O Secretário-executivo do Observatório Guineense da Droga e da Toxicodependência (OGDT), Mestre Abílio Aleluia Có Júnior, exortou o governo que é preciso trabalhar seriamente na elaboração de uma cartografia de pontos de tráfico, da criminalidade organizada e consumo precoce de drogas. Também mostrou a necessidade de realização de estudos de prevalência do consumo de drogas, de álcool e de tabaco na Guiné-Bissau, de forma a facilitar as entidades que lutam todo o dia no combate ao tráfico e na sensibilização das populações sobre os riscos nocivos e as consequências do consumo de estupefacientes.
“O consumo precoce de drogas no nosso país aumentou significativamente e nos últimos tempos tem-se verificado o surgimento de novos tipos de drogas que em 2000 não havia. De 2023 a 2024, o país já conheceu um novo tipo de droga chamada “KUSH” que tem um efeito psicótico muito grave. Esta droga já está a circular na sub-região africana, na Serra Leoa, onde foi declarada a emergência nacional, no Gana, na Nigéria, no Senegal e na Guiné-Conacri. É uma preocupação enorme para a Guiné-Bissau e para a nossa costa, porque o consumo de drogas é tido neste momento como um problema de saúde pública. Hoje, temos o surgimento de drogas injetáveis e os usuários partilham seringas sem cuidados mínimos. Hoje, um certo número de usuários tem problemas associados a VIH/SIDA, Hepatites B e C e a Tuberculose. É preciso que o Estado da Guiné-Bissau, em parceria com a comunidade internacional, sob a coordenação da UNODC trabalhe afincadamente no combate à droga, sobretudo na elaboração de uma cartografia de pontos do tráfico, da criminalidade organizada e consumo precoce de drogas, que será colocada apenas à disponibilidade das entidades competentes”, exortou o ativista de combate ao consumo de drogas, na entrevista ao boletim “Info-Droga”, retomado pelo semanário O Democrata.
“ILIBAR CABECILHAS DE DROGA DA “OPERAÇÃO NAVARA” REVELA IMPLICAÇÕES DE JUÍZES E POLÍTICOS“
Mestre Abílio Aleluia Có Júnior afirmou que é óbvio que a circulação da droga em grande quantidade no país vai continuar a beliscar a imagem da Guiné-Bissau perante a comunidade internacional, por causa da vontade política, incompetência e da ineficiência das autoridades guineenses no combate ao tráfico de drogas, por isso o país tem sido apelidado de narcoestado.
Defendeu que é preciso que haja vontade política, porque “o maior estrangulamento no processo de combate à droga é a falta de vontade das autoridades políticas da Guiné-Bissau”.
“Não tem havido um trabalho sério no combate ao tráfico de drogas no país. Na Guiné-Bissau, as pessoas não zelam pelo bem comum, cada um defende o seu interesse pessoal e isso tem contribuído na degradação da imagem do país”, afirmou, lembrando que depois da denúncia do antigo Primeiro-ministro, Nuno Gomes, sobre a existência da droga em grande quantidade no país, o Ministro do Interior e da Ordem Pública e todo o seu staff têm-se movimentado e reunido com os agentes das alfândegas do aeroporto, fez uma série de lamentações e imputou responsabilidades às chefias, aconselhando-as a encararem a sério o combate contra a droga.
“O Ministro do Interior, Botche Candé, avisou que se voltasse a passar uma grama de droga no aeroporto todos os elementos que estivessem de serviço seriam mandados para casa à espera da segunda ordem. Duas semanas depois, duas malas de cocaína com 32 Kg foram apreendidas pela Polícia Judiciária no aeroporto de Portela, em Portugal, que passaram pelo aeroporto da Guiné-Bissau. Como é possível embarcar duas malas de cocaína sem detectá-las? O que é que os elementos da Guarda Nacional, das alfândegas e da Polícia de Ordem Pública fazem no aeroporto? Estes fatos revelam que há uma brincadeira no combate às drogas e a falta de vontade séria das nossas autoridades políticas e de forças de defesa e segurança”, revelou.
Mestre Abílio Aleluia Có disse que um país com problemas de tráfico de drogas é um país à beira de desaparecer, porque a droga destrói um país, uma nação, desestabiliza qualquer Estado e as famílias”.
