Opinião: 47 ANOS DA (IN)DEPENDÊNCIA DA GUINÉ-BISSAU: PARA QUANDO O PROGRAMA MAIOR?

Na esteira dos ideais de liberdade, de autonomia e autodeterminação dos povos, de direitos humanos e de autoafirmação, do anticolonialismo (temas em voga na África e em outros lugares do mundo a partir da segunda metade do século XX, do milénio passado) o segundo maior líder de todos os tempos, segundo a BBC World Histories Magazine, me refiro a Amílcar Cabral, junto de alguns companheiros e quadros fundadores do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo-Verde (PAIGC) liderou, no início da década de 1960, uma das mais ferozes e sangrentas luta pela independência do “continente negro”.

Uma luta que lograria como resultado do seu desencadeamento a (in)dependência da Guiné-Bissau, um pouco mais de uma década depois, em 24 de setembro de 1973, nas matas de Boé, no sul do país. No próximo dia 24 de setembro do corrente ano, no entanto, essa façanha (conquista da independência) completará 47 anos e, como sempre, será um dia de feriado nacional, de celebrações, e, sobretudo, um dia dedicado aos antigos combatentes (heróis nacionais), aos que tombaram no decurso da mesma e a todos os guineenses em geral.

Após o logro do que, pra Amílcar, era o “Programa Menor”, que era a luta pela libertação do jugo colonial português, o país conheceu episódios constantes de golpes de estado e de instabilidade político-governativa, entre os quais conflito político-militar de 7 de junho de 1998, o pico mais alto de todas as tensões político-militares já registradas no país, e, com certeza, um dos mais macabros episódios da nossa recente história como Estado-Nação. Essas instabilidades, geradas sobretudo pelos dissensos entre a classe política e militar (castrense), por um lado, têm contribuído enormemente para a estagnação e retrocesso do país, assim como pelo seu alarmante índice de subdesenvolvimento e pelo seu descrédito na arena internacional.

E, por outro, têm colocado o país de joelhos, digamos assim, por décadas perante os seus parceiros de desenvolvimento. Sem dúvida, reflexo de incompetência e falta de sentido de estado e de responsabilidade e patriótico da parte considerável dos que eu qualificaria como “aventureiros políticos”. Entretanto, a concepção de uma verdadeira independência, em minha ótica, encontra empecilho justamente quando observado essas e outras problemáticas, cujas consequências são dramáticas e com impactos danosos para o país e para a população. Abrindo assim a brecha para questionarmos até que ponto somos um país livre e independente? Uma questão para constantemente refletirmos sobre.

Ora, as celebrações anuais da (in)dependência do país não podem e nem devem se resumir apenas às habituais festas, palestras e deposições de flores no mausoléu Amílcar Cabral e de outros imortais combatentes da liberdade da pátria, dos quais muito orgulhamos, mas sim devem traduzir-se em ações concretas de homens e mulheres sérios e comprometidos com o desenvolvimento, o crescimento e a prosperidade comum – fazendo assim com que a luta de libertação (umas das mais bem sucedidas em termos de estratégia e impacto da África) seja de fato vista e concebida como tal, não apenas por nós, filhos e filhas da terra, mas também por outros povos e países no continente e fora dele.

Isso não é um apelo ao isolacionismo ou a negação da interdependência da qual os países hoje estão sujeitos, dada ao fenômeno da globalização, mas sim um apelo a autodeterminação e a independência no verdadeiro sentido dos termos, justamente como o Amílcar idealizava, que era “que pudéssemos andar com os nossos próprios pés, guiados pelas próprias cabeças, como os outros povos do mundo”. Dita de outra maneira, não é nada além da efetiva aplicação do que ele classificava como o “Programa Maior”, que era/é o desenvolvimento socioeconômico do país – que, por sua vez, se consegue, em minha opinião, apenas com senso crítico, elevada consciência, altivez e sentido de responsabilidade – valores que, até esta parte, têm estado ausentes no seio da nossa sociedade e da classe política em particular, infelizmente.

O “Programa Maior”, para vocês (políticos) que imortalizam o Amílcar em seus discursos sem quiçá conhecerem melhor os seus ideais e crenças, quer dizer o provimento de uma educação qualificada para a população, um sistema de saúde digno, um sistema de justiça e de segurança pública eficazes, bem estar de maneira geral. Ou seja, um país decente, próspero e desenvolvido. Não um país onde tão somente um ou outro grupo de pessoas tenha mais privilégios, mais acesso a bens e serviços públicos, mais saúde, mais educação e mais melhores condições de vida.

No entanto, visto isso, vale salientar que a (in)dependência conseguida há 47 anos (com sangue e suor dos nossos combatentes) terá valido a pena somente quando as nossas ações, e sobretudo as dos que estão na esfera do poder (nos nossos fazedores de políticas e tomadores de decisões), se traduzirem em desenvolvimento pleno e efetivo da nossa nação. E, em minha interpretação, as suas celebrações terão feito mais sentido apenas quando virmos sendo posto na prática o “Programa Maior” tal como o pai da nossa nacionalidade postulou, o que não pode e não merece mais ser adiado, pelo bem estar da nossa e da geração vindoura. Um feliz dia da Independência a todos os meus irmãos e irmãs, no país e na diáspora!

Por: Deuinalom Fernando Cambanco,

Mestre em Relações Internacionais pela Universidade Federal da Bahia.

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