[REPORTAGEM setembro_2021] A economia da Guiné-Bissau é baseada essencialmente em dois vetores fundamentais, a agricultura e pesca. Estando o país situado geograficamente numa zona baixa, as águas arrastam todos os resíduos para as zonas costeiras. O resíduos por sua vez atacam e contaminam os recursos haliêuticos, poluindo o meio ambiente marinho. O país enfrenta, neste momento, o problema de resíduos nas zonas costeiras. É urgente e necessário solucionar este problema para evitar a intoxicação da fauna marinha com substâncias químicas. Se os guineenses não mudarem a sua mentalidade sobre a forma de tratamento de lixos até 2030, poderão enfrentar consequências devastadoras no meio ambiente daquele país lusófono da África Ocidental, o que terá consequentemente um impacto direto na saúde da população.
Não obstante pertencer ao grupo dos Estados membros signatários da Convenção de Abidjam que defende a proteção do mar da poluição marinha e costeira, a Guiné-Bissau não está, neste momento, em condições tecnológicas para fazer face à poluição marinha. É um país extremamente vulnerável em relação à subida da água do mar. A nível mundial, é o segundo país mais vulnerável depois do Bangladesh. É fundamental promover em todas as grandes cidades da Guiné-Bissau uma política de saneamento básico. Os munícipes das grandes cidades, por exemplo, de Bissau, lamentam que o problema de saneamento básico esteja muito longe de ter uma solução à vista. Agora existem, por exemplo, poucas baleias no mar. As poucas que hoje existem quase todas têm nos estômagos sacos de plásticos que a água das chuvas arrastam até aos mares ou às zonas costeiras.
As grandes cidades da Guiné-Bissau, constatou a reportagem do jornal O Democrata, não possuem drenagens em condições, as suas valetas urbanas estão completamente entupidas de lixos e também as suas vias rodoviárias urbanas estão destruídas e cheias de lixos sem condições necessárias para circulação dos transportes públicos. Assim, a cidade de Bissau perdeu a sua marca dos anos de 1979 a 1980 da capital mais limpa da África Ocidental. Há hoje jovens de 30 anos que nasceram e cresceram na cidade de Bissau cheia de lixo. Aliás, para os munícipes de Bissau viver lado-a-lado com lixo já está a tornar-se um hábito normal e natural.
O problema de saneamento básico nas grandes cidades da Guiné-Bissau, em particular, na capital do país, derivam-se essencialmente da má gestão dos resíduos. Não há, no país, uma política de gestão de resíduos que permita controlar e definir, de forma clara, todos os tipos e género de resíduos que existem em Bissau e nas outras grandes cidades das três províncias do país.
AMBIENTALISTAS QUEIXAM-SE DE FALTA DE MEIOS FINANCEIROS PARA FAZER FACE A RESÍDUOS
Ao O Democrata, os ambientalistas guineenses queixam-se de falta de meios financeiros e materiais necessários para poder fazer face às questões relacionadas com a gestão e de controlo total dos resíduos, para não ter mais o impacto na saúde da população da Guiné-Bissau.
Na visão do Técnico de Central dos Resíduos e dos Produtos Químicos do Ministério do Ambiente e Biodiversidade, Per Infali Cassamá, a solução efetiva para a problemática do saneamento básico na Guiné-Bissau passa pela criação de sinergias entre as instituições do Estado. Para Per Infali Cassamá, é necessário haver, por exemplo, uma articulação efetiva de sinergias entre o Ministério da Saúde Pública, do Ambiente e Biodiversidade com a participação especial da parte operativa da Câmara Municipal de Bissau.
Para além dessa medida, defende ainda que é preciso criar uma política administrativa em cada Bairro de Bissau para poder contribuir na gestão de resíduos. Revelou, por outro lado que o Ministério de Ambiente e Biodiversidade tem nos seus planos uma estratégia de estabelecimento, em todo o território nacional, de uma política de educação ambiental. Porque “a educação ambiental é fundamental para adotar os guineenses de uma consciência social sobre o ambiente na esfera pública”.
“Na Guiné-Bissau qualquer política de gestão e de controlo total dos resíduos necessita de ter um suporte de sustentabilidade legal, em termos da lei ambiental, que ainda não existe”, enfatizou e disse que a legislação ambiental é ainda muito avulsa no país. Por isso, é necessário e urgente, através de uma legislação concreta, repartir a responsabilidade de gestão dos resíduos para todos os atores sociais, desde o produtor, importador até ao consumidor final.
Não obstante vários encontros de sensibilização realizados, com a participação ativa das Organizações da Sociedade Civil que atuam na área de ambiente, a Guiné-Bissau continua a ser um dos países da África Ocidental que, de forma desorganizada, produz grandes quantidades de lixos nos cantos e nos recantos em todo o seu espaço geográfico nacional. Os ambientalistas guineenses queixam-se de falta de meios financeiros e materiais necessários para poder fazer face às questões relacionadas com a gestão e controlo total dos resíduos, para não ter mais o impacto na saúde humana da população da Guiné-Bissau.
