectores chaves para desenvolver a Guiné-Bissau, a fim de servirem de fiéis porta-vozes do partido em cada círculo eleitoral da capital Bissau.
“NOMEAÇÃO DO PGR PELO CHEFE DE ESTADO DEVE SER VALIDADA PELO PARLAMENTO”
Relativamente ao debate em curso sobre a mudança do sistema político vigente (Semi-presidencialismo) que algumas formações políticas incluindo o Chefe de Estado guineense solicitam, Idriça Djaló explicou que a situação sócio-política da Guiné-Bissau é da responsabilidade de políticos, não do sistema que, no seu entendimento, devem ser julgados pelos seus atos, tanto individual quanto coletivamente.
O político guineense sugere neste sentido a revisão da matéria sobre a nomeação do Procurador-Geral da República, deixando ainda a possibilidade desta figura ser nomeada pelo Presidente da República e validada pela Assembleia Nacional Popular, para maior segurança e com o mandato de quatro anos intocáveis por quem quer que seja.
O líder de PUN esclareceu igualmente que o atual formato sempre deixará o PGR refém do Presidente e ressalva que o ideal seria que a demissão PGR resulte só de infrações que sejam tipificadas na lei, não da vontade de alguém, para impedir que essa matéria seja objeto de discussão.
“A sua validação pela ANP, como acontece nos Estados Unidos de América, não terá influência de nenhuma formação política representada nela. Pelo contrário. Dá mais garantias e maior segurança à justiça nacional, enquanto detentor de ação penal”, realçou mostrando, no entanto, que quer no Ministério Público quer no derrube do governo, evocando a grave crise política que o país viveu, existem equívocos ou lacunas que a própria Constituição da República deveria esclarecer, porque a solução passa por deitar tudo que há de mal a água, corrigir as falhas, esclarecer tudo quanto é objeto de dúvida ou que possa dar margens de manobra para a confusão.
“Evidente que nenhum Procurador-Geral nomeado pelo Presidente da República entrará em colisão com ele nem com os seus interesses políticos imediatos ou pessoais. A posição do PUN é dotar o país de instituições políticas fortes e funcionais”, sublinhou.
Idriça Djaló recorre, no entanto, ao exemplo do Presidente norte-americano, Donald John Trump (sistema presidencialista), que quer construir um murro entre os Estados Unidos e o México e necessita de cinco biliões e oitocentos milhões de dólares. Porém, pelo fato de não ter o aval de parlamento, criou reações internas que levaram-no a abdicar-se da sua intenção.
“A intenção deste grupo é apenas banditismo, ou seja, criar um sistema onde José Mário Vaz tenha todos os poderes para manipular tudo. Portanto, o Procurador-Geral deveria ter aberto um processo contra essas pessoas. Uma vez que José Mário Vaz goza de imunidade”, reagiu, provando que a passividade do Procurador-Geral resultou em toda a crise que o país vive com consequências terríveis, desacreditando homens, as instituições judiciais, políticos e toda a estrutura do Estado que a cada dia que passa perde a sua autoridade moral de decidir sobre o povo.
Para o líder de PUN, esta fragilidade revela a última fase antes de um país entrar no abismo, justificando que quando “um Presidente falta a verdade, mente e os seus atos colocam o país em perigo. Por força da mentira, o país sempre entra em perigo”.
Contudo, adianta que mesmo assim as instituições judiciais do país continuam inativas sem fazer o seu trabalho e lembra que quando o Partido da Renovação Social e MADEM-G 15 invadiram a sede da Assembleia Nacional Popular, praticaram atos criminosos e levaram decisões de Cipriano Cassamá e Alberto Nambeia ao chefe de Estado que por sua vez exibiu-as aos diplomatas acreditados no país. O Ministério Público estava lá, mas não reagiu.
Idriça encara as eleições legislativas de 10 de março como momento de verdade em que será feito o balanço de quarenta anos da história da Guiné-Bissau, momento de responsabilização de todos os que cometeram crimes de sangue e de corrupção, para que o país de uma vez para sempre encontre o seu caminho de desenvolvimento.
