O secretário-geral da organização dos mestres corânicos, Madji-Muato Rawdato Madjalis, Idrissa Biai, afirmou que a abordagem feita pelas autoridades sobre a questão da mendicidade nas ruas de Bissau e nas principais cidades do país “ofendeu” os mestres corânicos, porque não passou por um processo de sensibilização nem sequer foi tratado no fórum próprio.
“A lei é lei, é para cumprir, mas se a decisão envolvesse organizações como a nossa, teria tido outra dimensão e seria tratada de forma organizada, envolvendo todos na busca de soluções consentâneas”, indicou na entrevista ao Jornal O Democrata para falar da decisão do executivo de proibir crianças talibés de pedir esmolas nas ruas de Bissau, na qual apelou todos os mestres corânicos a respeitarem a medida e a abster de qualquer tipo de resistência ou revolta, mas sim continuar a negociar com o governo para resolver os problemas.
O secretário-geral da organização Madji-Muato Rawdato Madjalis disse congratular-se com a decisão das autoridades e disse que um dos objetivos da organização era criar centros de “Daras”, escolas corânicas, para o ensino corânico no país, à semelhança do que acontece no Senegal e outros países vizinhos da sub-região.
“É uma organização nova, que foi criada recentemente. Temos tido dificuldades em cobrir todo o território nacional para responder às demandas. Tínhamos um grupo de cidadãos nacionais que queria converter-se ao Islão, mas não conseguimos fazê-lo a tempo por falta de meios. Apenas em 2022 conseguimos islamizar mil pessoas no setor de Bula. Enviamos mestres corânicos para ajudá-las a aperfeiçoar a religião, construir fontenários, escolas e mesquitas. Neste ano, empenhamo-nos no processo de recenseamento das escolas corânicas, um processo que só o governo pode apoiar. Portanto, não vejo motivos para entrarmos em guerra contra as autoridades”, defendeu.
Idrissa Biai assegurou, em entrevista ao jornal O Democrata, que a decisão está a ser cumprida regularmente, mediante as orientações que a organização está a dar aos mestres corânicos, tendo lamentado que a mesma vai abalar as escolas corânicas, que neste momento estão sem meios e a aguardar as diligências do governo junto dos parceiros de desenvolvimento da Guiné-Bissau para apoiar as crianças em alimentos.
Admitiu que se as ajudas não forem disponibilizadas, as escolas corânicas poderão desaparecer, por falta de condições para sustentá-las, porque “boa parte da sustentabilidade das escolas corânicas vinha das esmolas que essas crianças recebiam de pessoas nas ruas”.
Perante a decisão das autoridades, Idrissa Biai aconselhou os mestres corânicos a abandonarem os principais centros urbanos, a capital Bissau e a apostar na produção de campo para a sua sustentabilidade.
“O ensino corânico tem muita vantagem, porque moraliza a sociedade, sensibiliza pessoas sobre o bem e o mal e promove mudanças numa pessoa”, enfatizou.
“Em diversas ocasiões Madji-Muato Rawdato Madjalis interveio para libertar mestres corânicos detidos no país por desobedecerem às leis do país. O último episódio retratado foi o caso do mestre corânico que levou um grupo de crianças para a apanha da castanha de cajú no setor de Prábis, região de Biombo, violando todos os princípios”, frisou.
ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO DE “TALIBÉS” REGISTA AUSÊNCIA DE CRIANÇAS NAS RUAS DE BISSAU
O presidente da Associação Guineense de Luta Contra Migração Irregular, Tráfico de Seres Humanos e Proteção das Crianças Talibés, Suleimane Embaló, afirmou que a organização que dirige constatou que os mestres corânicos estão a cumprir a decisão do executivo para acabar com a mendicidade das crianças Talibés nas ruas de Bissau e de algumas cidades das regiões do país.
Sustentou que os elementos da organização fizeram uma passeata por diferentes localidades que concentravam grande número de crianças pedintes e não encontraram nenhuma criança nesses lugares a mendigar.
Assegurou que o executivo deve trabalhar seriamente na campanha de sensibilização junto dos mestres corânicos sobre a situação de mendicidade das crianças talibés, porque “só assim será possível chegar a um bom porto”.
Suleimane Embaló assegurou que a situação das crianças talibés está controlada neste momento e prova disso não foi constatada nenhuma criança nas periferias de Bissau a pedir esmola, por isso frisou que o executivo deve manter-se firme na sua posição e procurar mecanismos para apoiar os mestres corânicos, que reclamam falta de meios ou alimentos para sustentar os alunos, cuja maioria vem do interior do país.
Explicou que a organização que dirige fez um recenseamento das crianças talibés no Setor Autónomo de Bissau e estima-se que estejam a viver na capital 721 crianças, das quais mais de 100 mendigam nas ruas de Bissau, acrescentando que esses dados foram entregues à entidade responsável para a proteção das crianças na Guiné-Bissau. Avançou que neste momento a organização está a preparar um recenseamento das crianças talibés nas regiões, de Gabú, de Bafatá e de Quinará para ter um banco de dados credível, a nível nacional, sobre a mendicidade das crianças na Guiné-Bissau.
“Quando encontramos as crianças talibés nos lugares onde frequentam, e os agentes da Guarda Nacional e da Migração e Fronteiras a vigiarem e a controlarem a situação, concluímos que o governo está determinado em acabar com essa situação. Prender qualquer criança encontrada na rua é uma das medidas do governo. Nós pedimos mais uma vez a colaboração da associação dos mestres corânicos e Imames para não mandarem as crianças para as ruas até que sejam encontradas soluções consentâneas à situação da mendicidade”, sublinhou.
Por: Aguinaldo Ampa/Filomeno Sambú