
O Alto dirigente e membro fundador do Partido Luz da Guiné-Bissau, Badilé Domingos Sami, afirmou quea cultura da corrupção e de impunidade institucionalizada na Guiné-Bissau facilita os partidos no poder e cria uma concorrência desleal nas eleições nacionais.
Em entrevista à O Democrata, no âmbito da realização da primeira conferência do Partido Luz na diáspora Europa, sob lema “Desafios da diáspora Europa na consolidação do partido na Guiné-Bissau”, o político lembrou que essa situação tem-se agravado nas últimas eleições de 2019 e 2020.
DIÁSPORA É A RESERVA ACADÉMICA E ECONÓMICA, PRINCIPALMENTE PARA O DESENVOLVIMENTO DO PAÍS
“Os partidos políticos investem milhões para a compra de consciências. Apesar de alguma parte destes fundos ser de proveniência duvidosa, não temos dúvidas que a maioria destes fundos sai das nossas finanças, através do sistema de corrupção instituída por sucessivos partidos que dirigiram a Guiné-Bissau até agora”, afirmou, denunciando que neste período de pré-campanha “assistimos os ministros a oferecerem carros, autocarros e a sociedade aceita com melhor agrado essas atitudes”.
“Quer dizer, uma pessoa que não conseguia oferecer nem uma bicicleta, por ser ministro consegue até oferecer um avião se quiser. A cultura de corrupção e de impunidade institucionalizada facilita os partidos no poder e cria uma concorrência desleal nas eleições. A verdade é que, de uma análise substancial, não baseada em estudos sobre fatores que influenciam a votação, mesmo assim consegue-se perceber que estes valores fazem diferença nas campanhas e nos votos devido a crise económica que vivemos” insistiu o político.
Embora reconheça que o Partido Luz da Guiné-Bissau (PLGB) não tenha meios em pé de igualdade com os outros partidos, Badilé Sami manifesta a intenção de o seu partido concorrer em todos os círculos eleitorais, tendo como prioridade nesta primeira fase ter representação na Assembleia Nacional Popular (ANP).
“O nosso foco estará na discussão de ideias e apresentação de projetos concretos para o desenvolvimento do país. Temos ideias claras dos caminhos a seguir, como costumamos dizer, se não for pelo bem do povo, que Deus não nos dê a oportunidade de progredir enquanto partido. Em termos de financiamento, em primeiro lugar vamos contar com os nossos esforços, através do pagamento de quotas. Também estamos em contactos com partidos que têm a mesma filosofia que a nossa, na possibilidade de conseguir alguns apoios básicos” disse.
Questionado se a diáspora guineense tem sido, nos últimos anos, um elemento desestabilizador do país, Badilé Sami respondeu que não se pode reduzir a diáspora a atitude de alguns ativistas, que usam as redes sociais para desferir ódio, intrigas, calúnias, incentivar à guerra, assassinatos e golpes de Estado, argumentando que estes indivíduos não representam a essência daquilo que é a diáspora guineense.
“A diáspora guineense serviu e ainda serve para o sustento de várias famílias na Guiné-Bissau através de remessas mensais. Muitas iniciativas comunitárias de construção de centros de saúde, de escolas e até de pagamento de salários a professores comunitários têm sido asseguradas pela nossa diáspora. A diáspora é constituída, na sua maioria, por pessoas humildes, trabalhadoras e amantes da sua pátria, apesar de terem emigrado devido às circunstâncias da vida” insistiu, para de seguida, afirmar quealgumas pessoas têm aproveitado das redes sociais para contribuir para a “desestabilização da Guiné-Bissau”. Contudo, disse que não se pode categorizar isso, de forma genérica, como atitude da diáspora.
“Não podemos negar que a facilidade do uso da internet e o surto do ativismo cívico e político nas redes sociais têm colocado à prova a diáspora, não podemos negar que algumas pessoas têm aproveitado das redes sociais para contribuir para a desestabilização do país, mas também não podemos categorizar isso, de forma genérica, como atitude da diáspora” assegurou, sublinhando que a diáspora guineense é a reserva académica e económica, principalmente pela sua participação no desenvolvimento do país.
“A reserva moral, temos tanto dentro do país como fora. É verdade que a diáspora é a espinha dorsal de qualquer que seja país estruturalmente organizado, com princípios e valores que poderão contribuir para a construção do Estado, capaz de trabalhar para a criação do bem-estar social, económico e político para o seu povo” disse, afirmando que, na perspetiva do PLGB, a disporá é vista como um elemento muito fundamental na edificação e consolidação do partido por concentrar o maior número de estudantes do ensino superior.