“Esta ferida tem que ser bem tratada para que a Guiné-Bissau se torne sã e marche como país, porque toda esta situação pode levá-la ao abismo como aconteceu no período das matanças descomandadas, resultado de sucessivas subversões, corrupção e o crime organizado, perpetradas por um grupo de partidos, políticos e homens de negócios dos quais o país é refém”, assinalou.
DEFENDENOS CRIAÇÃO DE TRIBUNAL ESPECIAL PARA JULGAR OS CASOS DE CRIME DE SANGUE NO PAÍS
O político defende ainda a criação de um tribunal especial para julgar os casos de crime de sangue na Guiné-Bissau, sustentando que todas as matanças ocorridas no país em mil novecentos e noventa e oito (1998), quer na classe militar quer no campo político, resultaram de decisões erradas tomas pelo sistema.
“Enquanto os mais fortes cometem crimes e não são julgados ou não permitem que os crimes sejam julgados, abre-se possibilidade, ou seja, criam-se condições para que o país entre no impasse. Porque se os nossos tribunais não conseguem julgar internamente os casos de crimes de sangue, temos que recorrer às instâncias internacionais para julgá-los, não por vingança, mas sim, para tornar tudo limpo, clarificar o nosso passado bastante medonho através de um tribunal especial com o direito a advogados, mesmo se depois tiverem que ser amnistiados”, defende.
Referiu, no entanto, que os crimes e os males que ocorreram no país, não aconteceram a toa e que o dispositivo “impressionante” de segurança do Presidente José Mário Vaz, do líder de ANP, Cipriano Cassamá, atualmente protegido pela ECOMIB, do PAIGC, Domingos Simões Pereira e do próprio líder de MADEM-G 15, Braima Camará, que está a ser vigiado por um “aparato policial”, justificam que não se trata de uma coisa a toa, mas sim, porque o país chegou a um nível de medo extremo e de desconfiança.
“O que justifica que Cipriano Cassamá, Domingos Simões Pereira, Braima Camará, Biaguê Na Tam, chefe dos militares guineenses, pensam que não têm segurança dentro do seu próprio país. Por que razão pensam que alguém internamente pode querer matá-los? Não seria mais fácil questionarmos por que razão chegamos a este nível para podermos estar em condições de desmantelar esta máquina do mal?”, interroga-se o político.
Acusou ainda o Presidente José Mário Vaz, o Braima Camará, Coordenador do MADEM-G 15, PRS, Carlos Gomes Júnior e todos os políticos envolvidos neste sistema de serem os protagonistas de todos os males que assolam o país e que, na sua lógica, bloquearam o funcionamento da justiça, por isso não conseguiram encontrar nenhuma solução que permitisse julgar esses males e fazer o país avançar.
Acredita, contudo, que se os potenciais eleitores guineenses votarem nos partidos que respeitam a democracia nas próximas legislativas de 10 de março nomeadamente, o PUN, o PAIGC, o PD, a União para Mudança (UM) e o PCD, o país poderá avançar.
Idriça Djaló garante ter respeitado a lei da paridade recentemente aprovada e promulgada pelo Presidente da República e que dá 36% às mulheres na esfera de tomada de decisões, mas notou que os partidos têm que encorajar mais e mais a massa feminina a aderir à política.
O PUN concorre em todos os círculos eleitorais do Setor Autónimo de Bissau e circulo 13, mas só tem três mulheres como cabeça de lista, o que representa, na perspectiva do partido de Idriça Djaló, 40 %, tendo esclarecido ainda que a sua formação política não se depara com os problemas de candidatos com situações de dualidade de militância.
“VAMOS ASSINAR A NÍVEL DO FÓRUM O ACORDO POLÍTICO COM INCIDÊNCIA PARLAMENTAR E GOVERNATIVA”
O político explicou na entrevista que vão candidatar-se em todos os seis círculos eleitorais do sector autónomo de Bissau. No interior, o partido candidatou-se apenas num único círculo, que é no círculo eleitoral 13 (Bambadinca e Xitole, região de Bafatá) em nome do Partido da Unidade Nacional.Informou que as formações políticas que constituem o fórum de concertação de partidos políticos democráticos tinham decidido criar duas coligações, a primeira reuniria a União para a Mudança (UM), Partido da Convergência Democrática (PCD) e o Partido da Nova Democracia (PND), enquanto a segunda envolveria apenas o Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) e o Partido da Unidade Nacional (PND).
