[ENTREVISTA_abril_2023] Na ausência dos serviços veterinários, os caprinocultores (vendedores de cabras e carneiros) guineenses recorrem a medicina tradicional para tratar caprinos doentes ou adquirir medicamentos de parceiros nos países vizinhos para salvar as vidas dos animais, revelou Sadjá Dembu, um dos membros associados da organização.
O caprinocultor, que há mais de trinta anos faz esse negócio, disse em entrevista ao Jornal O Democrata que abatem caprinos em péssimas condições de higiene, sem água, nem luz e nem apoio das autoridades da veterinária e que todas promessas que receberam das entidades ligadas a esse setor não foram cumpridas, tendo alertado que não estão dispostos a continuar a trabalhar naquelas condições, razão pela qual exigiu celeridade no processo de canalização da água e a criação de condições higiénicas para o abate de caprinos.
VENDEDORES DE CABRAS CRITICAM COBRANÇAS EXAGERADAS DO VETERINÁRIO E DOS COMITÉS DE ESTADO
“Apesar de várias denúncias e apelos, não temos recebido apoios de ninguém. Na fronteira com os países vizinhos continuamos a pagar mil francos CFA por cada camião, mas na Guiné-Bissau se transportar cem cabras ou ovelhas, terá que pagar cem mil para a veterinária e cem para o Comité de Estado”, denunciou.
Criticou as autoridades por não terem levado em consideração os prejuízos que sofrem em cada transporte de animais da fronteira para Bissau, revelando que “com exceção do atual presidente da Câmara Municipal de Bissau, todos os problemas que enfrentamos são do conhecimento das autoridades que tutelam esse setor”.
“Para o aluguer, gastamos 150 a 160 mil francos CFA da fronteira para Bissau. Por isso, várias vezes subimos o preço de venda de cabras para compensar os prejuízos. O Estado não subvenciona as nossas atividades. Os nossos colegas do Mali, do Senegal e da Guiné-Conacri são subvencionados de seis em seis meses pelas autoridades locais e têm crescido bastante nas suas atividades. É claro que não estamos dispostos em continuar a trabalhar nessas condições, mas é o que temos como alternativa. Dói dizer isso publicamente, mas é o que nos resta”, lamentou.
Denunciou que os caprinocultores guineenses tinham adquirido um espaço de um cidadão nacional num valor de mais de cinco milhões de francos CFA na zona industrial de Brá, mas o Estado guineense apoderou-se desse espaço e foram expulsos de lá sem que lhes tenha sido apresentado uma solução.
“Compramos, legalizamos e fizemos tudo quanto era necessário, mas o Estado apoderou-se do espaço no período de transição. Todos os presidentes da Câmara Municipal de Bissau foram colocados a par da situação, mas ninguém mexeu uma única palha”, revelou.
DEMBU CONVIDA OS BANCOS COMERCIAIS À TRABALHAR COM OS VENDEDORES DE CABRAS
“Neste novo espaço, nos corredores de Antula e Gabu Zinho nós é que assumimos todas as despesas. Contratamos guardas que pagamos a cada mês. Nos períodos das quadras festivas, nomeadamente Natal, Ano Novo e carnaval, reforçamos os guardas porque os riscos são maiores, tanto para nós, quanto para os responsáveis máximos do armazém dos animais, quanto para os seguranças. No bairro de Ajuda, assaltaram-nos e levaram 15 carneiros apenas numa noite. A avaliação que fizemos, foram cerca de dois milhões de francos CFA perdidos e quem assumiu pagá-los foram os responsáveis do armazém”, afirmou.
Segundo Sadjá Dembu, os guardas permanentes são pagos a 70 ou 80 mil francos CFA e os contratados 12 a 13 mil diários, tendo revelado que há trinta anos que trabalha nesse ramo, nunca os serviços veterinários passaram por lá para examinar ou vacinar os animais. Como alternativa, recorrem a mecanismos tradicionais para tratamento de caprinos.
“O meu pai era criador de ovelhas e cabras. Cresci aprendendo a vê-lo a tratar e a curar os animais com recurso a medicamentos tradicionais. Talvez tenham havido a vacinação nas tabancas, mas em Bissau, cá, nunca. Aliás, os animais que compramos nas fronteiras dos países vizinhos são vacinados e examinados de seis em seis meses”, afirmou.
Dados avançados indicam que o novo centro de venda de animais de Antula foi construído para albergar gado, suínos e caprinos, mas até ao momento apenas concentra caprinos e suínos.
“Conseguimos compensar os prejuízos com ajuda dos nossos colegas, não do Estado nem de nenhuma entidade. Aliás, o Estado guineense não tem essa cultura de apoiar pequenas iniciativas como essa, esquece meu filho. Talvez na outra encarnação”, disse Sadjá Dembu.
Sadjá Dembu, um dos associados da organização, disse que não recorrem aos empréstimos dos bancos comerciais por recearem ser tratados mal ou desprezados e porque também nunca passou-lhes pela cabeça que pudessem ganhar alguma confiança dessas entidades.
“A ideia que se tem dos caprinocultores é que somos a camada vulnerável. Mas convido os bancos comerciais a fazerem experiências com pessoas deste ramo de negócio. Avaliar, por exemplo, os patrimónios de cada um antes do empréstimo, talvez seja um dos mecanismos para estabelecer confiança recíproca entre nós e os bancos comerciais. Nos países vizinhos são os bancos e o Estado que financiam essas iniciativas”, assinalou.
DG DA PECUÁRIA: “É URGENTE A COLOCAÇÃO DE UM MÉDICO VETERINÁRIO NO MATADOURO DE ANTULA”
Em reação à ausência de técnico veterinário no Matadouro de Antula, o diretor-geral da Pecuária, Bernardo Cassamá, defendeu que é urgente colocar um médico veterinário no matadouro de Antula.
Embora reconheça que é uma obra inacabada, sublinhou que é vital colocar um médico veterinário no local para acompanhar o estado de sanidade dos animais e, consequentemente, evitar doenças transmissíveis derivadas de animais.
“É urgente a presença de um agente veterinário para tratar do estado de saúde dos caprinos que entram e saem do local. Vamos reunirmo-nos com a direção da Câmara Municipal de Bissau e analisar essa vertente de ter um agente veterinário permanente no local”, anunciou.
Bernardo Cassamá revelou que 75 por cento de doenças transmissíveis vêm dos animais, realçando que é necessário proteger a saúde animal, ambiental e humana.
“É necessário retomar o programa saúde única, proteger a saúde animal, ambiental e humana. Aliás, foi justamente por isso que a feira foi construída para que as autoridades ligadas ao setor possam ter controlo dos animais comercializados em diferentes pontos da capital Bissau, para preservar a saúde pública. Estamos perante um perigo público”, reconheceu.
Por: Filomeno Sambú
Foto: Marcelo Na Ritche