“Hoje, a Guiné-Bissau vive cíclicas crises políticas e de instabilidades governativas por causa do tráfico de drogas”, indicou e disse que a Guiné-Bissau voltou mais uma vez à rota do que aconteceu de 2005 a 2009.
O ativista frisou que a denúncia do antigo Primeiro-ministro, Nuno Gomes Nabian, não “é à toa”, porque enquanto político teve cuidado de observar o risco e o perigo em que o país estava e está à beira de enfrentar e é óbvio que existe neste momento grande quantidade de droga na Guiné-Bissau, o que pode levar o país a várias situações, nomeadamente ao agravamento da instabilidade política que os guineenses vivem, a assassinatos de figuras do topo do Estado, bem como de elementos da pirâmide das forças de defesa e segurança e de traficantes de drogas que a cada dia lutam para controlar a hegemonia do tráfico de drogas.
“Um país onde a droga circula em grandes quantidades é sujeito a enfrentar vários problemas como assassinatos, violências, criminalidades, a delinquência, o aumento de doenças sexualmente transmissíveis, a desestruturação familiar e perturbações sociais um conjunto de fenómenos que muitas vezes um Estado não consegue suportar. Por isso é preciso que as autoridades políticas encarem o combate ao tráfico de drogas como um problema sério”, defendeu, sublinhando que o tráfico e o consumo de drogas são um cancro que hoje todo o mundo enfrenta e que deve ser banido da sociedade.
Defendeu que para combater esse cancro, é preciso a junção de esforços, um trabalho em sinergias de todos os atores sociais envolvidos no combate ao tráfico de drogas, contando sempre com o apoio das autoridades, organizações de sociedade civil, poder tradicional, de imames, padres, pastores, dos pais e encarregados de educação, dos professores, das famílias e da sociedade em geral.
O Secretário-executivo do Observatório Guineense da Droga e da Toxicodependência reconheceu que o Estado sozinho não será capaz de combater o tráfico e o consumo de drogas. Depois apelou que é preciso denunciar os traficantes para que a Polícia Judiciária possa tomar controlo da situação e estancar o fenómeno, porque “a imagem do país está cada vez a afundar-se no poço”.
“Até apresentar o passaporte da Guiné-Bissau nos aeroportos internacionais dá vergonha, porque é visto logo como um traficante de droga. Não estamos a construir uma imagem positiva para os guineenses”, disse, para de seguida denunciar que a droga que circula ou passa pelo Senegal, Guiné-Conacri, Cabo Verde não se compara com a da Guiné-Bissau, apenas há falta de seriedade e da vontade das autoridades.
Notou que as autoridades guineenses, ao invés de combater o tráfico de drogas, promovem e incentivam o tráfico, bem como colaboram com os traficantes para introduzir a droga no país.
“No período de 2005 a 2009, os barões de drogas em conluio com as autoridades, permitiram a aterragem de um jato com grande quantidade de droga em Amedalai, setor de Mansoa, sob um aparato de elementos das forças de defesa. Em Bubaque, aconteceu a mesma coisa. A população e os alunos foram retirados das suas casas e das escolas para descarregarem medicamentos, afinal era droga. As pessoas usam o nome do Estado para traficar ou facilitar a entrada da droga no país”, informou, defendendo que é preciso responsabilizar as pessoas pelos seus atos e traduzir os traficantes à justiça, para acabar com a impunidade.
Para o ativista, o combate à droga deve ser um trabalho coordenado entre as autoridades nacionais e a UNODC. Assim, é preciso capacitar os recursos humanos, reforçar a capacidade institucional do Estado, apoiar a Guiné-Bissau na atualização das leis e outros instrumentos indispensáveis, na construção de infraestruturas, prisões de alta segurança, investimento sério em materiais e equipamentos para permitir à Polícia Judiciária e outras entidades desenvolverem as suas atividades no combate a este fenómeno.
O ativista disse que encara a denúncia do ex-Primeiro-ministro, Nuno Gomes Nabian, sobre existência de muita droga em circulação no país em três vertentes: política, económica e social, tendo lembrado que o seu partido faz parte do governo de iniciativa presidencial liderado por Rui Duarte Barros, razão pela qual a sua denúncia é suscetível, do ponto de vista política, de provocar uma ruptura entre a APU-PDGB e o governo e a figura do Presidente da República.
