Sete milhões de senegaleses são chamados domingo, 24 de março de 2024, a escolher, entre o candidato do Governo e 16 rivais, um novo Presidente com quem investir as receitas esperadas do gás e do petróleo no desenvolvimento do país.
Entre os 16 homens e uma mulher inscritos no boletim de voto, dois assumem particular protagonismo, um pela promessa de mudança, o outro pela garantia de continuidade: Bassirou Diomaye Faye, principal candidato da oposição, apresenta-se como uma figura anti-sistema; Amadou Ba, delfim escolhido pelo atual Presidente, Macky Sall, para uma corrida na qual reclamou protagonismo até ao fim, chega às urnas empunhando a bandeira da coligação no poder, Benno Bokk Yakaar (BBY, Unidos pela Esperança, em wolof).
“Atualmente, são estes os dois candidatos que estão no centro das atenções e é muito provável que, em caso de segunda volta, sejam eles a voltar a encontrar-se”, afirmou à Lusa, em declarações a partir de Dacar, Paulin Maurice Toupane, analista principal do Institute for Strategic Studies (ISS), encarregado de acompanhar a política senegalesa.
Diomaye Faye – também ele um candidato escolhido por uma figura política impedida de concorrer, no caso, o principal rosto da oposição senegalesa, Ousmane Sonko, travado pela justiça do país – fez campanha com a promessa de levar o país, vizinho da Guiné-Bissau, a criar uma nova moeda e a sair do franco CFA.
A renegociação dos contratos de exploração mineira e de energia que farão do Senegal um produtor de petróleo e gás natural a partir do final do ano foi outra das bandeiras de campanha de Sonko/Faye.
A carta da energia senegalesa é particularmente sensível à Europa, desde que foi forçada a procurar alternativas à Rússia, mas também num contexto em que a França — o país com a presença mais influente na região — está a ser literalmente expulsa de várias das suas antigas colónias na África ocidental, nomeadamente no Sahel, onde a Rússia tem vindo a ocupar o seu lugar.
Amadou Ba posicionou-se como um político com a experiência necessária para conduzir os destinos do país — numa demarcação em relação às principais figuras da oposição — Sonko e Faye -, e fez campanha pela continuidade do plano “Senegal Emergente”, que marcou o essencial do desempenho governativo de Macky Sall, assente na construção de infraestruturas.
Estas eleições mobilizaram o maior número de candidatos presidenciais em toda a história do país – chegam 17 às urnas este domingo, eram 19 no início da semana, mas foram apenas cinco em 2019 e 14 em 2012. A repetir-se a história, por outro lado, o sucessor de Macky Sall será escolhido numa segunda volta a realizar-se no terceiro domingo a seguir ao anúncio dos resultados da primeira volta, caso nenhum dos candidatos obtenha uma maioria absoluta dos votos no domingo.
O analista do ISS não descarta, porém, a possibilidade de o escrutínio ficar resolvido à primeira volta: “Não devemos excluir totalmente essa possibilidade. Desde a libertação de Ousmane Sonko e de Bassirou Diomaye Faye da prisão, a campanha eleitoral tomou um novo rumo”.
“Houve uma nova reviravolta, com grandes mobilizações de jovens em torno da candidatura de Bassirou Diomaye Faye, que atraiu uma concentração grande de atores políticos provenientes da generalidade da oposição, mas também de organizações da sociedade civil e mesmo de movimentos religiosos”, acrescentou.
Esta semana, na passada quarta e depois na quinta-feira, dois candidatos presidenciais, Cheikh Tidiane Dieye e Habib Sy, retiraram-se e apelaram aos seus apoiantes para votarem em Bassirou Diomaye Faye. As duas candidaturas foram essencialmente instrumentais, decididas quando o Pastef, o partido de Sonko, entretanto ilegalizado, percebeu que poderia não conseguir constituir como candidato a principal figura da oposição senegalesa.
Entretanto, ontem (sexta-feira), Bassirou Diomaye Faye recebeu mais um apoio importante, o de Karim Wade, filho do antigo presidente Abdoulaye Wade e líder do Partido Democrático Senegalês (PDS), ele próprio impedido de concorrer às eleições de domingo por deter dupla nacionalidade senegalesa e francesa no momento em que apresentou a candidatura.
Não obstante a acumulação de apoios por parte de Faye, a resolução das presidenciais em apenas uma volta dependerá da afluência às urnas, segundo Paulin Maurice Toupane. Se a participação eleitoral for elevada, sobretudo entre os jovens, “a possibilidade de uma vitória à primeira volta tornar-se-á uma realidade”, disse.
Yamingue Betinbaye, analista do International Crisis Group (ICG) para a África Ocidental, considera improvável a eleição em apenas uma volta assim como não descarta as possibilidades eleitorais de mais duas figuras entre os 17 candidatos: as de Khalifa Sall, ex-presidente da câmara de Dacar, entre 2009 e 2018, e Idriss Azek, antigo companheiro de luta do ex-Presidente, Abdoulaye Wade, antecessor de Macky Sall.
“Todos estes quatro candidatos — incluindo Amadou Ba e Bassirou Diomaye Faye – destacam-se do lote e podem obter resultados aceitáveis”, afirmou em declarações à Lusa.
Quanto à lisura da eleição, ambos os analistas preveem um escrutínio livre e justo, sem incidentes significativos, que possam desvirtuar o processo.
“O Senegal revelou-se uma democracia que respira bem, pelo que as instituições encarregadas de gerir as eleições se habituaram à transparência na gestão do processo eleitoral”, sublinhou Betinbaye.
“Alguns candidatos apelaram a uma maior vigilância, mas penso que é muito improvável que qualquer fraude eleitoral possa ter êxito no atual contexto senegalês”, disse também Paulin Toupane.
“O processo de contagem dos votos e de compilação dos resultados põe em prática um mecanismo transparente, com a participação de todos os representantes dos partidos políticos, da sociedade civil, dos observadores e mesmo da imprensa, que transmite a contagem dos votos diretamente após o encerramento das assembleias de voto às 18 horas”, acrescentou.
In lusa