Secretário-geral cessante da UNTG: “NÃO TEMOS CLASSE POLÍTICA COM ESPÍRITO PATRIÓTICO, POR ISSO O PAÍS ESTÁ DESESTRUTURADO A TODOS NÍVEIS”

[ENTREVISTA_abril 2022] O Secretário-geral cessante da União Nacional dos Trabalhadores da Guiné – Central Sindical (UNTC-CS), Júlio António Mendonça, criticou duramente a falta do espírito patriótico da classe política guineense para melhor servir o país, por isso afirma que em consequência, a Guiné-Bissau está totalmente desestruturada a todos os níveis e a corrupção está a um nível jamais visto neste país.

Mendonça fez estas críticas em entrevista ao semanário O Democrata para fazer o balanço dos seus quatro anos de mandato a frente daquela que é considerada a maior central sindical do país, sobretudo dos resultados alcançados nas exigências relativas ao cumprimento dos diplomas legais assinados pelo executivo, à luta travada para a melhoria  e o pagamento de salários e condições dignas de trabalho aos servidores públicos e a sua recandidatura ao cargo do Secretário-geral da UNTG no 5º Congresso Ordinário agendado para os dias 9 a 12 de maio próximo.

“A Guiné-Bissau tem todas condições financeiras para se erguer, basta rigor na gestão da coisa pública e poder judicial à altura de ministrar a justiça em nome do povo, vamos conquistar muito mais coisas do que temos conseguido até aqui” assegurou, para de seguida acrescentar que é fundamental e urgente que o país institua o salário mínimo nacional.

Explicou que a nível da sub-região, a Guiné-Bissau é o único país que ainda não fixou o salário mínimo nacional, tendo frisado que uma das exigências da Organização Internacional do Trabalho (OIT) ao governo da Guiné-Bissau é exatamente isso. 

Criticou ainda o governo que bloqueou os subsídios atribuídos aquela organização sindical já a 11 meses, mas diz que continua a pagar o subsídio da Confederação Geral do Sindicato Independente da Guiné-Bissau e, não só, como também aumentou-o elevando-o para o mesmo valor com o da UNTG, que é dois milhões e duzentos mil francos cfa. 

O Democrata (OD): Sr. Júlio Mendonça, volvidos quatro anos do seu mandato à frente da UNG, é hora de fazer contas. Como é que encontrou a UNTG quando assumiu o secretariado da organização sindical do país e qual era a sua real luta sindical?

Júlio António Mendonça (JAM): Antes de assumir a UNTG, já conhecia os problemas que existiam na maior organização sindical do país e a imagem dos trabalhadores, membros dos sindicatos filiais que o antigo dirigente da UNTG tinha transmitido ao povo e ao mundo. 

É óbvio que imagem da UNTG não era boa, tendo em conta os antecedentes históricos dos diferentes líderes que já passaram pela UNTG e a ligação política que tinham com o Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC). Historicamente era até compreensível, porque era partido-Estado. 

Com a abertura ao multipartidarismo e com o liberalismo sindical, era imperativo que a UNTG assumisse a sua responsabilidade, uma vez que constitucionalmente tinha-lhe sido concedida a sua personalidade jurídica para lutar pelos direitos laborais em defesa dos interesses legítimos dos seus associados, os trabalhadores da Guiné-Bissau.

Comecei a acompanhar a evolução da situação na UNTG e sóciolaboral do país, em 2007, quando assessorava juridicamente a UNTG. A dada altura percebi que era preciso mudar a forma de fazer sindicalismo, razão pela qual escolhi, quando era candidato, o slogan “mudança de paradigma sindical”. 

Isto é, padrão, o modelo de fazer o sindicalismo, porque era imperativo virar o sindicalismo para a promoção e defesa dos interesses dos trabalhadores, a defesa da classe trabalhadora guineense, a luta para a conquista da dignidade de quem trabalha na Guiné, presta serviço público e paga impostos ao Estado.    

O dinheiro que o Estado gere é dos contribuintes, dos trabalhadores, das empresas, etc. Esse dinheiro deveria estar a ser utilizado de forma justa e repartido equitativamente para que todos os cidadãos se sentissem filhos desta terra, não ao contrário ou de forma maldosa. 

O dinheiro do povo está entregue a um grupo de pessoas que o controla e em consequência, nenhum filho da Guiné-Bissau tem saúde, nem está feliz ou alegre. E o pior de tudo é que não há investimentos. A nossa luta de quatro anos resumiu-se apenas em exigir do Estado o respeito escrupuloso do princípio da legalidade. Era umas das prioridades de todas as lutas que travamos no meu mandato. 

