A energia é, desde os primórdios, um elemento essencial para os seres humanos. O debate em torno do seu valor e procedimentos de uso ampliou ao longo dos tempos, entrando no rol dos assuntos mais versados no mundo, particularmente, no contexto industrial. O aumento da exploração de energia resultante da apropriação de suas diversas fontes e do domínio das suas formas de uso, possibilitou o desenvolvimento socioeconômico das sociedades contemporâneas, mas, provocou, também, ampliou o nível de poluição ambiental e acirrou as alterações climáticas, causando o desiquilíbrio do ecossistema e a deterioração da saúde humana.
Pretendo com essa reflexão, empreender um exercício crítico a respeito do setor energético na Guiné-Bissau, buscando identificar, de forma concisa, as problemáticas de sua geração, transmissão, distribuição e comercialização, assim como a sua importância para a efetivação e dinamização do desenvolvimento socioeconômico do país.
O país está inserido na costa ocidental do continente africano e possui recursos naturais abundantes ainda por explorar, no entanto, o seu mercado interno deixa muito a desejar no tocante a flexibilidade, competividade e inovação. Quando comparado com os outros países da sub-região, a Guiné-Bissau tem um potencial energética, proporcionalmente, suficiente para sustentar a sua extensão territorial (superfície de 36.125 km²). As companhias petrolíferas nacionais e internacionais realizaram, desde a independência, uma cifra considerável de projeções a respeito da potencialidade do país em termos de geração de energia e os seus resultados indicam o seguinte:
- Energia da Biomassa: a quantidade de biomassa mobilizada dos diversos resíduos agrícolas para a produção de combustíveis sólidos na Guiné-Bissau é estimada em 239.760 toneladas. Há uma clara predominância de resíduos de arroz (35,4%) e mandioca (34,8%), seguido de longe por resíduos de amendoim (12,4%) e sorgo (7%). Os resíduos
das colheitas têm valores baixos. (AASE4ALL-G. B; 2015)
- Combustíveis Fósseis, (Petróleo, Carvão Mineral, Gás Natural): estes recursos não se encontram identificados no país apesar dos resultados das prospecções feitas até à data presente alimentarem uma certa esperança da existência de petróleo nas zonas offshore.
- Hidroelétrico: o país dispõe de uma bacia hidrográfica bastante importante que devidamente explorada para fins energéticos poderia contribuir para colmatar o défice em matéria de energia elétrica.
- Energia solar e eólica: sendo um país tropical, tem uma forte irradiação solar estimada em 5,5 KW/m²/dia e uma velocidade média do vento que oscila entre os 2,5-5,3 m/s. No estudo do Plano Diretor de Energia efetuado pela empresa CABIRA, por meio do software logiciel SIMAHPP Profissional, versão 4,8, normalmente usado para análise dos sítios retidos pelo PAGIRE para a construção de barragens para fins agrícolas. Foram identificadas as possibilidades de construções de 19 micro barragens que podem ser aproveitadas para a produção da eletricidade, cuja potencialidade foi avaliada em 2,94 MW, sendo a produção anual espectável de 25,91 GWH. Para além destes o estudo, também, identifica: a produção da eletricidade através da Mare-Motriz e energia das ondas cuja potencialidade ronda os 4 MW, e uma produção anual de 35 GWH; e as barragens do Saltinho, Cussilinta e Surire (rápidos), com uma potência estimada em 27
MW, o que totaliza os 33,94 MW e produção anual de 300,91 GWH. (AASE4ALL-G. B; 2015)
Dispondo destes recursos renováveis, a Guiné-Bissau poderia tornar-se numa potência no mercado energético, na sua sub-região, diminuir as suas emissões de Gases com Efeito de Estufa (GEE) e tirar proveitos dos Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (MDL), melhorando assim a vida da sua população. Pelo contrário, a G-B sempre dispõe duma única fonte de geração anosa, um sistema de transmissão, distribuição e comercialização muito desatualizado e cercado de inúmeros problemas, sem esquecer que a eletrificação contempla quase, exclusivamente, a capital Bissau.
