Opinião: O PARADOXO DA BANCA EXAMINADORA DE MONOGRAFIA

Caros colegas docentes, gostaria, através deste meio, manifestar as minhas preocupações relativamente ao fenómeno ligado a defesa das Monografias como requisito parcial para a obtenção do grau de Licenciatura. É sabido que é comum e imperativo o cumprimento desse requisito indispensável na academia. Ou seja, depois dos quatro anos de formação superior, os estudantes têm o dever de escolher um orientador, um tema, redigir uma monografia e posteriormente efetuar a apresentação em normalmente (15 minutos), caso da Uni Piaget.

Essa apresentação é de carater publico, podendo participar os familiares, colegas da Universidade, havendo júri indicado pela coordenação do curso ou pelo conselho científico, dependendo do critério instituído pela universidade. Porém, o que ocorre nas defesas das Monografias, nas universidades do país é muitas das vezes incongruente com deontologia profissional. Uma incongruência ligada a um funcionamento debilitado por parte das universidades.

A apresentação das Monografias tornou-se na tarefa mais complicada para os estudantes. Parece que os docentes exigem dos estudantes numa apresentação de 15 minutos, o que eles próprio não conseguem transmitir ao longo dos quatro anos de formação. Aprendemos no estudo de metodologia segundo Domingos Salvador que a monografia para os graduados, isto é, os licenciados que este exercício tem um carater de aprendizagem e não se espera de um aluno de licenciatura uma reflexão aprofundada do tema.

Não se pode ignorar o fato de que existe uma correlação muito forte entre o que os estudantes aprendem ao longo do curso e o que apresentam na defesa de Monografia. É uma correlação de causa e efeito. Por exemplo, a ausência em muitas ocasiões da cadeira de Metodologia de Investigação Científica no primeiro ano do curso, e em algumas ocasiões apenas no ultimo ano do curso, constitui uma das enormes dificuldades por parte dos estudantes em familiarizar com o processo de pesquisa. A produção de um documento cientifico exige o conhecimento do desenho de investigação constituído por três elementos que são: a teoria e a empiria, ligado pela metodologia, é só com este que se produz um documento cientifico. É por esta razão que a avaliação de uma monografia em muitas instituições de ensino superior, a nota de avaliação é dividida em três: Estrutura 07 valores, o conteúdo 07 valores e a defesa 6 valores daí se o aluno respeitar escrupulosamente a norma da Universidade ele entra logo na defesa com 07 valores.

Com pequenas variações, algumas universidades só instituem essa cadeira a partir do segundo semestre do segundo ano, ou a partir de terceiro ano. Suponhamos que os estudantes não tiveram a cadeira de Metodologia de Investigação Científica, então criteriosamente os outros docentes não deveriam exigir deles trabalho de investigação. E quanto mais dura o tempo de os estudantes familiarizarem e aprenderem a metodologia correta, menor será a probabilidade de evoluírem no processo de investigação.

Um outro elemento importante a considerar, é uma clara desorientação em relação a norma instituída pelas universidades. Sabe-se que existem varias normas aceites como guião para implementar durante a elaboração dos trabalhos académicos. Ora, não há uma conformidade entre os conteúdos de metodologia de investigação que os docentes lecionam e a norma implementada pelas próprias universidades como guião para a elaboração de monografia.

Além disso, a própria cadeira de metodologia, acaba concentrando mais no “Projeto de Monografia” do que Monografia propriamente dito. E como é do conhecimento geral na academia, o projeto é um requisito apresentado ao conselho científico que por sua, feita a avaliação pronunciar-se-á sobre a possibilidade de avançar com o trabalho ou então recomendar alguns ajustes ou correções.

O Projeto de Monografia não é propriamente a Monografia. E na maioria das vezes, os docentes da cadeira de Metodologia de Investigação nas Universidades do País, apenas ensinam é o Projeto, não a Monografia. Essa incongruência é consensualmente silenciada na academia, e sabe-se igualmente que é o que está na base das limitações apresentadas pelos estudantes.