“Se levarmos em conta esta importante reserva acadêmica”, afirmou Badilé Sami, a diáspora pode contribuir positivamente na disseminação da visão, ideologia, princípios e valores de um partido político entretanto, dar algum suporte técnico na concepção de ideias para a implementação dos projetos do partido, assim como pode contribuir na promoção e divulgação da imagem positiva do partido, através das suas relações com instituições estrangeiras, abrindo portas ao partido para uma política externa forte e responsável.
“Porque o partido político que não conversa com o mundo, dificilmente conseguirá encontrar soluções para o desenvolvimento do país. A terceira razão, mas não menos importante, prende-se com os desafios do Partido em mudar a forma tradicional como é feita a política no país. Ultimamente a diáspora tem estado muito ativa na política, sobretudo em termos de produção de conteúdo nas redes sociais (diretos, debates etc.). Contudo a maioria dessas comunicações não têm trazido questões essenciais para o que se pretende, baseiam-se mais em discursos de ódio, intriga, insultos etc.” explicou o jovem político.
“Considerando os desafios que o país tem e que nós temos enquanto partido” assegurou, frisando que o partido quer conscientizar e preparar a diáspora do PLGB para seguir um caminho novo, um caminho de debate de ideias, e com isso tentar mudar o paradigma, o foco do debate ao nível das redes sociais, que na verdade tem sido “muito tóxico, baseado no radicalismo e delinquência virtual”.
Para Badilé Sami, a revisão da Lei eleitoral além de ser necessária é urgente, por a mesma não refletir a realidade dos desafios que a sociedade impõe hoje, sublinhando que isso constitui uma preocupação para o partido, principalmente ao nível nacional, pois há círculos com número significante de eleitores e com um número reduzido de mandatos.
“Por exemplo, em conformidade com os dados que temos das últimas eleições, o maior círculo eleitoral do país, que é o círculo eleitoral 29, com 56 622 eleitores, elege 3 deputados, enquanto o círculo eleitoral 17, com 13 980 eleitores, elege o mesmo número de deputados. O círculo eleitoral 04, com 12 843 eleitores, elege o mesmo número de deputados que o círculo eleitoral 28 que é quase três vezes maior em termos de eleitores, isto é, tem 37 887. Aliás, o círculo eleitoral 21, com 24 053 eleitores, elege mais deputados que o círculo eleitoral 29 mencionado atrás. Achamos por bem que estes dados convocam-nos para uma reflexão mais urgente em termos de redefinição de mandatos. A diáspora não foge à regra”, detalhou.
Embora reconheça que há um número significativo de guineenses sobretudo em Portugal, e tendo em conta o número de eleitores, nas últimas eleições que foi de 6 480 eleitores, Sami afirmou que ainda não justifica aumentar o número de mandatos na diáspora europeia.
“Não podemos ignorar que os sucessivos governos não têm disponibilizado meios e tempo suficiente para um recenseamento mais abrangente na diáspora, mas os dados que temos no momento nos empurram para esta conclusão”, insistiu.
Em relação às recomendações saídas da conferência, o dirigente preferiu não as revelar por questões estratégicas, sublinhando que o intenso debate durante a conferência apontou importantes caminhos que permitirão ao partido estar mais forte no futuro, tanto ao nível da diáspora, como ao nível nacional.
A direção do partido tem-se desdobrado em contatos com alguns partidos em Bissau. Em Portugal, Badilé Sami revelou que o partido foi recebido em várias instituições de ensino, e que teve encontros com algumas representações diplomáticas em Portugal, nomeadamente a embaixada da Finlândia, Irão e Rússia, uma reunião com o líder da bancada parlamentar do Partido Liberal, além de encontros com alguns empresários e líderes sindicais portugueses.
“O cerne destes encontros visou apresentar a visão do Partido para uma nova Guiné-Bissau, manifestar a abertura para parcerias e na construção de um diálogo forte ao nível mundial e ao mesmo tempo tentar saber da experiência de outros países e de algumas instituições em temáticas que constituem a prioridade do Partido, como a educação, a saúde e a agricultura”, concluiu.
Por: Tiago Seide
Foto: Cortesia PLGB