
As organizações femininas da Guiné-Bissau defendem ser urgente os homens aceitá-las como parceiras e assumirem que a igualdade de direitos e de oportunidades não é um favo, porque o ceticismo dos homens não vai ajudar a mulher no desenvolvimento da Guiné-Bissau e na afirmação de uma verdadeira paz. Admitem que há avanços nas lutas que as mulheres têm vindo a promover ao longo de vários anos, mas que ainda falta muita coisa para concretizar o objetivo da igualdade plena de oportunidades.
Em entrevista ao jornal O Democrata no âmbito da jornada de 30 de janeiro, revelam que a falta de estabilidade política aceitável tem impedido a mulher guineense ascender em todos os níveis da vida social e por conseguinte, o país não tem conseguido a estabilidade política, económica e social que poderia favorecer as mulheres e levá-las a ocupar lugares cimeiros na tomada de decisões.
“EXISTE CEPTICISMO DOS HOMENS EM ACEITAR A MULHER COMO PARCEIRA DE DESENVOLVIMENTO” – COORDENADORA WANEP

A Coordenadora da Rede da África Ocidental para a Edificação da Paz na Guiné-Bissau (WANEP-GB), Dinísia Indeque, afirmou que existe cepticismo dos homens guineenses em aceitar a mulher como parceira, em todos níveis, para o desenvolvimento da Guiné-Bissau e afirmação de uma verdadeira paz.
Dinísia Indeque falava em entrevista ao Jornal O Democrata sobre a emancipação da mulher guineense, tanto a nível político, económico, social, como no empreendedorismo, no quadro da celebração de 30 de janeiro, dia da mulher guineense.
Dinísia Indeque disse que a emancipação da mulher não deve ser um trabalho específico das mulheres, mas também de toda a gente, devido à importância e ao papel da mulher na consolidação da paz.
A responsável da WANEP-GB informou que Amílcar Lopes Cabral, fundador da nação guineense, primava sempre para que houvesse igualdade de género, mas ao mesmo tempo avisava que deveriam ser elas a lutar para afirmação da igualdade de género. Adiantando que é preciso trabalhar em conjunto para que os homens e as mulheres participem no processo de paz e na tomada de decisões, frisando que as mulheres devem assumir o protagonismo de estar à frente para que sua afirmação possa ser uma realidade.
“Recentemente foi retirado da lista de feriados nacionais o dia 8 de março, dia mundial da mulher, isso demostra que o homem guineense ainda não está preparado para aceitar mulher como parceira na construção da paz. As mulheres devem levantar-se e mostrar aos homens que, sem a sua participação, não é possível conseguir sucesso no processo de consolidação da paz e desenvolvimento almejado pelos guineenses”, sublinhou.
Lembrou que no passado as mulheres lutaram pela independência para tornar os guineenses livres e conseguiram.
“Mas a luta não é apenas para tornar o país independente, mas também para contribuir para o desenvolvimento, ocupando lugares cimeiros em diferentes níveis e instituições, bem como na tomada de grandes decisões para o bem da nação guineense”, frisou, acrescentou que Amílcar Cabral traçou duas metas na altura que eram o programa mínimo e o programa maior, tendo sido cumprido apenas o mínimo.
Indeque disse que a execução do programa maior desenhado pelo pai da nacionalidade guineense não deve envolver apenas homens ou mulheres, mas também todos devem ser homens e mulheres, alertando que a luta das mulheres vai continuar até que a situação de igualdade de direitos e de oportunidades seja resolvida. Dinísia Indeque explicou que a igualdade de género significa que toda a gente tem os mesmos direitos, todos devem andar de mãos dadas e trabalhar em sinergia.
A Coordenadora de WANEP-GB sublinhou que, se houver uma oportunidade a nível político, económico, social e no empreendedorismo, os dois devem participar juntos e, consequentemente, ocupar lugares cimeiros para aqueles que tiverem capacidade, porque “a ideia de que a mulher deve cuidar das crianças em casa” está obsoleta, mas também a mulher pode ser uma gestora por excelência.
“A mulher é a única no mundo que consegue conciliar trabalho profissional e da família, porque faz trabalho no campo junto com o homem e quando chega à casa assume a seu papel enquanto mãe e esposa, assim ela está preparada mental, psicológica e fisicamente para exercer qualquer cargo, sobretudo quando se trata de um cargo político. A história mostrou-nos claramente que, depois dos 49 anos da independência, estando os homens a dirigir o país não sentimos os frutos do programa maior definido por Amílcar Cabral. Porque não inverter essa tendência, dando a mulher o leme para guiar o país”, questionou!
Dinísia Indeque referiu que na luta pela igualdade de género, a Rede da África Ocidental para a Edificação da Paz (WANEP), a nível dos 15 países da África Ocidental, decidiu dar oportunidades às mulheres, atribuindo a responsabilidade de coordenação da organização a 8 mulheres dos 15 países membros, porque “é necessário mudar a tendência, deixar as mulheres mostrarem as suas capacidades em todos domínios e no futuro tirar dividendos”.
Indeque admitiu que houve avanços na luta que as mulheres têm vindo a travar ao longo de vários anos, mas ainda falta muita coisa para concretizar o objetivo da igualdade. Lembrou que na época da luta de libertação as mulheres foram colocadas nas fileiras dos homens, num universo de 10 homens, havia normalmente 3 ou 4 mulheres e agora as mulheres tendem a conquistar os seus lugares no meio dos homens sem que lhe seja dado de bandeja porque labutam ao lado dos homens.
“As mulheres guineenses podiam ultrapassar o número dos deputados que têm atualmente na Assembleia Nacional Popular, mas os partidos políticos não criam as condições para que sejam cabeças de lista, o que lhes permitiria elegerem-se como deputadas, são colocadas no último lugar. Devemos colocar as mulheres na frente para que possam elegerem-se, porque só assim que é podemos saber se temos ou não capacidade eletiva”, exortou.
“FALTA DE ESTABILIDADE POLÍTICA ACEITÁVEL NÃO PERMITE À MULHER GUINEENSE ASCENDER” – PPM

