Centro de Buba Bacalhau: MULHERES TRANSFORMADORAS DE BACALHAU PEDEM AJUDA PARA SALVAR FAMÍLIAS DA FOME

A Associação das Mulheres Transformadoras de Bacalhau “Bubacalhau” revelou que o centro está em apuros com a crise financeira e corre riscos de encerrar as suas portas.  Como alternativa, as associadas recorrem, na época seca, período em que se regista escassez de espécies grandes, a outras atividades geradoras de rendimento económico para garantir a autossubsistência alimentar.   

A situação do centro neste momento parece estar a piorar cada vez mais e não se vislumbram sinais de recuperação financeira, segundo relatos da associação. O centro, que outrora era fonte de rendimento familiar para as mulheres transformadoras do pescado do Rio Grande Buba, nomeadamente de Buba, Farancunda e de Empada, deixou muitas zonas que dependiam muito do pescado sem soluções.

A Bubacalhau disse que, apesar de várias diligências feitas junto do governo e dos parceiros, nenhum resultado foi encontrado para financiar as transformadoras, apenas promessas foram recebidas. No centro, as mulheres fazem transformação do pescado através de processos de fumagem, de secagem, de salgagem seca e húmida do pescado e de sal solar, uma técnica implementada para evitar a transformação do sal na fogueira, porque representa vários riscos à saúde e à natureza, por isso foram treinadas em matéria de produção do sal através do sol.

FALTA DE MEIOS FINANCEIROS ENCERRA CENTROS DE TRANSFORMAÇÃO DE EMPADA E FARANCUNDA

Em entrevista ao Jornal O Democrata, para falar da situação do centro que outrora gerava grande rendimento às mulheres e aos pescadores que as fornecem peixes, Dja Sene Nhabali, a presidente da Bubacalhau, disse que o grande sonho das associadas  do centro era fazer do Centro uma grande fábrica de produção de Bacalhau nacional que não só pudesse ser comercializado no mercado interno, como também no mercado internacional.

Segundo a presidente, a Associação tentou várias vezes experimentar esse desafio com o antigo representante da UICN na Guiné-Bissau, Nelson Dias, mas o resultado não deu certo e, consequentemente, dois dos três centros que o projeto dispunha, na localidade de Farancunda e em Empada, já não funcionam por falta de meios financeiros.  

“Devido a falta de medidas de seguimento e de engajamento das nossas autoridades e parceiros, o processo desmoronou. O nosso grande desfio é que o pescado do Rio Grande Buba transformado em bacalhau fosse comercializado noutros mercados da sub-região e na europa. A saída de Nelson Dias da UICN colocou-nos numa situação de precariedade e sem meios financeiros. Existem projetos, mas não têm execução”, lamentou

A presidente da Associação das mulheres do centro frisou que devido à escassez de peixes grandes na época da seca, a produção do bacalhau só se faz em grande quantidade na época das chuvas, porque nesta época são capturados peixes grandes em grande número.

Para além dessa atividade de transformação do pescado, no período em que não há captura de peixes grandes, as mulheres dedicam-se a outras atividades de pequeno rendimento, como alternativa. Algumas canalizam os seus lucros para a compra de peixes aos pescadores artesanais para vender nos mercados arredores e outras aplicam-nos na compra e revenda de produtos e legumes nas feiras ou noutros mercados próximos de Buba.

Essa estratégia, segundo Sene Nhabali, foi adotada porque dentro da associação, embora sejam todas vendedeiras de peixes e do ramo de transformação de pescado, algumas são membros de famílias de pescadores, que conseguem a todo o tempo dedicar-se à essa atividade de venda e transformação do pescado, tanto na época da seca como na das chuvas.

“Faz parte dos planos do projeto, porque a maior parte é vendedeira de peixes e do ramo de transformação do pescado e porque também uma parte das mulheres tem familiares pescadores que as fornecem peixe a todo o tempo, por isso dedicam-se inteiramente a esse ramo. Nós que não temos essa oportunidade, recorremos a atividades alternativas para garantir a autossuficiência familiar, sobretudo nos períodos em que o centro praticamente fica inativo, apenas com um número reduzido das associadas”, informou.

De acordo com Sene Nhabali, neste momento, quem está a dinamizar o centro é a vice-presidente da associação, mas está a fazê-lo com muitas dificuldades. Disse que se tivessem apoios necessários, cada membro do centro seria capaz de produzir cerca de quinhentos quilogramas ou mais de bacalhau por ano.

NHABALI: “SE O CENTRO FECHAR ESTAREMOS A BRAÇOS COM A FOME”

“A promotora desta iniciativa é a UICN, que teve apoio da República Popular da China. A UINC em parceria com a embaixada da China mobilizou os técnicos do ministério das pescas que treinaram as nossas associadas em vários domínios e técnicas de transformação e conservação do pescado. A dinâmica que o projeto tinha com apoio de Nelson Dias à testa da UICN era notável, mas nos últimos tempos as coisas não têm andado muito bem”, indicou.

Nhabali confessou que o fracasso do centro deve-se à inatividade dos centros de Farancunda e de Empada, que funcionavam como pulmões do projeto e celeiro do de Buba, afirmando que neste momento, devido à incapacidade dos dois centros, as associadas dedicam-se mais à venda de peixes frescos, não de produção de bacalhau.