Quando se trata de geração de energia elétrica, a Guiné-Bissau conta com um número muito insignificante de fontes geradores de eletricidade, tendo em funcionamento alguns como central solar de Bambadinca e central de geradores elétricos/Bissau, este último, sustentados a base de combustíveis fosseis (petróleo, e seus derivados), que está a cargo da principal empresa a operar no sector elétrico na Guiné-Bissau, – EAGB a empresa pública de eletricidade e água, que desde os anos 90, detém o monopólio de produção, transporte, distribuição e comercialização, processos estes reféns de problemas que estendem desde geração, atendendo compra e manutenção técnica de geradores, compra de combustíveis a alto custo para seu funcionamento que ficam ainda mais comprometido com os maléficos furtos e vendas ilícitas dos tais combustíveis pelos governantes e atores que atuam no sector.
A transmissão e distribuição desencadeadas através dum sistema tão mecânico, provecto e desatualizado que não responde as novas demandas da sociedade, afrontando questões urbanísticas que constituem fatores elementares nestes processos, além disso, as cortes de grandes cabos de transmissão, quando na construção de estradas e obras públicas ou privadas provocam grandes apagões na cidade e possuem consequências graves, principalmente, nos hospitais.
Desprovido de grandes indústrias, a comercialização funciona, atualmente, a partir de um sistema pré-pago mais ou menos falho, caracterizado por um considerável índice de corrupção, que inclui desvio de fundos oriundos de pagamentos, dívidas acarretadas pelas empresas que têm donos atuando como governantes políticos, assim como furtos feitos pelos próprios cidadãos.
Considerando os problemas que revestem esse setor, assinatura de contratos inviáveis com empresas internacionais, por parte do governo e não implementação de vários projetos bem elaborados e comprometidos com a exploração de fontes renováveis e o uso de sistemas atuais e eficientes, devido aos ciclos viciosos de problemas sóciopolíticos que assolam o país, o povo guineense tem acostumado com frase “lus bin, lus bai” que se traduz numa vida no escuro (falta de eletricidade), alguns se garantem com geradores privados de pequena potência outros a partir de pessoas que comercializam eletricidade nos bairros usando geradores com a capacidade de sustentar um número significante de residências.
Aliás, a Guiné-Bissau possui uma cifra muito reduzida de industrias, instituições estatais e privadas, dependendo dum setor energético recheado de problemas, com dezenas de planos engavetados pelos sucessivos governos e responsáveis pelo setor. Em razão de precariedade energética e falta de responsabilidade governamental, as demandas têm crescido gradualmente sem que haja respostas concretas, impossibilitando assim o avanço de setores dínamos para desenvolvimento socioeconômico do país. No entanto, as elites política e econômica do país vivem nas suas residências com eletricidade garantida 24horas por dia, pelos geradores e combustíveis do povo, enquanto as contáveis estradas (buracadas), hospitais (sem saúde), escolas, (sem condições), mercados e casas dos guineenses se acostumam com sucessivas cortes de eletricidade, ou seja, o país é coberto de escuridão.
Ao fim e ao cabo como podemos desenvolver a Guiné-Bissau? Como fazer funcionar os hospitais, os portos e aeroportos, presentes e futuras industrias, as escolas, as estradas e outros importantes serviços públicos? Constituem questões imperiosas para devanearmos a respeito da QUESTÃO ENERGÉTICA E O DESENVOLVIMENTO SOCIOECONOMICO DA GUINÉ-BISSAU.
Não podemos desenvolver o país sem termos um setor de energia viável e sustentável acompanhado de uma gestão responsável e transparente por parte do Governo e dos próprios atuantes da área. O Estado guineense precisa pensar e pôr, em prática, os projetos e planos viáveis que visam explorar as novas fontes e utilizar sistemas e técnicas que darão respostas as demandas, estimulando o avanço nos outros setores do desenvolvimento. Num contexto global permeada pelo aumento de novas tecnológicas, a geração e distribuição de energia constituem fatores de muita relevância. O nosso país precisa impulsionar o desenvolvimento das indústrias, mecanizar a sua agricultura e incentivar a inovação tecnológica, mas para que isso seja sustentável e eficiente, os nossos governos devem aproveitar as potencialidades locais para geração de energias renováveis.
“Guiné pudi muda”!
Mantenhas di ermondadi!
Por: Augusto Felix Gomes
Graduando em Engenharia de Energias UNILAB Acarape, Ceará, Brasil
Referência:
AGENDA DE AÇÃO DO SE4ALL PARA A GUINÉ-BISSAU, 2015.