A única saída que temos de conquistar para reconhecermos algum progresso é o cumprimento da legalidade. É a lei que orienta tudo, tanto Estado como Administração direta ou indireta do Estado, Central, Periférica, Empresas Públicas, Cidadãos, etc, devem respeitar a lei. Por isso assumimos uma postura mais agressiva, não no sentido pejorativo do termo, mas sim, de corrigir a ação governativa e o foco da nossa luta era orientar o governo a agir com base nos princípios da legalidade. 

Quando disse que a UNTG não estava ter bom rumo devido aos antecedentes históricos dos antigos dirigentes, queria deixar claro que seguiam apenas as orientações político partidárias e estavam obcecados mais ao apoio institucional que o governo dava à Central Sindical e condicionavam a sua atuação a esse apoio. 

Como consequência, isso minou todos os objetivos que nortearam  a criação da UNTG. Os guineenses não têm a cultura de pagar quota ou contribuir, apenas sabem exigir os seus direitos e esquecem-se das suas obrigações. Nós tínhamos a consciência de tudo isso e fizemos a nossa luta, não obstante sermos retaliados pelo Governo, que bloqueou os fundos de apoio institucional que dava à UNTG. Até ao momento temos 11 meses desse fundo bloqueado. O fundo é de dois milhões de duzentos e picos de francos CFA.

O governo de Aristides Gomes tinha bloqueado sete meses e o atual quando assumiu a gestão do país, pagou os quatro dos sete meses do Aristides Gomes.  Neste momento, temos oito meses do fundo bloqueado, mas o governo está a pagar regulamente a outra central Sindical, a Confederação Geral dos Sindicatos Independentes da Guiné-Bissau (CGSI-GB). 

Não só está a pagar regularmente, como também aumentou em cem por cento o valor que recebia, ou seja, um acréscimo de um milhão e pouco coisa de francos CFA. O que significa que recebe agora o mesmo valor que a UNTG. É sim, uma discriminação gritante do governo e uma retaliação do Presidente da República, porque fez uma afirmação sobre isso e o ministro das Finanças está a cumprir as instruções que recebeu. 

OD: Este fato pode ser uma das razões porque a CGSI-GB abdicou da luta conjunta iniciada com a UNTG?

JAM: Entre as razões inerentes ao não acompanhamento da UNTG nessa luta, conta esse aspeto, porque não se mudou o paradigma sindical na Confederação. Continuaram com a mesma visão arcaica de depender daquele fundo, mas compreendemos o nível sindical que querem fazer. 

A confederação tem quantos sindicatos? Se me perguntasse, diria que nem chega uma dezena de organizações filiais. Temos reclamado porque não é justo e porque também não tem representatividade e a responsabilidade que a UNTG tem. Nós temos mais de cinquenta organizações sindicais filiais e os principais contribuintes do Estado são filiais da UNTG. Compreendemos a posição do governo…Fez o que fez porque quer premiar a confederação por ter assumido a posição de abstenção nessa luta da UNTG.  

OD: Acreditava que era possível mudar a situação dos trabalhadores num país em que salário mínimo era de vinte e nove mil francos CFA?

JAM: Não. Porque tínhamos a consciência que não seria fácil numa pequena luta mudar a mentalidade dos governantes, combater o sistema político instalado no país há quatro décadas, por isso tínhamos que ser mais determinados, persistentes “radicais” para poder persuadi-los a corresponder às espetativas dos servidores públicos. 

Também tínhamos a consciência de que seriamos alvo de ameaças, inclusive de ataques físicos e verbal e de retaliação. Se não fossemos persistentes, não teríamos conseguido o que conseguimos em setembro de 2018, o reajuste salarial. Com a nossa determinação, o salário mínimo saiu de vinte e neve mil para cinquenta mil francos CFA brutos.

Com os impostos e taxas impostos aos trabalhadores, esse reajuste sofreu um ataque, afetando a vida dos cidadãos que se vêm agora confrontados com a subida galopante dos preços dos produtos da primeira necessidade e o Estado decidiu simplesmente remeter-se ao silêncio, perante um aumento desenfreado dos preços dos bens essenciais no mercado, sem nenhuma causa que o justifique.      

OD: Volvidos quatro anos, julga ter cumprido a sua luta sindical ou foi só uma luta fracassada e perdida?

JAM: Infelizmente, conseguimos mudar apenas 45% da mentalidade dos trabalhadores, inclusive do povo. Isto poderá levar também o povo a perceber que a classe política que tem não está interessada em mudar a sua vida em nenhuma circunstância. 

