ARTUR SANHÁ AFIRMA QUE PREFERE ABANDONAR O PARTIDO DO QUE APOIAR NAMBEIA NO CONGRESSO

[ENTREVISTA_fevereiro-2021] O antigo secretário-geral do Partido da Renovação Social (PRS), Artur Sanhá, afirmou que prefere abandonar a fileira dos renovadores de que associar-se à candidatura do atual líder, Alberto Nambeia, porque “a sua direção está a complicar a vida do partido”. Lembrou que em plena decorrência do último congresso,pediu ao Nambeia que não se candidatasse  e no final dos trabalhos do congresso, depois da sua vitória, voltou a alertá-lo que a sua equipa não compreenderia e não reagiria positivamente para que o partido tirasse os dividendos necessários e que o PRS se afundaria.  

Sanhá que atualmente desempenha a função do ministro do Comércio e da Indústria, fez estas afirmações durante uma entrevista concedida ao nosso semanário para falar da sua possível candidatura a liderança do partido do falecido presidente Koumba Yalá. Na entrevista, Sanhá fez duras críticas a liderança do falecido presidente Koumba Yalá do partido e do país, tendo afirmado que se se decidir falar sobre a vida de presidente Koumba Yalá, muitas pessoas vão calar definitivamente. 

Negou a alcunha de “golpista” como é chamado pelos fanáticos dopresidente Yalá e alguns dirigentes dos renovadores que consideram-no de mentor do golpe que afastou o falecido Yalá do poder. Acrescentou que nunca soube da reunião dos militares que levou ao afastamento de Koumba, mas sempre alertou o partido dos riscos que o PRS enfrentava,  simplesmente não lhe deram ouvidos. 

Sobre o carisma que o presidente Nambeia tem no seio juventude por causa de oportunidades que lhes são concedidas nagovernação, Artur Sanha disse que a dita oportunidade dadas aos jovens é uma precipitação da Juventude. Sublinhou que “a precipitação neutralizou a participação. O futuro sempre pertence aos jovens, mas não justificava a precipitação”. 

Criticou a instrumentalização dos jovens do partido,frequentemente usados para insultar adversários ou figuras que julgam internamente a liderança de Nambeia. 

Salientou que “o que me dói mais é a forma como os mais novos estão a ser usados para insultar outros dirigentes dentro do partido, porque é uma ofensa difícil de superar! Fui vítima desse jogo dentro do partido. Os jovens são instruídos para me insultar nas reuniões”.

O Democrata (OD): Senhor Ministro foi um dos primeiros dirigentes do Partido da Renovação Social (PRS), partido que celebra este ano o seu vigésimo nono aniversário, apenas ganhou uma eleição presidencial e uma legislativa. Como interpreta os fracassos do partido nos últimos anos?

António Artur Sanhá (AAS): O resultado não depende apenas do empenho, mas também da capacidade de enfrentar os. Tínhamos o PAIGC cuja hegemonia acabara de ser retirado da Constituição da República. O conflito político militar de 07 de junho de 1998 enfraqueceu o PAIGC parcialmente, mas estava forte no terreno, por isso conseguiu o número de deputados que obteve na altura.

Na segunda posição figurava o Movimento Bafatá… Ou seja, conseguimos colocá-los  na oposição. O PAIGC, a RGB – Movimento Bafatá, o PCD, a União para a Mudança. Eram partidos que estavam bem posicionados. Em termos de liderança de opinião, estavam avançados. O Dr. Koumba Yalá estava a ascender politicamente, mas o nível de difamação, de meiosmateriais e a capacidade administrativa para assumir os encargos no meio de uma propaganda política criava certa inibição. Mas com determinação e coragem ultrapassamos muitas barreiras. Conseguimos ganhar as eleições legislativas, porque o essencial era a verdade, a abnegação, o patriotismo, a capacidade intelectual e política do Dr. Koumba Yalá, que liderava o partido, o PRS conseguiu os resultados que teve na altura.

Infelizmente, houve distúrbios internos porque não conseguimos nos entender e interpretar qual era a missão que tínhamos para cumprir depois da guerra civil de 1998. Era necessário ter consciência da missão de qualquer partido político, como também perceber por que razão a opção da maioria dos eleitores pesou a favor do nosso partido depois da dita guerra. Isso criou um grande desentendimento entre eu, o falecido Presidente Koumba Yalá e alguns colegas conformistas, aventureiros políticos, intriguistas e inocentes politicamente. Todo esse comportamento favoreceu a nossa desagregação.