“Do ponto de vista económico tem grande impacto. Um país onde circula grande quantidade de droga, aumenta o branqueamento de capitais de forma muito assustadora, leva a circulação de dinheiro ilícito, inflacionando a economia. Cria uma enorme desestruturação financeira, por ser um dinheiro de proveniência duvidosa ou ilícita que é introduzido na economia formal para manipular o mercado. Os traficantes compram juízes, políticos, autoridades, elementos de força de defesa e segurança com esse dinheiro. Criam empresas fictícias para continuar a realizar as suas atividades”, afirmou, indicando que do ponto de vista social a droga aumenta a criminalidade num país, violência física, psicológica, delinquência juvenil, aumenta problemas mentais e os jovens acabam por ser asvítimas e os reféns dos efeitos do tráfico e consumo de drogas.
Disse que a Guiné-Bissau tem sido apelidada de narcoestado, porque ao que tudo indica os elementos de forças de defesa e segurança e os políticos têm estado envolvidos no tráfico de drogas, facilitando os praticantes nas suas atividades ilícitas.
Mestre Abílio Có apontou a Operação “Navarra” como um dos exemplos, onde o mundo e a comunidade aplaudiram a Guiné-Bissau depois daquela grande apreensão de quase duas toneladas de droga, que “um juiz defraudou com uma decisão ignóbil por causa do seu interesse pessoal” e colocou em risco vidas de muitas pessoas envolvidas neste processo, sobretudo elementos da Polícia Judiciária, juízes que tinham o processo destes traficantes e a própria imprensa que teve um papel importante na operação.
“O juiz ilibou dois cabecilhas de tráfico de drogas, Braima Seidi Bá e o colombiano Ricardo Ariza Monges. Essa atitude coloca em risco todos os que trabalharam neste processo e revela como as autoridades políticas e militares estão envolvidas no tráfico de drogas enquanto os traficantes. Este tipo de comportamento ignóbil belisca a imagem do país na sub-região e no contexto internacional”, disse, apontando que para combater o tráfico de drogas na Guiné-Bissau, será necessário encontrar respostas conjuntas, envolvendo os ministérios da Justiça, da Defesa e do Interior em consonância com os países vizinhos, o Senegal e a Guiné-Conacri, sobretudo na competente de partilha de informações, na capacitação dos recursos humanos, construção de prisões de segurança máxima, atualização das leis sobre o tráfico de drogas, que “ estão em caducidade.
O Secretário-executivo do Observatório Guineense da Droga e da Toxicodependência disse que a corrupção que se regista dentro do sistema judiciário guineense, nos elementos das forças de defesa e segurança não tem ajudado a Guiné-Bissau.Muito pelo contrário, tem prejudicado o país e minado os esforços de todos os que dia a dia lutam para combater este fenómeno, sublinhando que é imperativo começar a pensar nas futuras gerações, sobretudo na implementação de medidas rigorosas contra os traficantes de drogas, caso contrário, no futuro o país poderá ser dirigido por traficantes de drogas.
“Assistimos várias vezes o dinheiro do tráfico de drogas a financiar campanhas de eleições legislativas e presidenciais na Guiné-Bissau, desde 2005. Os traficantes continuam a financiar partidos políticos, candidatos a deputado da nação e às eleições presidenciais com dinheiro de origem duvidosa. Os apoios de traficantes acabam por destruir o país, cuja principal vítima é a juventude, a força motriz do nosso país. Em 2005, o dinheiro de origem duvidosa da criminalidade organizada financiou a eleição de um dos candidatos neste país e como consequência houve assassinatos e uma série de ondas de criminalidade. É preciso que as nossas autoridades políticas e governamentais, juízes, elementos das forças de defesa e segurança pensem na geração futura e que tipo de futuro querem para este país”, criticou.
Alertou, neste particular, que se medidas seguras não forem tomadas, a Guiné-Bissau poderá tonar-se um dia num Faroeste ou Babilônia, onde os traficantes serão dirigentes, porque “sentem-se à vontade, um paraíso para desenvolverem as suas atividades ilícitas, sem pressão das autoridades”.
Por: Redação
Democrata/boletim OGDT