Por seu lado, a Vice-presidente da Assembleia Geral da Plataforma Política das Mulheres (PPM), Magda Francisco Correia, revelou na mesma entrevista que a falta de estabilidade política aceitável tem impedido a mulher guineense ascender em todos os níveis da vida social do país.
Magda Francisco Correia informou que a política nacional está turbulenta, por isso o país não tem conseguido a estabilidade política, económica e social que pudesse favorecer as mulheres a ocuparem lugares cimeiros na tomada de decisões. Acrescentou que no passado, as mulheres desencadearam uma luta que ainda continua e produziram um anteprojeto, a lei de paridade, que foi aprovado no Parlamento.
“O projeto de paridade é temporário e deve sofrer uma revisão, devido a algumas lacunas detectadas depois, mas como o parlamento não está a funcionar, ficarmos com as mãos atadas, Era fundamental colocar na lei de paridade a alternância de sexos nas listas dos partidos políticos. Cada partido político em diferentes círculos eleitorais passaria a colocar um homem como cabeça de lista de um círculo e mulher noutro e dessa forma as mulheres poderiam chegar a 50 por cento no Parlamento”, sublinhou.
Magda Francisco Correia informou que a lei de paridade aprovada na legislatura passada não foi respeitada pelos partidos políticos nas últimas eleições, prova disso é o facto de ter havido pouca representatividade das mulheres em todas esferas públicas, bem como nas organizações da sociedade civil.
Neste sentido, chamou a atenção às mulheres, na jornada de 30 de janeiro, a estarem preparadas para enfrentar os desafios no próximo embate eleitoral nas legislativas antecipadas de 4 de junho.
“Realizamos uma primeira atividade na praça Titina Sila e depois uma segunda com temáticas que irão despertar a atenção das mulheres para estarem mais ativas e preparadas, assumindo desafios para enfrentar os homens em todos níveis. Houve uma evolução das mulheres em diferentes níveis, mas como o processo de mudança não é fácil, estamos a trabalhar diariamente, incentivando a camada feminina a apostar na escola para enfrentar os desafios do futuro”, advertiu.
A Vice-presidente da Assembleia Geral da Plataforma Política das Mulheres afirmou que, nos últimos tempos, houve mudança de paradigma e que se registou um número significativo de meninas que frequentam as universidades, escolas técnicas e profissionais em comparação aos rapazes.
Magda Correia sublinhou que a luta desencadeada pelas heroínas na luta de libertação nacional para que os guineenses pudessem estar livres e independentes deu certo, mas a luta atual é colocá-las ao lado dos homens e na tomada decisões para o bem da sociedade guineense.
MOVIMENTO MINDJER I KA TAMBUR: “CABRAL FOI UM IMPORTANTE ALIADO DAS MULHERES”

A Coordenadora do Movimento “Mindjer i ka Tambur”, Yolanda Victor Monteiro Garafão, explicou que o processo de emancipação da mulher guineense não iniciou hoje, é um processo que começou com a emancipação do povo guineense na luta armada, particularmente das mulheres que demonstraram firmeza e bravura na luta armada.
“Não podemos falar da emancipação da mulher ou do dia da mulher guineense sem lembrar das contribuições dadas pelas nossas heroínas, desde a Titina Sila, Canhe Na N’Tungué, entre outras. Essas mulheres lutaram para expulsar os colonialistas portugueses do território guineense, mas também lutaram pela afirmação da mulher na sociedade guineense”, disse, acrescentando que o líder de guerra, Amílcar Cabral, foi um aliado das mulheres, por isso quando falava do processo de “Homem novo” incluía as mulheres.
“As jovens raparigas que hoje são combatentes da promoção da igualdade do género estão empenhadas em trabalhar para o empoderamento das mulheres na sociedade em diferentes setores, mostrando-lhes que têm os seus direitos”, contou.
Relativamente à situação da violência doméstica registada nos últimos tempos concernente o corte de órgãos genitais dos homens, disse que dados estatísticos indicam que as vítimas da violência são as mulheres e crianças, acrescentando que é preciso pensar nas estratégias da resolução de diferentes problemas ou das violências registadas.
“Enquanto mulheres que lutam pela defesa dos direitos humanos, não compactuamos com esse tipo da violência, sobretudo os casos de corte de genitais dos homens”, disse, alertando que essa situação não pode ser encarada como um pretexto para se ignorar todas as formas da violência que se observa contra as mulheres.
“Lembro-me do segundo caso de uma jovem que tentou cortar os testículos do seu parceiro. Houve um caso de uma menina de onze anos que foi brutalmente estuprada por um homem que penetrou com muita força num ato forçado de coito vaginal e anal”, revelou e lamentou que este caso não tenha tido grande mediatização, nem repudio das organizações que reclamam justiça a favor dos homens vítimas da violência doméstica.
Por: Aguinaldo Ampa
Foto: A.A