[REPORTAGEM agosto_2021] Os comerciantes guineenses afirmam que o custo de transporte dos produtos importados do exterior aceleraram a subida de preços de alguns produtos da primeira necessidade no mercado nacional e os consumidores acusam os comerciantes de estarem a especular os preços dos produtos da primeira necessidade no mercado. De acordo com as informações apuradas no terreno, os preços dos produtos de primeira necessidade começaram a disparar desde o início de jejum, em maio deste ano.
A propósito, a equipa do Jornal O Democrata visitou alguns mercados da capital Bissau para se inteirar das razões da subida de preços dos produtos de primeira necessidade. Durante o percurso, a equipa confirmou que regista-se um aumento de preços de alguns produtos, sobretudo do óleo alimentar “fula”, que está a ser comercializado a preços diferentes. Para além do óleo “fula”, O Democrata registou também que os preços da carne, da batata, da farinha e do arroz subiram substancialmente.
Confrontado com a situação, o secretário-geral da Associação do Consumidor de Bens e Serviços (ACOBES), Bambo Sanhá, frisou que o aumento de preços de alguns produtos da primeira necessidade, no mercado nacional, está a constituir uma preocupação para Associação dos Consumidores de Bens e Serviços, uma vez que o país enfrenta a maior crise sanitária de sempre provocada pelo novo Coronavírus Covid-19.
Para Bambo Sanhá, as medidas compensatórias que o executivo deveria ter adotado para fazer o acompanhamento da vida das populações e atenuar as suas dificuldades económicas e financeiras, como tem acontecido noutros países do mundo, não foram tomadas.
O responsável da organização que luta em defesa dos consumidores criticou o fato de o governo decidir aplicar impostos em tempo da pandemia, considerando “estranho” o comportamento do governo ao aumentar impostos num momento “tão difícil”.
Bambo Sanhá afirmou que a sua organização muito cedo constatou a rotura de alguns produtos de primeira necessidade e desde logo tem feito alertas e denúncias junto das autoridades nacionais sobre a subida de preços de produtos da primeira necessidade no mercado nacional, nomeadamente, do óleo alimentar.
Bambo Sanhá diz ter constatado também o aumento de preço de bidão de 20 litros de óleo que custava 14 mil francos CFA para 17 mil francos CFA.
“Hoje, para comprar um bidão de 20 litros de óleo alimentar de marca “fula”, o mínimo que se pode gastar são 23 mil francos CFA. O óleo fula que custava 1.000 francos CFA/litro passou, com o aumento de preços dos produtos da primeira necessidade, a custar entre 1.500 a 1.750 francos CFA”, afirmou.
Para Bambo Sanhá, “é inadmissível” em qualquer parte do mundo vender carne primeira que custava 4.000 francos CFA a 5.000 francos CFA e a segunda que era de 3.500 francos CFA a 4.500 francos CFA.
Segundo Bambo Sanhá, apesar do alerta da ACOBES, as autoridades não reagiram atempadamente. Bambo Sanhá acusa o governo de não ter tomado medidas necessárias para travar o disparo de preços dos produtos de primeira necessidade.
“Agora chegamos a esse ponto em que a situação fugiu do controlo do próprio governo. Os argumentos apresentados por alguns comerciantes é que o aumento dos preços dos produtos da primeira necessidade tinha a ver com o aumento das taxas dos impostos, mas esse argumento foi desmentido pelas autoridades competentes em como não houve nenhum aumento das taxas relativamente aos produtos da primeira necessidade”, frisou.
Bambo Sanhá considerou “inconsistente” a justificação em como o aumento de preços dos produtos tem a ver com os custos de transporte dos produtos dos países de importação para a Guiné-Bissau, porque “não houve aumento de preço de barril de petróleo no mercado internacional, tendo em conta que houve queda histórica do petróleo, devido à pandemia tendo alegado que o preço que se aplica atualmente é o mesmo aplicado antes da covid-19”.
ALIU SEIDE: “ROTURA E A AUSÊNCIA DAS AUTORIDADES NO MERCADO É PURA ESPECULAÇÃO”
De acordo com Bamba Sanhá, a maior parte das situações criadas para justificar a rotura, a fragilidade e a ausência das autoridades do mercado nacional não passa de “pura especulação” de quem queria aproveitar-se da situação da escassez ou de rotura de produtos no mercado para colocar a população em situação difícil do que já vinha enfrentando com a crise sanitária.
Segundo Bambo Sanhá, a rotura dos produtos no mercado, a fragilidade e a ausência das autoridades nacionais no mercado e/ou mercado livre em nenhuma parte do mundo é sinónimo de “preço livre”.
“Em nenhuma parte do mundo existe preço livre, e se se existisse é porque a própria população está abandonada à sua sorte pelos sucessivos governantes”, sublinhou e disse que os governantes têm que assumir as suas responsabilidades de acompanhar como é que à população é faturada produtos ou mercadorias, porque “ é o governo que atribui licenças aos operadores económicos”.
Sanhá apelou ao governo, sobretudo ao Ministério de Comércio através da inspeção-geral, no sentido de ser intransigente e devolver poder de compra ao consumidor guineense, que de “forma abusiva” tem sofrido e está a sofrer os efeitos do comportamento de alguns comerciantes que exageram em aumentar e especular os preços produtos de primeira necessidade, sem que sejam responsabilizados.
