O economista guineense e analista, Serifo Só, elegeu o setor agrícola e as infraestruturas portuárias como prioridades no aprofundamento da cooperação bilateral que se perspectiva entre o governo da Guiné-Bissau e o da China Popular, no âmbito da visita de Estado que o presidente guineense efetua àquele país asiático.
“Se a Guiné-Bissau tiver um plano ou programa de desenvolvimento adequado, deveria priorizar a modernização do seu setor agrícola, tendo em conta a potencialidade do país neste setor. Modernizar a agricultura e um investimento sério permitiria ao país auto sustentar-se no mercado interno, o que seria um grande alívio para a nossa balança comercial. A Guiné importa duzentas mil toneladas de arroz anualmente, mas com o apoio da China e um investimento sério é possível produzir essa quantidade ou mais”, disse o economista na entrevista telefónica ao nosso jornal O Democrata para debruçar-se sobre as perspetivas de relançamento da cooperação bilateral entre o gigante asiático e a Guiné-Bissau, sobretudo falar dos setores que deveriam constituir a prioridade na cooperação entre os dois países no sentido de relançar a economia guineense.
A Guiné-Bissau e a República Popular da China estabeleceram relações diplomáticas em 1974, uma relação iniciada pelos líderes históricos dos dois países, mas que foram interrompidas entre 1990 e 1998, uma vez que o governo guineense decidiu reconhecer Taiwan como um Estado soberano, em detrimento da República Popular da China.
A China investiu milhares de dólares nas infraestruturas erguidas no país, entre as quais se destacam o edifício da Assembleia Nacional Popular (Palácio Colinas de Boé), o Palácio do Governo, o Palácio da Justiça, a reconstrução do Palácio da República e a construção de um edifício semelhante no quintal, e várias unidades hospitalares. A China, de acordo com os dados de 2023 do Instituto da Promoção e Comércio de Macau, exportou cerca de 60 milhões de dólares norte-americanos para a Guiné Bissau, sendo principalmente arroz polido, estações portáteis de comunicação e calçado, enquanto as importações da Guiné-Bissau se rondam a 1.500 dólares.
“INSTABILIDADE POLÍTICA É UM CANCRO PARA O INVESTIMENTO PESADO NA GUINÉ-BISSAU”
O economista disse que as infraestruturas portuárias, rodoviárias e inclusive ferroviárias deveriam constar na lista de prioridades na agenda de cooperação que se perspectiva entre os dois países.
“Os guineenses sabem e muito bem da condição em que se encontra o nosso porto, que não tem capacidade para atracar dois ou três navios de grande porte, por isso é importante aproveitar essa cooperação para aumentar a capacidade do porto de Bissau e apresentar um projeto da construção do porto de Pequil, que os estudos feitos indicam que é viável. E apresentar igualmente projetos de infraestruturas rodoviárias que nos permitiriam sair do porto e deslocar-se para diferentes áreas do país”, assegurou, para de seguida avançar que é possível também o país pensar no projeto do porto de águas profundas de Buba, que segundo a sua explicação pode servir de um porto alternativo de trânsito para os países como o Mali e Burkina, com escassez de portos.
“O país deve pensar no programa de desenvolvimento ambicioso apresentado aos parceiros como a China. O porto de Buba é um porto alternativo para os países com escassez de portos e pensar numa estrada ferroviária que liga o nosso país ao Mali e Burkina”, disse, avançando que a Guiné-Bissau pode ter três portos para diferentes países da sub-região, incluindo para os habitantes de Tamba no Senegal, sustentando que apenas as receitas provenientes destes países seria quádruplo daquele que seria arrecadado nos portos de Bissau.
Questionado se é possível a execução destes projetos, particularmente portuários através da cooperação bilateral com o gigante asiático, afirmou que é possível a execução destes projetos no âmbito da cooperação que se perspetiva com a China Popular, tendo acrescentado que a China Popular detém hoje a maior reserva da economia no mundo e que ultrapassa mesmo os Estados Unidos da América, em termos da reserva federal.