Outro aspeto não menos importante é o fato de serem os estudantes a procurarem os seus orientadores, dentro e fora da Universidade. Podia a Universidade, através da coordenação do curso, ajudar na identificação dos docentes e efetuasse uma assistência junto desses. Essa identificação dos orientadores pela coordenação do curso podia respeitar o principio de especialização. Ou seja, os estudantes podiam ter a oportunidade em trabalhar com os docentes que se especializaram na temática por eles escolhido.

Por fim, os júris que vão as bancas, geralmente tratam os estudantes como se esses fossem réus criminosos e, portanto, estão lá para os julgar. O papel fundamental dos júris não é exatamente isso. Pelo contrario os júris estão para ajudar e decifrar alguns equívocos técnico e científico que poderia ajudar no melhoramento de compreensão de metodologia.

É importante elencar três aspetos fundamentais em que os júris pecam consideravelmente quando estão a “julgar” os estudantes. O primeiro aspeto tem haver com a norma aplicada para a elaboração da monografia; o segundo aspeto é relativamente aos Temas escolhidos pelos estudantes; terceiro e ultimo é sobre juízo emitido, ou seja, a observação teórica.

Relativamente ao primeiro ponto, algumas universidades disponibilizam o guião, para a elaboração de Monografia. No entanto, esse guião apresentado possui geralmente normas mistas, ou seja, reúne duas ou mais normas, que geralmente são a norma Americana APA ou a norma Brasileira ABNT, por vezes a norma Portuguesa NP 405.

Perante isso, os estudantes não podem assumir a responsabilidade pelo fato de seguirem um guião facultado pela Universidade, ou simplesmente optar por seguir uma única norma para o desenvolvimento do trabalho. Os estudantes estão numa posição de liberdade académica, qualquer opção, não pode carretar censura contra a Monografia. Os docentes devem se esforçar para compreender essa realidade. Além disso, é imperativo que os docentes dominem as três normas e decifrar quando se tratam de serem mistas ou livres da mistura uma da outra.

O mais importante neste aspeto, é identificar os elementos característicos de um trabalho aceite como Monografia, ou seja, aplicar os critérios de avaliação de um trabalho de investigação. Afinal, um estudante que teve a cadeira de Metodologia tardiamente e que aprendeu o Projeto de Monografia, não a Monografia propriamente dita e teve que se esforçar para encontrar um orientador, deve no mínimo ser compreendido.

O segundo aspeto é concernente aos Temas escolhidos pelos estudantes. Geralmente as Universidades não mergulham nas suas responsabilidades para evitar os possíveis equívocos. Os Temas são normalmente apresentados à coordenação do curso e esse por sua vez apresenta no conselho científico para sua aprovação. Há muitas razões para isso, primeiro para evitar “copi-cole” dos Temas e igualmente para certificar se o Tema possui um enquadramento ligado ao curso, a época, a contextualização e a realidade e ainda serve para observar a delimitação do tema, no seu horizonte temporal ou espaço definido.

Depois desse procedimento, os estudantes podem avançar com a pesquisa. Ora, o que geralmente acontece é que as Universidades não cumprem rigorosamente todas as suas responsabilidades, no entanto a Banca examinadora exige dos estudantes uma perfeição, que os mesmo não podem cumprir. A solicitação da perfeição, na academia é por si só, não científico. Não se pode exigir de um estudante de licenciatura, uma análise cientificamente profunda do tema escolhido.

Os trabalhos de Monografias exigem mais de “estrutura do que conteúdo”. Independentemente de que as condições académicas do país não favorecem esse exercício, os trabalhos de Monografia exigem o respeito integral da norma aplicada, coesão e coerência do texto, contribuição científica, apresentação clara dos resultados e atualidade do tema.

Um do mal da academia guineense, é aquilo que o cientista Steven Pinker chamou de “maldição do conhecimento”, ou seja, alguns docentes caem na armadilha, ao supor que os estudantes deviam cumprir todas as exigências numa monografia. Ou devem fazer analise igual ao deles mesmo tendo a ciência de que os níveis não são iguais.  Se os estudantes tivessem o grau dos docentes e equilibrassem em conhecimento do tema abordado, de certo que não serão por esses avaliados.

Porém, essa questão poderia ser resolvida caso os docentes revisitassem os seus manuscritos de pesquisas que apresentaram durante os anos de estudo e até as suas monografias. Comparar esses trabalhos com a sua evolução académica atual. Como disse um velho ditado “Deus me livre daquilo que não vi.”