Os ambientalistas guineenses consideram, por outro lado, que é necessário e urgente adotá-los de meios financeiros e materiais que os permitam trabalhar no sentido da mudança de mentalidade das pessoas. Defendem que é necessário adequar a mentalidade dos guineenses à importância e à utilidade do trabalho de saneamento básico e de incentivar o governo no sentido de criar empresas de reciclagem e transformadoras de resíduos.
“MUNÍCIPES DE BISSAU DEVEM APOSTAR NA MUDANÇA DE MENTALIDADE ECOLÓGICA” – INFALI CASSAMÁ
Na leitura de Per Infali Cassamá, é possível ainda a cidade de Bissau voltar a ser a capital mais limpa da África Ocidental. Mas, para isso acontecer de novo, os munícipes de Bissau devem apostar na mudança de mentalidade ecológica. Na perspetiva do técnico do Ministério de Ambiente e Biodiversidade é possível Bissau tornar a ser a capital mais limpa de África Ocidental, se os seus munícipes começarem a gerir os lixos desde a fonte onde são produzidos, fazendo uma coleta seletiva daquilo que vai ser transformado e definir depois, de forma clara, o seu destino final. Se assim for, haverá, pelo menos, pouco lixo na cidade de Bissau.
Por seu lado, o Diretor de Saneamento e da Proteção Civil e Meio Ambiente da Câmara Municipal de Bissau, João Intchama disse, à nossa reportagem, estar convicto que, até final de 2022, a cidade de Bissau voltará a ser a capital mais limpa da África Ocidental. Mas para isso acontecer de novo, é fundamental o governo disponibilizar os meios financeiros e materiais necessários e adequados para a remoção de lixo, envolvendo a população de Bissau na campanha de sensibilização sobre a higiene e a saúde pública.
No entender de João Intchama, as autoridades guineenses são responsáveis pelas más condições do saneamento básico nas grandes cidades da Guiné-Bissau. Afirmou neste particular que foram os sucessivos governos que governaram o país que levaram a cidade de Bissau a perder a sua marca de capital mais limpa da África Ocidental.
“Hoje a capital guineense e outras grandes cidades regionais estão completamente inundadas de lixos. A população trata o lixo de forma inadequada. Por isso, as bolanhas do país estão inundadas de lixos de todos os géneros que afetam o desenvolvimento de solos para agricultura”, salientou, para de seguida revelar que a Câmara Municipal de Bissau (CMB) está a trabalhar no setor de Safim e na região de Biombo, no sentido de conseguir ter um espaço de aterro de lixo bem controlado. A estratégia de gestão de lixo passa, na sua visão, pela criação de um canteiro de 10 a 15 metros de profundidade com um impermeável por baixo.
“Quando o descarregamento do lixo atingir 15 centímetros será coberto de areia que depois de um determinado período do tempo poderá ser aproveitado para a agricultura”, indicou.
Sublinhou na entrevista que esta nova estratégia da CMB de combater a inundação de lixo na cidade de Bissau envolverá também as comunidades de famílias que vivem e trabalham na cidade de Bissau. É uma aposta de procurar envolver os munícipes na retirada de lixos das suas residências até aos tanques de lixo na rua onde serão depositados, afirmou. Ou seja, a edilidade de Bissau procurará sensibilizar os seus munícipes a terem uma clara consciência social no tratamento de lixo e até de aproveitar alguns desses lixos para a reciclagem. Por exemplo, os munícipes poderiam aproveitar e utilizar as garrafas para a confecção de blocos e latas de sumo para a confecção de panelas de alumínio.
JOÃO INTCHAMA RECONHECE QUE TÉCNICOS DA CMB TÊM DIFICULDADES NO TRATAMENTO DE LIXO
A CMB tem sido acusada de ser um dos maiores produtores de lixo que inundam a cidade de Bissau, porque a forma como os seus técnicos de Saneamento e da Proteção Civil e Meio Ambiente recolhe lixos na cidade de Bissau tem contribuído mais para inundar a cidade de lixo. Sobre o assunto, João Intchama reconhece que realmente os funcionários do seu Departamento têm tido enormes dificuldades no tratamento de lixos, por não terem meios sustentáveis e adequados para o tratamento de lixos.
Não têm, por exemplo, viaturas fechadas para transportar lixo. Utilizam as viaturas de caixa aberta que têm contribuindo mais para inundar a cidade de Bissau com lixo. Causando, ao mesmo tempo, a poluição do ar da cidade de Bissau. A CMB não tem também, neste momento, contentores suficientes para os seus munícipes poderem depositar lixos, nem um horário fixo para as comunidades de famílias tirarem de casa, os lixos que produzem para depositá-los nos locais e poucos contentores disponibilizados pela CMB.