Assegurou que, apesar de escassos meios, associação fez esforços internos para que a produção de bacalhau em Farancunda e Empada continuasse, mas não conseguiu evitar o pior, por isso decidiu entregar, neste mês de outubro, uma carta ao governador da região de Quinara a solicitar a sua intervenção para garantir que, pelo menos,  o centro de Buba não feche as suas portas, por falta de meios ou qualquer situação, porque “poderá colocar em risco a sobrevivência de muitas famílias que dependem desse setor”.

“Muitas famílias procuram o nosso bacalhau, o que nos mantém economicamente autossustentáveis. Se o centro fechar, estaremos a braços com a fome. Por isso temos estado a empenharmo-nos para mantê-lo em funcionamento”, assegurou e disse que quando receberam a visita de um dos governantes de Cabo Verde no centro, lançaram um desafio a este político cabo-verdiano no sentido de este disseminar no seu país o trabalho que fazem na cidade de Buba, mas não teve seguimento algum.

“A ideia era que o bacalhau produzido em Buba e noutros centros fosse comercializado noutros países, mas a ideia caiu por terra com distanciamento de Nelson Dias da UICN”, lamentou, lembrando que Dias comprava bacalhau para mandar aos parceiros para provarem o trabalho das transformadoras do bacalhau de Buba.

Informou que as mulheres começaram a desenvolver as atividades através de um fundo disponibilizado pela UICN com recurso a empréstimo e com uma taxa de juro de dois mil e quinhentos francos CFA ́s.

Questionada sobre os rendimentos das associadas, disse que não pode precisar um valor exato de cada, porque a produção é individual e varia de acordo com a quantidade produzida por associada, contudo afirmou que é suficiente para realizar alguma coisa como: manter a casa, pagar a escola dos filhos, reembolsar o empréstimo e ter uma casa para morar com a família.

Revelou que a iniciativa, a situação do centro e o trabalho das mulheres são do conhecimento das autoridades nacionais, inclusive alguns dirigentes e políticos do país já experimentaram o bacalhau do centro de Buba, mesmo assim nunca se dignaram apoiá-las ou equipar o centro.

Frisou que um dos desafios das mulheres é a criação de condições de trabalho, porque querem passar de produtoras vendedoras para exportadoras de bacalhau, assinalando que devido à crise financeira global que grassa o mundo e a guerra no leste europeu, um quilograma de bacalhau que custava oito mil francos CFA em 2021 subiu para dez mil francos CFA´s.

A presidente da Associação das Mulheres do Centro Bubacalhau afirmou que existe boa relação entre as transformadoras e a associação dos pescadores da pesca artesanal do Rio Grande Buba, que lhes têm fornecido pescado para que não ficassem paradas.

“Temo-nos cooperado com os pescadores do Rio Grande Buba. No período de repouso biológico essa relação torna-se mais efetiva, sobretudo na utilização das malhas recomendadas pelas autoridades. Nos meses de agosto e setembro, sobretudo, os pescadores praticam mais a pesca com varas e armadilhas”, assegurou.

Sene Nhabali afirmou que a produção diminuiu porque alguns tradicionais pescadores da pesca artesanal estão a ficar velhos e não conseguem fazer-se ao mar por muito tempo, bem como a falta de materiais e redes autorizadas para pesca naquela zona, o que acaba por levar muitos a violarem as regras, utilizando redes proibidas para poderem sobreviver.

“Têm noção que essas redes são nocivas ao ecossistema marinho e que a sua utilização indevida pode provocar a fuga de peixes de uma zona para outra, porque quando capturam peixes com essas redes  muitos morrem e contaminam o ambiente e se o ambiente não for favorável abandonam esse local”, esclareceu, tendo apelo à direção-geral da pesca artesanal a trabalhar em parceria com os pescadores do Rio Grande de Buba, abrir uma loja de venda de materiais, apoiá-los com materiais de pesca, bem como treiná-los  em matéria de conservação do ecossistema marinho e  o perigo que a pesca não recomendada representa e aos  recursos do mar.

“O nosso maior entrave neste momento é a falta de meios financeiros e de conservação do pescado. A fábrica que nos fornecia gelo já não funciona há mais de um mês. Está com avaria e como alternativa recorremos ao processo de fumagem da pouca quantidade que conseguimos ter nessa época das chuvas. Não usamos tarrafes, porque foi-nos recomendado que é uma prática nociva contra o meio ambiente. Usamos lenhas de outras árvores. É um processo longo, de meses, sobretudo a transformação, mas temos lidado com dificuldades”, disse.

Sene Nhabali apelou ao governo a dar a maior atenção às mulheres de pequenas iniciativas de geradoras de rendimento económico, das cooperativas agrícolas, das organizações camponesas, empreendedoras para poder lutar contra a fome, promover o desenvolvimento e o bem-estar social da população.  Enfatizou o papel da AMAE- A Associações das Mulheres em Atividade Económica, na dinamização das atividades das mulheres transformadoras de bacalhau “Bubabacalhau”.

“Portanto, o executivo tem de tratar todas as organizações com iniciativas desta natureza em pé de igualdade”, concluiu, lembrando que o centro tem ajudado muito no escoamento de pequenas capturas no período de repouso biológico.

Lamentou que não tenham beneficiado de nenhum apoio financeiro durante a vigência da pandemia da Covid-19 e tenham sobrevivido apenas com esforços internos.

Por: Filomeno Sambú     

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