Fizemos algumas remodelações governamentais sem reunir as estruturas do partido, nomeamos três primeiros-ministros sem reunir as estruturas do partido e chegamos ao ponto de  dissolver a Assembleia Nacional Popular e consequente queda do governo, como forma de vingança! Porque o desentendimento entre o falecido Koumba Yalá, o partido e certas individualidades atingiu um nível muito elevado. Eu sou um dos  elementos… depois de um determinado tempo, enquanto Secretário-geral do partido, o falecido Presidente Koumba já não me concedia audiência nem me recebia facilmente!…

OD: Quem eram os protagonistas dos distúrbios internos no Partido?

AAS: No devido momento vamos revelar os nomes das pessoas que intrigavam colegas com falecido Dr. Koumba Yalá e quem provocava e impingia remodelações governativas intempestivas sem reunir as estruturas do partido…                        

OD: A sua direção ganhou as eleições legislativas com 38 deputados, mas a nível do partido havia algumas vozes que alegavam que o maior resultado obtido foi o de 2014, quando o partido obteve (41) deputados. Concorda com essa abordagem?

AAS: Esse raciocínio só pode sair ou vir de quem não sabe o que vem buscar num partido como o de PRS ou quem faz apenas clubismo político. É um raciocínio semelhante à imagem ou desenho do vírus de Coronavírus! É raciocínio ofensivo, tão doloroso e banal quanto o ovo de galinha a flutuar no mar. É doloroso, porque desvaloriza o desempenho dos outros no momento de maior risco!…     

OD: Na sua última conferência de imprensa para falar da situação interna do partido fez  críticas duras à liderança de Alberto Nambeia e afirmou que há intrigas no partido. Entre fracasso e a deceção, como é que classifica a liderança de Alberto Nambeia?

AAS: Sou uma pessoa muito frontal. Desde o primeiro mandato de Alberto Nambeia e seus vices, sempre coloquei os “pontos nos iis”em relação ao funcionamento do partido. Fui frontal no congresso de 2012 realizado no PAIÃ, onde Alberto Nambeia ganhou pela primeira vez o congresso com a ajuda do falecido Presidente Koumba Yalá. Antes do o presidente Sori Djaló alertar o falecido Koumba Yalá sobre o perigo, eu já o tinha avisado que estragaria o partido. Isso aconteceu a escassos metros do lugar onde discursava.

Kumba já não concertava nada com os colegas do partido e agia autoritariamente. Fez remodelações governamentais sem consultar ninguém, dissolveu o Parlamento, derrubou o governo, não realizou as eleições na hora e nem se quer se dignou negociar com ninguém e violou a Constituição da República. E pior de tudo criou, uma ala e fez fissura que o sustentou e depois ficou como se fosse vítima do sistema. Não foi vítima do sistema. Provocou tudo e levou o partido a perder o poder.          

OD: A liderança de Nambeia foi um fracasso para o partido?

AAS: A maior parte das situações de desprezo a dirigentes do partido e falta de colaboração veio de alguns colegas intriguistas, dirigentes do partido. Isso criou uma situação caótica e, consequentemente, perdemos o poder. Mas como eu era a única pessoa que enfrentava abertamente Koumba Yalá, fui crucificado, porque entenderam que eu queria disputar com Koumba, e pior ainda é que alguns dirigentes atrapalhavam a mente do falecido com o argumento de que a minha reação era para mostrar que o Koumba Yalá não era mais inteligente do que eu, por isso tive que enfrentar todo tipo de riscos que um dia terei a oportunidade de revelar.

Quando querem tratá-lo como perturbador colocam nas estruturas chaves do partido os inocentes políticos que não têm a noção básica da política para provocar desaire e tem sido um dos males ou foco que tem provocado problemas de instabilidade na Guiné-Bissau em muitos partidos políticos. Fizeram todo o possível para provocar guerra entre o presidente Koumba Yalá e o secretário-geral do partido.

Mas decidi engolir muita coisa, porque sempre defendi a coesão interna. São situações idênticas que criaram roturas no seio de vários partidos políticos na Guiné-Bissau, uma generalização de situações, intrigas e inveja que decidi engolir para conservar o PRS. Por exemplo, o Secretário-geral de um partido vencedor das eleições é exonerado abusivamente como membro do governo e como se não bastasse o presidente Koumba Yalá convocava reuniões de concertação com outros dirigentes para falar de forma pejorativa mais possível da pessoa do Secretário-geral sem convocá-lo.

Não aceitava ter audiências com o secretário-geral do partido. Avisei que a dissolução do parlamento e a queda do governo de Alamara Nhasse era uma asneira. Tive a coragem de convocar os meus colegas para informar ao nosso ex-presidente  de que estávamos na iminência de perder o poder, se não mudássemos as nossas atuações, porque estava munido de muitas informações. Fiz ecos para depois o presidente interino Nambeia convocar a reunião da Comissão Executiva do PRS.