Ao longo dos quatro anos concluímos que a maior preocupação desses políticos é conquistar apenas o bem-estar próprio, porque o aumento injustificável de subsídios para os representantes dos órgãos da soberania revela claramente que a UNTG estava certa e que o país tinha condições para definir o salário mínimo em cem mil francos CFA.

Por falta da noção do Estado, decidiram não tomar em consideração a nossa preocupação e como consequência, não houve aumento salarial, houve, sim, aumento de impostos e de carga fiscal, de taxas sobre os produtos da primeira necessidade e o aumento descontrolado dos preços desses produtos no mercado. O Estado não conseguiu nem sequer conter e ao contrário do seu papel, está a sufocar a população e os trabalhadores, em particular. Um dos ganhos da UNTG é o novo código de trabalho que em breve vamos ter. É verdade que muita coisa falta ainda por fazer. O que fizemos era lançar as bases para uma luta maior. 

Confesso que 45% de mudança de mentalidade é um fracasso, mas também é um estímulo para continuar a lutar, porque demostramos que há possibilidade de o país andar, o povo e os trabalhadores viverem condignamente.

A Guiné-Bissau tem todas condições financeiras para se erguer, basta rigor na gestão da coisa pública e poder judicial à altura de ministrar a justiça em nome do povo, vamos conquistar muito mais coisas do que temos conseguido até aqui. É fundamental e urgente que o país institua o salário mínimo nacional. A nível da sub-região, a Guiné-Bissau é o único país qua ainda não fixou o salário mínimo nacional e uma das exigências da Organização Internacional de Trabalho (OIT) ao governo da Guiné-Bissau é exatamente essa. 

Não Temos ainda uma classe política com o espírito patriótico,  com a noção do Estado e como consequência, o país está desestruturado a todos os níveis. Nenhum setor da vida pública funciona correctamente, não obstante existirem muitos diplomas legais que poderiam ter servido de guia de orientação. Não o têm feito apenas por má-fé, para se enriquecerem a custa do povo e a corrupção está a um nível jamais visto. 

Cada dirigente, político quer apropriar-se de alguma coisa do povo para constituir seu paraíso. Não estão preocupados com o que se passa nos hospitais, nas escolas, há falta de infraestruturas sanitárias e escolares, medicamentos e o investimento que dizem estão a fazer no Hospital Nacional Simão Mendes (HNSM) é um teatro e panfletos do ministro das finanças, porque foi só pintar as paredes.

O ar condicionado é que examina os doentes? Se o governo não investir na capacitação do pessoal técnico, no pagamento de um salário justo, para poderem estar intrinsecamente ao serviço da população, não equipar nenhum centro hospitalar, não instalar nenhuma máquina de diagnostico (raio X, TAC , etc), como pensa trabalhar para desenvolver o setor de saúde? Nos últimos tempos, todos os guineenses que têm algum rendimento financeiro recorrem a Ziguinchor para tratamento médico mais avançado ou especializado, o que é um insulto ao povo, uma região de um país a servir de salva vidas de outro país! 

O investimento que estávamos à espera não era em pintura. Afinal o povo da Guiné só vive em Bissau. Porque não se fez reabilitações dos centros hospitalares nas regiões? É apenas uma hipocrisia, enganar o povo. Já instalaram aparelhos para a hemodiálise? 

Há dias ouvi que já compraram uma fábrica para a produção de Oxigénio… é grave e lamentável. Quantos milhões investiram no Simão Mendes, quais foram as empresas que foram adjudicadas de contrato de prestação de serviço, houve concurso público da empresa para adjudicação da prestação de serviço?  

O que é que o governo fez para os médicos que trabalham no hospital, os técnicos contratados que há mais de um ano não recebem nada e estão a ser retaliados. Inventaram um dito contrato que não tem nenhum fundamento legal, obrigando esses técnicos a assiná-lo, que teria validade até 31 de março.

Quer dizer, assina um contrato no começo de um mês e fim do mesmo termina, porém, foi nomeado por um despacho do ministro e trabalhou por mais de um ano, e não recebeu nenhum tostão. Os técnicos assinaram e não foram pagos até ao momento. É uma vergonha autêntica e o Estado não merece estes tipo de governantes.   

OD: Fala-nos em resumo dos fracassos, dos planos que não conseguiu concretizar e quem foi o maior estrangulamento aos objetivos da UNTG e dos trabalhadores guineenses, no seu mandato? 

JAM: A partida não poço identificar uma única pessoa. Diria que é todo um sistema político governativo montado há décadas. Os principais culpados da situação porque passam os trabalhadores da Guiné é a classe política e o maior  estrangulamento aos objetivos da UNTG e do povo, porque não cumprem a legalidade. 