“Em todos os meus relatórios como Diretor de Saneamento e da Proteção Civil e Meio Ambiente, recomendei sempre à Direção da CMB a aquisição de viaturas fechadas para transportar lixos,” explicou a O Democrata João Intchama que considerou o comércio informal descontrolado em toda a cidade de Bissau, como uma das maiores fontes de produção de lixos que inundam atualmente a cidade de Bissau. Por isso, defendeu que
“É preciso ter uma atitude em relação a esta situação de comércio informal descontrolado na cidade de Bissau. Por isso, quando a obra do mercado central terminar, vamos mandar as pessoas para lá. Será aplicada uma multa a quem desobedecer à ordem.”
Para ultrapassar esta situação do comércio informal descontrolado, indica João Intchama, o governo precisa ter coragem de investir na construção de mercados que apresentem as melhores condições e com espaços disponíveis em diferentes bairros de Bissau. João Intchama defende que, na Avenida de Combatentes da Liberdade da Pátria, de “Mãe de Água” até à “Chapa de Bissau”, a CMB deve mudar o aspeto visual da rua e das próprias pessoas que lá vendem os seus produtos. Acusa os técnicos de limpeza da CMB de não terem usado com frequência os equipamentos adequados na recolha de lixos, alegando que provocam neles um certo desconforto durante o período de trabalho e que preferem de certa forma recolher lixos sem proteção sanitária. Lamenta que, nesta época chuvosa, o Serviço de Saneamento CMB careça de meios e de equipamentos. Lamenta ainda que os moradores da cidade de Bissau não tenham solicitado o Departamento de Saneamento da CMB para trabalharem em conjunto na gestão de lixo.
Este ato, no entender de João Intchama, é prova inequívoca que os munícipes da cidade de Bissau não colaboram com a CMB quando se trata da questão de saneamento básico, principalmente nas épocas chuvosas, períodos em que as pessoas deitam mais sacos de plástico nas valetas, inundando a cidade de lixos que criam vários entraves na circulação em Bissau. Todavia, disse estar esperançado que o novo Presidente da CMB vai reativar a cooperação com a Câmara Municipal de Lisboa (CML), para poder ter apoio nos setores de saneamento, do urbanismo, da formação da Polícia Municipal e receber apoios em equipamentos modernos para os trabalhos da recolha de lixos.
João Intchama nega que sejam os técnicos da CMB que queimam os lixos na cidade de Bissau. Garantiu à nossa reportagem que são os próprios munícipes que queimam lixos em busca de cobre, de alumínio e de ferro para vender e ter dinheiro para comprar o pão e cada dia para sustentar as suas famílias. Na sua explicação, o ato de queimar lixos a céu aberto na cidade de Bissau não é feito na presença do pessoal da CMB.
JOÃO INTCHAMA: “NAVIO KARPOWER É BOMBA RELÓGIO DE TIPO CORONAVÍRUS”
Instado ainda a pronunciar-se sobre os resíduos do Navio Karpower instalado a escassos metros do Porto de Pesca de Alto Bandim que fornece energia elétrica à cidade de Bissau, João Intchama disse desconhecer, por completo, o paradeiro dos resíduos do referido navio. Mas, afirma que o Navio Karpower pode ser uma espécie de bomba relógio de tipo Coronavírus, que mata lentamente a nova geração dos munícipes da cidade de Bissau e de todo o país.
Karpower tem a capacidade de aumentar a sua potência de abastecimento de 15 para 36 megawatts. Foi instalado no Mar, em frente ao Porto de Pesca de Alto Bandim sem que os munícipes de Bissau tenham conhecimento do estudo de impacto ambiental.
O responsável do Departamento de Saneamento da CMB disse que a decisão de instalar Karpower no mar foi mais uma decisão política que uma decisão sustentada num estudo de impacto ambiental honesto e saudável para as famílias que habitam na cidade de Bissau.
João Intchama frisou não ter informações sobre o período em que o Karpower foi instalado nas águas do Porto de pesca de Alto Bandim e o destino final dos seus resíduos líquidos.
“Mas todos os munícipes que vivem e trabalham na cidade de Bissau sabem que o Navio Karpower realizou uma operação de manutenção para substituir óleos”, afirmou. Porém, disse que ninguém sabe onde os seus técnicos guardam óleos que tiram dos seus motores.
“As comunidades de famílias residentes que vivem e trabalham na cidade de Bissau preocupam-se hoje mais com a ausência da proteção à saúde marinha que poderá causar uma drástica diminuição de produtos de consumo de proveniência marinha”, criticou.
Por: António Nhaga/Djamila da Silva