A Comissão Executiva era composta por 61 membros. Discutimos bastante e chegamos unanimemente a um consenso que estávamos na eminência de perder poder, se continuássemos no mesmo ritmo. Criamos uma comissão de quadros e dirigentes de um número mínimo de oito e de treze elementos no máximo para tentar uma audiência com Dr. Koumba Yalá. Na audiência fomos insultados pelo Presidente Kumba.

OD: Senhor Artur Sanhá tem sido crítico às lideranças do PRS. Considera-se mesmo um crítico temível no seio dos renovadores?

AAS: Não faço mal a ninguém. Talvez não faça o que querem que eu faça. Como Secretário-geral do partido dois mandatos o partido cresceu com uma velocidade invejável. E estou disposto a desafiar quem quer que seja dentro do partido. Sempre provei que sou capaz e tenho cumprido as minhas funções na medida do possível.

OD: Especula-se que as suas críticas agora à direção do partido têm a ver com a sua desconfiança de perder o cargo de ministro numa eventual remodelação governamental. Teme ser afastado do governo?

AAS: Estou no campo político não para resolver os meus problemas pessoais, porque se fosse ao contrário… Sabe o que significa o Ministério do Interior? Interior mais Administração Territorial.

Nunca naveguei para o bem-estar material. No Ministério das Pescas, na tentativa de criar uma gestão transparente no setor, resultou na minha exoneração em troca de largos montantes de dólares pagos pelos armadores ao ex-primeiro-ministro de transição, Rui Barros, para que fosse exonerado das pescas. Só no licenciamento de telemóveis, tinha centenas de milhões para ganhar. Bancarização de salários e o controlo de fantasmas na administração pública são minhas iniciativas.

A recuperação de dinheiro mal desbloqueado para pagar os funcionários públicos ascendia a mais de cem milhões de francos CFA por mês. Para não cairmos na tentação, criamos um sistema rotativo de controlo. Tudo era controlado no banco e o resto era  mandado para a conta do Estado, mas houve no mesmo processo  de controlo de funcionários fantasmas quem conseguissearrecadar quase dois biliões de francos CFA, mas até hoje ninguém sabe do paradeiro desse dinheiro. O nosso processo foi bem pensado, todos os pagamentos eram feitos via bancária.

A função pública  e as finanças eram as duas instituições que controlavam as folhas de pagamento e os bancos controlavam os novos métodos de pagamento e conferências. 

Fui contatado para fazer parte do governo depois da queda do governo de Carlos Gomes Júnior e no de  Mário Pires, declinei  os convites. A eventual remodelação governamental, nunca me preocupou e nunca me preocuparia. Não passa de uma manobra de quem pensa que fazer política é uma brincadeira.                

OD: A nível interno do partido a figura de Artur Sanhá é considerada de “golpista” e suspeita de ter contribuído para o afastamento de Presidente Koumba Yalá do poder. Tem comentário?

AAS: Se sou alguém que convoca reuniões da Comissão Executiva no governo de Alamara Nhasse para alertá-lo que estávamos prestes a perder o poder e intercedi em assuntos ou medidas que podiam ser fatais para ele, não justifica essa ideia. Tenho oito testemunhas oculares e para além de testemunhas indiretas, tenho fatos.

Se decidirmos falar sobre a vida de Koumba muitas pessoas vão calar definitivamente. Nunca soube de reuniões dos militares, mas sempre alertei o partido dos riscos que o PRS enfrentava,  simplesmente não fui escutado. Muitas remodelações governamentais foram impingidas por colegas obcecados com opoder. Quando alertei que a dissolução do Parlamento e a queda do governo seria uma asneira, recebi uma ordem de abandonar, em três dias, a casa onde morava e retiraram-me a viatura. O partido está infetado de cérebros de brincadeira.

OD: Senhor ministro de Comércio nega ter sido golpista. Pode explicar como o seu nome  surgiu para liderar o governo de transição depois da queda de Koumba Yalá?

AAS: Se o senhor jornalista investigar, poderá ter mais informações. Havia na lista muitos nomes, oito ou nove nomes candidatos ao cargo de primeiro-ministro, dos quais o meu. Todos foram submetidos a voto duas vezes pelo Comité Militar. Era normal que o meu nome fosse sorteado. Sou ser humano e quadro da Guiné-Bissau com cabeça para pensar e os militares também têm a sua visão.