O governo de Aristides Gomes, que era de um outro partido, não fez nada e o atual é pior.

Portanto, todos são culpados. Cabe agora ao povo redefinir a sua estratégia para defender o seu interesse. 

OD: Júlio, não é bem visto na sua luta sindical pelo poder político vigente e anterior. Teme que se se recandidatar será o fim da sua luta sindical. O que pensa disso?

JAM: Compreendo a inquietação da classe política sobre a minha pessoa e de colegas que me acompanharam nessa luta. Não temo nada. 

Sou religioso e toda a minha confiança está em Deus. Se um dia o destino marcar o fim do meu percurso na terra, aí sim termina.

Mas nada me impedirá de dar a minha contribuição enquanto cidadão e enquanto guineense. Não sou bem visto porque estou do lado da verdade, a acordar a consciência do povo que os políticos não querem ouvir, porque querem continuar a ver o povo adormecido para continuar a explorá-lo.

É a razão de tanto ódio, intimidação e ameaça de morte contra mim e os meus colegas de luta, por termos denunciado a má governação e a violação dos direitos dos trabalhadores. 

OD: Vai ser candidato a um segundo mandato. Qual será a sua nova estratégia para moldar o que tem sido a atuação do governo face às exigências dos servidores públicos?

JAM: Estamos a caminho do nosso Vº congresso. Tudo dependerá dos trabalhadores e congressistas, se vão ou não optar pela continuidade da atual direção, mas tenha certeza que já estão sensibilizados, porque são responsáveis da conquista das suas dignidades, não será a classe política que vai promover a dignidade dos servidores públicos.

Se for reeleito vou apostar novamente na sensibilização, porque o povo é extremamente passivo, mesmo estando os seus direitos a ser postos em causa.  Sobre a sua questão se serei ou não candidato a minha própria sucessão, sim serei candidato.

Vou apresentar a minha moção aos trabalhadores em breve para um segundo mandato. Que fique claro que se justificar a mesma dinâmica e pressão, não hesitaremos em aplicar a mesma fórmula e mais a componente sensibilização, passando de ministério em ministério para que todos os trabalhadores tenham a consciência dos seus direitos e da sua luta. 

Se os governantes continuarem a ser persistentes, seremos resistentes.  

OD: O recenseamento na função pública foi tem sido contestado por diferentes quadrantes. Para você é um recenseamento que se queria ou é algo que visa um certo grupo de trabalhadores. Qual é a sua opinião?

JAM: É um recenseamento inventado, porque é um recenseamento de confirmação. Já tínhamos feito isso. 

Em 2020 criou-se uma comissão interministerial em que se fez a confirmação desses funcionários. A comissão que tivemos  a honra de fazer parte concluiu que havia discrepância entre os dois bancos de dados, da função pública e do ministério das finanças.

No registo da função pública, eram vinte e seis mil e poucos funcionários e as finanças tinham mais de trinta e três mil trabalhadores, ou seja, o ministério das finanças paga mais de sete mil servidores sem conhecimento da função pública. 

Qual é a necessidade desse recenseamento? O Banco Mundial está a concluir um trabalho para fazer um verdadeiro recenseamento, através de criação de um centro biométrico, para ter um arquivo eletrónico de dados fiável dos trabalhadores guineenses.

É verdade que será um investimento caro para adquirir essa máquina, mas vale a pena termos um recenseamento de verdade e real, não fictício. 

Os experts do Banco Mundial estiveram no país três vezes e cada vez que marcavam uma reunião com o ministro das finanças não eram recebidos. Reuniram-se com a função pública, a UNTG, a Associação dos empregadores, o Ministério da Economia, Plano e Integração Regional, etc, mas nunca foram recebidos pelo ministro das finanças, porque alguém não quer que tenhamos conhecimento real do número dos funcionários ou não está interessado em transferir dados para a função pública, entidade que processa os salários no país. 

Não é legal que seja o mistério das finanças a processar os salários. O ministério das finanças é um serviço público pagador, que faz receitas e procede em função das orientações da função pública, dono do trabalhador.

Havia um desentendimento entre o anterior ministro da função pública, Tumane Baldé e o atual ministro das finanças, João Alage Mamadu Fadia, porque este último terá rejeitado cumprir uma deliberação do Conselho de Ministros, que ordenou a transferência total, a partir de janeiro de 2022, da folha de pagamento para a função pública.

Também envolveu-se em polémica com a atual direção da função pública, porque funcionários nomeados ilegalmente pelo ministro das finanças já foram efetivados sem terem feito um concurso público. 