“A China, com a reserva que tem, está a investir em África e neste momento tem muito capital que pode usar para investir neste país. Os recursos que poderiam ser usados para a implementação destes projetos de que estamos a falar, seriam como gota de água no oceano para a China”, contou.
Sobre o alargamento da cooperação para os setores de serviços e telecomunicações, reconhece que estes setores são igualmente importantes para o país, mas continua a defender que o governo guineense deve concentrar-se nos setores que ajudarão no desenvolvimento económico e rendimento para a sua população, que são a agricultura e infraestruturas portuárias.
O economista defendeu ainda que a intervenção da classe empresarial chinesa deve ser direcionada para a transformação local da castanha de cajú que, no seu entender, seria mais rentável para a economia do país. Acrescentou que devido ao poderio económico da China, é melhor mobilizar a classe empresarial chinesa à investir no setor agrícola, sobretudo na produção de arroz e na transformação da castanha de cajú.
Questionado ainda se a instabilidade política e governativa não constituiria um risco para o investimento pesado que se perspectiva da classe empresarial chinesa, respondeu que na verdade ninguém quer investir o seu dinheiro num país que não tem estabilidade, lembrado que “nos últimos tempos a Guiné-Bissau tem a fama de um país instável e não só com os tiros, porque mesmo com o calar das armas, tornou-se num país instável. Porque é um país em que o governo dura três meses ou menos de um ano”.
“Os empresários chineses sabem que há todas as condições climatéricas e naturais para investirem na Guiné, mas o maior handicap que temos é a instabilidade política e governativa que não só afeta a cooperação, mas afeta mesmo a nossa situação económica”, disse, alertando que a instabilidade política é um cancro para o investimento estrangeiro na Guiné-Bissau.
Em relação às trocas comerciais entre os dois países, a China em 2023, exportou para a Guiné-Bissau cerca de 60 milhões de dólares e a Guiné-Bissau para a China, na ordem de 1.500 mil dólares, disse que a balança é deficitária para a Guiné-Bissau, acrescentando que o déficit é de mais de 58 milhões de dólares na sua balança comercial. Alertou que é preciso o país começar a investir na produção de cereais para, pelo menos, atingir o mercado da sub-região, bem como na transformação local da castanha de cajú e vender para a China e outros gigantes asiáticos.
Contatado por telefone para falar sobre as trocas comercias entre a Guiné-Bissau e a China, o diretor-geral do Comércio Externo, Lassana Fati, disse que a Guiné-Bissau e a República popular da China têm reforçado as trocas comerciais com a maior incidência na importação dos produtos de vários tipos, sem, no entanto, especificar. E enfatizou que a China tem um mercado vasto que tem ajudado no abastecimento do mercado nacional, citando o relatório da supervisão comercial da UEMOA 2023, explicou que a China figura na 2ª posição em termos de trocas comerciais, em vários milhões de dólares.
Fati assegurou que as autoridades acompanham com muito interesse a presença de empresários chineses que estão a investir em diferentes domínios sobretudo comercialização e exportação da castanha de cajú, pescado e exploração dos recursos naturais, tendo salientado que o país dispõe de um potencial enorme no domínio do Turismo, recursos naturais, agricultura e transformação dos produtos locais, que na sua opinião, podem ser aproveitados para a classe empresarial chinesa para investir.
Solicitado a pronunciar-se sobre o volume das trocas comerciais entre os dois países, informou que de acordo com o trabalho levado a cabo pelo ministério do Comércio e Indústria em 2022, 0 Portugal continua a ser o principal fornecedor extra comunitário da Guiné-Bissau com 29,3%% (30.703,9 Milhões de F CFA) e seguido pela China com 13,2%% (13.852,2 Milhões de F CFA).
Por: Assana Sambú