Felizmente foi uma escolha acertada. Deixei realizações que mereceram menções gratificantes vindas das Nações Unidas, da União Europeia…Oportunamente terá o privilégio de ver o emblema de seiscentos gramas em ouro, uma placa que recebi do vice-ministro de cooperação da francofonia da França depois de um debate no Palácio da União.

Depois desse debate, o governo teve todas as aberturas para a entrada de investimentos na Guiné-Bissau, o que significa que a aposta do Comité Militar foi acertada. Foram tomadas medidas de controlo de gado a nível das fronteiras, suturamos as fugas miúdas de armas e balas para zonas onde isso ocorria antes de conflito civil de 07 de junho de 1998, trabalhamos  a nível de controlo das pescas  nas águas territoriais do país, melhoramos o aeroporto Osvaldo Vieira que era um autêntico esqueleto depois do conflito político militar de 07 de junho de 1998.

OD: A sua divergência com Koumba Yalá era pessoal ou pelo interesse do partido?

AAS: Pessoal, como?! Se fosse pessoal seria só renitência ou falta de educação, porque era mais velho e tínhamos laços familiares. Eram, sim, apenas questões administrativas, estruturais e funcionais do partido.

OD: O partido vai realizar o seu próximo congresso ainda este ano. Vai apresentar-se à liderança do partido. Acha que está em  condições de fazer face ao presidente Nambeia? 

AAS: Até lá temos que cumprir algumas etapas no domínio das regras, da ética política e   anúncios em momentos propícios. Portanto, vou aguardar ainda, embora o presidente em exercício do partido tenha declarado já a sua intenção na cidade de Buba no mês passado.

OD: Existe a possibilidade de Artur Sanhá vir a associar-se à candidatura de Alberto Nambeia?

AAS: Associar-me ao Nambeia?! Não.  Só se for por imposição. Se essa é a intenção das pessoas é melhor eu abandonar o partido. Não vou apoiá-lo, porque a sua direção está a complicar a vida do partido. Em plena decorrência do último congresso pedi ao Nambeia para que não se candidatasse  e no final dos trabalhos do congresso, depois da sua vitória, alertei que o presidente eleito e a sua equipa não corresponderiam nem reagiriam positivamente para que o partido tirasse dividendos necessários e que o PRS afundaria.  

Não impugnei o congresso porque colocaria o partido numa situação de sofrimento. Os fatos e elementos para impugná-lo eram sólidos.

OD: Para além do presidente Nambeia, tem outra figura que poderá apoiar dentro do partido?

AAS: Sou uma pessoa maleável. Se aparecer outra pessoa dentro do PRS que tenha maior aceitação, mais capacidade, oportunidades, que reúna mais requisitos, maior reputação, experiência e antiguidade no partido poderei apoiá-la. Todo e qualquer candidato que não fizer fraude será derrotado.

OD: Alberto Nambeia é tido como líder que deu mais oportunidade à juventude, o que lhe dá um certo carisma nessa estrutura do partido?

AAS: É uma precipitação. E a precipitação neutraliza a participação. O futuro sempre pertence aos jovens, mas não justificava a precipitação. O que me dói mais é a forma como os mais novos estão a ser usados para insultar outros dirigentes dentro do partido, porque é uma ofensa difícil de superar. Fui vítima desse jogo dentro do partido. Os jovens são instruídos para me insultar nas reuniões.

OD: Dr. Artur Sanhá, não obstante os apoios disponibilizados pelo governo para o setor privado, continua a haver críticas quanto ao sucesso da presente campanha de comercialização das castanha de cajú. Alguns até apontam que foi um fracasso total Quantas  toneladas foram exportadas este ano.

AAS: Essa crítica de que foi um fracasso  não corresponde à verdade. A Guiné-Bissau tem apenas a castanha de caju. Mas outros países têm, a nível da agricultura,  Cacau, Café e Mandioca. Conseguimos produzir cento e cinquenta e duas mil toneladas.  

OD: Senhor Ministro, tem alguma mensagem que queiradeixar aos militantes e dirigentes do Partido da Renovação Social?

AAS: Quero deixar só duas notas para dissipar dúvidas daqueles que me crucificam sem pensar minimamente duas vezes. Sempre lutei para conservar com o PRS. Se reagisse para compensar os males que sofri no partido teria enormes problemas. Dirigentes e colegas do partido que sempre criaram fissura interna nos renovadores facilitaram o surgimento do Manifesto do Povo, PRN do ex-primeiro-ministro de Alamara Nhasse, PND de Iaia Djaló e provocaram até a criação de outros partidos que depois não resultou certo.      


Por: Assana Sambú/Filomeno Sambú

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