Mas temos centenas de cidadãos guineenses a prestarem serviço no mistério das finanças há quinze anos, com contrato e continuam no mesmo regime. É um recenseamento de branco no branco, fingindo para salvaguardar os interesses de alguns amigos parentes, filhos, sobrinhos, membros e militantes de partidos políticos. Portanto, é um recenseamento fictício que não trará nada do que era o objetivo.

OD: Com a crise (subida dos preços dos produtos essenciais e dos combustíveis) que assola a população, pode-se colocar a hipótese de que corremos o risco de ter uma sociedade  a duas velocidades e trabalhadores divididos em duas classes:  uns favorecidos pelo atual regime e outros prejudicados e abandonados à sua sorte ?

JAM: Quem sai a perder com toda essa desordem e engenharia é o povo e o próprio Estado. Não há produtividade, respeito pela meritocracia e competência. 

O que existe neste país é o clientelismo político partidário e tribal. Essa crise já está a dividir o povo e os trabalhadores. 

Quando defendemos concurso público para entrada na função pública, tínhamos a consciência clara  dessa crise, porque o concurso público permitiria que o Estado controlasse  o número de funcionários, não seria necessário aplicar impostos e taxas, porque era um período anormal da pandemia da Covid-19, que levou o Estado a decretar estados de emergência e de alerta e os direitos fundamentais dos cidadãos foram beliscados. 

Apesar da crise, nenhum país do mundo aumentou impostos ou taxas. Senegal, que é um país amigo, fez ao contrário. Cortou vários impostos que havia instituído, para poder aumentar ou mentar a capacidade de compra dos cidadãos. 

O aumento de preços dos bens essenciais não de hoje. O imposto da democracia, por exemplo, é um exagero. 

Se um cidadão guineense com capacidade eleitoral não trabalha, onde vai sair com dinheiro para pagar o imposto da democracia ou será apenas um simples beneficiário do dinheiro subtraído de outros cidadãos? Porque vai votar sem pagar o impostor da democracia. Isto não passa de um roubo aos trabalhadores.

OD: Qual foi o engajamento da Assembleia Nacional Popular?

JAM: Nenhum! A ANP nunca se engajou, porque foi cúmplice de todo o processo para salvar a sua pele. Os deputadis sabiam que o governo lhes atribuiu algumas mordomias, por isso aprovaram, em 2021, o Orçamento Geral do Estado para o exercício económico 2022, sem tomar em consideração a chamada de atenção da UNTG.  

OD: Concorda que a vida do trabalhador guineense ou o futuro do povo continua a ser uma simples miragem?

JAM: Obviamente. Com a classe política que temos, nem vale a pena sonhar. Talvez que venha a ver outra geração de políticos com outra visão de governação para mudar o rumo dos acontecimentos. Todos os atuais líderes partidários são inimigos desse povo.   

OD: O VIº congresso da UNTG acontece em maio. Não teme que haja interferência política na vossa reunião?

JAM: Sou guineense e conheço a realidade do meu país e sei também que muitos políticos não querem a minha recondução ao cargo do secretário-geral da UNTG, mas isto não é algo novo. Mesmo no congresso em que fui eleito, partidos políticos tinham os seus candidatos. 

O atual regime, que em 2017 tinha como primeiro-ministro o atual Presidente da República, tinha o seu candidato e o atual ministro das finanças esbanjou dinheiro no salão para aliciar os congressistas. Só para abrir um parêntese: se fizéssemos comparação do rendimento pessoal de cada um dos sete candidatos, eu era bem mais colocado em termos financeiros, mas não aliciei ninguém.

Apenas deixei a mensagem de que o Congresso era dos trabalhadores, não de um partido político, nem era para falar da disciplina partidária. 

O perigo é que se um político financia um candidato que concorre ao cargo do secretário-geral da UNTG, se esse candidato ganha eleições e se um dia esse político tiver a oportunidade de estar na governação, a UNTG e o seu secretário-geral ficam reféns do sistema e passam a fazer o serviço desse político, não o sindicalismo.   

 

Por: Filomeno Sambú

Foto: F.S

1 thought on “Secretário-geral cessante da UNTG: “NÃO TEMOS CLASSE POLÍTICA COM ESPÍRITO PATRIÓTICO, POR ISSO O PAÍS ESTÁ DESESTRUTURADO A TODOS NÍVEIS”

  1. Foi uma grande entrevista, de Dr. Júlio António Mendonça, que acabou de descrever atual situação do país. Desejo- lhe força e coragem na sua recandidatura para o segundo mandato do cargo do secretário geral, da UNTG a maior central sindical do país . Conte com apoio dos verdadeiros e dignos trabalhadores guineenses.
    Obrigado! O Democrata pelo bom trabalho.

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