“As duas coligações iriam juntar-se num acordo político pós-eleitoral, mas infelizmente não foi possível porque foi extemporâneo e ficamos a saber disso quando os três primeiros partidos levaram os documentos para a validação no Supremo Tribunal de Justiça. Nós entendemos que já não valia a pena prosseguirmos com a mesma intenção, por isso cada um avançou com a sua própria lista”, contou.
Revelou ainda que agora estão a preparar um acordo político com incidência parlamentar e governativa que engloba todos os partidos que constituem o fórum de concertação dos partidos políticos democráticos, tendo assegurado que o acordo vai orientar como prosseguirão durante a campanha eleitoral e como estarão no parlamento e no governo, se conseguirem eleger deputados.
Em relação à ação de formação levada a cabo pelo partido para capacitar os seus dirigentes e militantes, explicou na entrevista que o partido tomou o engajamento de ministrar uma sessão de formação aos seus militantes do setor autónomo de Bissau, de forma a poderem fazer os seus trabalhos de mobilizações de eleitores para apostarem no projeto político daquela formação política.
Assegurou neste particular que a ação de formação iniciada pelo partido vai prosseguir em diferentes círculos eleitorais a que se candidataram até nas vésperas da campanha eleitoral, porque será um instrumento importante na estratégia de mobilização de votos ao favor do seu grande partido. Avançou que o objetivo é trabalhar para obter uma massa crítica de centenas de jovens que serão enviados para todos os bairros de Bissau, incluindo o círculo do interior onde o partido se candidatou, para a sensibilização dos eleitores de porta-à-porta.
Questionado se o partido já tem um programa eleitoral que vai apresentar aos eleitores guineenses, disse que o partido já tem um programa eleitoral divido em duas componentes que será divulgado nos próximos dias, tendo realçado a de política. Refletiu-se sobre o disfuncionamento do sistema bem como do bloqueio do próprio sistema político vigente e expôs-se a razão da não estabilização da Guiné-Bissau faz mais de 40 anos.
“Se diagnosticarmos as causas, então teremos que demostrar as soluções políticas de como o país pode sair desta situação de bloqueio. Este é o grande capital que o nosso partido vai trazer para o povo guineense durante a campanha eleitoral que se avizinha. A segunda parte do nosso programa debruçará sobre a visão programática de rotura com todos os problemas que afetam o país”, disse para de seguida revelar que atualmente alguns partidos optam por encomendar os seus programas eleitorais, tendo assegurado que o seu partido não vai proceder desta forma, por isso trabalhou o programa do PUN na base de conhecimentos dos reais problemas do país.
“Se somos um partido político é porque temos capacidade de analisarmos os problemas e criar soluções para os mesmos. As grandes linhas do nosso programa é a rotura, portanto não vamos prometer a população que vamos dar-lhes estradas ou escolas, não! O que vamos fazer é mostrar ao povo como vamos construir o Estado da Guiné-Bissau, como orientar o povo guineense sobre o seu papel na construção e na salvação desta terra”, observou.
Entretanto, asseverou que a responsabilidade de construir a Guiné-Bissau é um trabalho que ultrapassa um partido, ou melhor, todos os partidos.
O político sustenta que o seu partido defende a importância da mobilização de todos os cidadãos desta terra a fim de transformá-los numa verdadeira equipa de “Djurtos” imbuída de espírito de patriotismo para remar apenas para uma única direção, a do desenvolvimento da Guiné-Bissau. Frisou que a construção do país é igualmente responsabilidade de cada cidadão que, no seu entender, deve participar ativamente na criação de riqueza e das soluções que beneficiarão o país.
Por: Assana Sambú/Filomeno Sambú