Bamba Sanhá teceu ainda críticas à falta do pescado no mercado nacional, tendo referido que “hoje em dia poucas famílias guineense conseguem comer peixe de qualidade nas suas refeições”, porque “um quilograma de peixe de primeira, no mínimo pode custar 2.500/3.500 francos”, alegando que os próprios guineenses não estão a beneficiar dos seus recursos marítimos.
Sanhá apelou à população em geral a colaborar e fazer denúncias sobre alguns produtos mal conservados e comercializados fora do prazo de consumo humano ou sobre especulação de preços.
A nossa reportagem ouviu alguns utentes relativamente ao aumento de preços dos produtos da primeira necessidade e acusam os comerciantes de estarem a especular preços dos produtos no mercado e lamentaram a falta de poder de compra.
“Precisamos de ingredientes, mas não temos o poder de compra. E porque também esses ingredientes são mais caros hoje em dia no mercado que qualquer outro produto, por causa da subida de preços dos produtos da primeira necessidade”, lamentou um dos consumidores.
Preocupado com esta situação, pedem que o Estado adote uma medida que regule a ordem ou o controlo dos preços dos produtos no mercado, como forma de ajudar a população a ter poder de compra.
Por sua vez, os comerciantes dizem que os aumentos devem-se ao aumento de custos de transporte de produtos dos países de importação.
RETALHISTAS AFIRMAM QUE O AUMENTO DOS PRODUTOS DEVE-SE AO AUMENTO DO CUSTO DOS TRANSPORTES
Em reação às denúncias, o presidente da Associação dos Retalhistas dos Mercados da Guiné-Bissau, Aliu Seide, disse que o aumento dos produtos de primeira necessidade deve-se aos custos de transporte dos produtos nos países de importação. Contudo, disse ao jornal que o aumento que se regista neste momento não abrange todos os produtos e que apenas houve aumento de preços de alguns produtos no mercado, um aumento derivado do aumento de custos de transporte dos mesmos, tendo frisado que “os comerciantes não são culpados”.
Relativamente aos produtos cujos preços sofreram alterações, Aliu Seidi fez referência ao arroz supremo que sofreu alterações de 400 francos CFA para 500 francos CFA. Segundo Aliu Seide, a empresa fornecedora do arroz terá alegado o custo de transporte de barco que transporta o arroz da fábrica para Bissau.
Perante estes fatos, o presidente da Associação dos Retalhistas dos Mercados da Guiné-Bissau informou que diligências já foram feitas junto do Ministério de Comércio e que o diretor-geral da concorrência terá feito um estudo de todas as alterações ocorridas nos preços de alguns produtos.
Contudo, admitiu que comparativamente ao Senegal o arroz é mais caro na Guiné-Bissau. No que diz respeito ao preço do óleo alimentar, Seide frisou que, dada à crise sanitária provocada pelo novo Coronavírus, muitas empresas fabricantes de óleo alimentar deixaram de funcionar e os funcionários foram mandados para as suas casas.
“Na Europa, na Ásia e em toda parte do mundo o custo de transporte desse produto acelerou o preço do óleo alimentar no mercado”, disse para de seguida detalhar que um bidão de 25 litros óleo alimentar que era vendido a 16,500 /18 mil francos CFA passou a ser vendido a 25.000 mil, porque os fornecedores vendem-no aos grandes grossistas a 25.000 francos CFA mil, sendo revendido aos retalhistas a 25.500 e os retalhistas por sua vez revendem-no aos consumidores a 26.000 francos CFA.
Aliu Seidi disse que os comerciantes não são culpados do aumento de preços de alguns produtos no mercado nacional, sobretudo do óleo “fula” e “soja”, este último comercializado pelos grossistas a 1.300 francos CFA.
“Os fornecedores vendem o óleo a 1.300 e é óbvio que temos que aumentar para ganhar alguma coisa”, tendo assegurado que mundialmente o óleo alimentar tem constituído um problema no mercado e disse que em relação ao preço de leite no mercado, o Nido é mais caro, mas “depende de poder de compra de cada consumidor”.
Quanto ao preço da carne primeira e segunda, Aliu Seidi frisou que a subida de preços das duas qualidades de carne deve-se à campanha de comercialização de caju, porque “nesse período os criadores de gado ostentam muito dinheiro e não passam situações deploráveis que pudesse levá-los a cederem facilmente ou fazer grandes quantidades de abates”.
Contudo, admitiu que é possível que os preços venham a diminuir, assim que a procura for menor que a oferta ou os criadores de gado começarem a enfrentar dificuldades.
Aliu Seidi alertou para a necessidade de as pessoas precaverem-se, porque brevemente o mundo pode enfrentar grande crise de cebola e batata, porque nova colheita dos dois produtos na Holanda, um dos grandes produtores de cebola e batata, não começou ainda. Neste sentido, aconselhou os grossistas, comerciantes e consumidores a usarem reservas que ainda têm de forma racional.
Aliu Seide apelou a todos os cidadãos guineenses a optarem pela agricultura e pela diversificação da agricultura, bem como na produção e consumo de produtos naturais produzidos localmente.
Por: Carolina Djemé