Se os docentes fizessem um pequeno esforço de revisão dos seus manuscritos, talvez teriam maior compaixão para com os estudantes e seriam menos intolerantes. Os trabalhos de monografia não definem exatamente o histórico académico dos estudantes, nem prevê o seu futuro académico exato, é apenas uma fase de transição académica. Atormentar os estudantes, não fará os docentes de melhores nem fará dos estudantes os piores de sempre.

O terceiro e ultimo aspeto é relativamente a elevada emissão do juízo por parte da banca examinadora. Em muitas ocasiões, os docentes abandonam a avaliação pratica do trabalho e concentram-se mais em emitir as suas opiniões, sem que, essas opiniões muitas vezes fossem tecnicamente bem fundamentadas. Ou seja, alguns docentes que se pretendem gabar, preferem ataques diretas aos estudantes e ataques indiretas aos orientadores desses. Assim como disse, a banca examinadora não é tribunal, nem os estudantes são réus. Os docentes que vão a banca devem abandonar a vontade de deixar cabisbaixo os estudantes e nem devem menosprezar os seus esforços.

Os docentes podem emitir as suas visões, mas não podem crer que essas opiniões sejam vinculativas e mais validas do que as ideias apresentadas no trabalho. Verifica-se que alguns docentes preferem comentários muito mais subjetivo do que realmente objetivo. Não se deve desconsiderar uma ideia em detrimento da tua. Salvo preenchido todas as razões científicas para o efeito. Fato que não se verifica muitas vezes nas universidades do país.

Por exemplo, achar que a introdução não está bem-apresentada, sem indicar os elementos que devem encostar numa introdução, ou achar que as citações não respeitam as normas, sem especificar a norma referida, é estar a pecar sem se aperceber. As intervenções dos docentes devem ser de carater meramente técnico e científico, evitar ao máximo, o subjetivismo.  Os trabalhos de Monografia deviam ser avaliados com base na coerência textual, sequencia e fundamento. Quando os docentes abandonem a função objetiva na avaliação dos estudantes, é porque estão a expor as suas próprias limitações.

Não é cientificamente correto tentar impor aos estudantes algo predefinido pelos docentes. O máximo de academia é que o pensamento é livre desde que seja devidamente sustentado e evidenciado. A produção científica está em constante evolução. As contradições, os debates e os confrontos das ideias constituem leis fundamentais da academia.

O método científico é variável e apesar de alguns critérios de recolha dos dados aproximar dos fatos, as relações existentes entre eles não são hierárquicas. A apresentação dos resultados de qualquer trabalho depende muito das fontes de recolha e das complexidades da temática.

As deduções resultantes de observação ou de experiências não nos dão garantia da cientificidade dos trabalhos, no entanto não podem ser excluídos do processo de avaliação de critério. Assim também as amostras por si só, não garantem nada de cientificidade. Ademais, não é cientificamente correto uma determinação categórica dos fenómenos ou dos fatos. Nada é categórico de ponto de vista científico, tudo é relativo. O fato das nossas investigações nos aproximar da verdade, não significa que seja a verdade. No entanto, as nossas investigações nos levam crer na verdade dos resultados obtidos pela pesquisa. Assim como se diz que a “unanimidade mata a democracia” a perfeição na academia constituiria o fim das investigações, logo o fim da ciência.

Os dados recolhidos e tratados num dado período histórico, pode não servir para outro período dependendo fundamentalmente da evolução de produção científica. Igualmente os resultados de produções académicos não têm a mesma força de ação, avaliado pela diversidade tempo espacial.

Considerando esses elementos, vale relembrar que os fenómenos socias que são sempre objetos de analise dos estudantes, também estão em constante dinâmica. Por isso, as censuras de que os estudantes são sempre alvos, não possuem nenhum valor científico no sentido critico de termo.

A presente reflexão não constitui nenhum convite para os estudantes abandonarem os esforços necessários de modo a apresentar melhores resultados possíveis. Em vez disso, é um lembrete aos docentes de que é mais importante cumprir tudo quando necessário, desde que esteja nos limites traçados pelo normal funcionamento das universidades.

Bissau, junho de 2024

Por: Alberto Carfa Jaura

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