Opinião: EMPREENDEDORISMO OESTE AFRICANO – UMA ABORDAGEM HISTÓRICA 

A literatura sobre o desenvolvimento económico trata da questão dos empreendedores de maneira heterogénea. Sob a forte influência do economista austríaco, Joseph Schumpeter, os primeiros estudos sobre as economias do desenvolvimento relegaram a empresa ao estatuto de quarto fator de produção, a par da Terra, Mão-de-obra e Capital. Durante os anos (1950) e (1960) do Século XX, grandes esforços foram feitos para tentar imprimir o espírito de empreendedorismo nos agentes económicos nos países do (terceiro mundo), ou (subdesenvolvido), esta segunda expressão mais em voga ultimamente, promovendo-o como “uma necessidade de cumprimento” nas sociedades “tradicionais” onde se interrogou sobre quais seriam as instituições que apoiariam uma nova geração de inventores e criadores de riqueza. 

No entanto, o interesse dos estudiosos sobre a matéria do empreendedorismo, em áfrica, desmaiou-se durante os anos (1970) e (1980), enquanto a atenção levantava-se sobre políticas do desenvolvimento dirigido pelo Estado, ou seja, ao modelo centralizado (planificado) da economia com influência do Estado, e sobre as perguntas de política macroeconómica, porém a temática do empreendedorismo reaparece no final da década 80, na sequência das pressões exercidas pelo Banco Mundial e FMI, no quadro do (Washington Consensus) e outros organismos financeiros internacionais para impor a disciplina do mercado aos Governos dos países em vias do desenvolvimento.

A doutrina “da obtenção do bom preço” implicaria que medidas incitantes em prol do lucro deviam fazer-se sentir em toda a economia. Em outros termos, as empresas privadas, em especial, e os pequenos e médios empresários (incluídas, desta vez, as mulheres e os jovens) deviam sair da sombra para ocuparem o centro da cena, o que poderia permitia-lhes ou não permanecer no Mercado, cada vez mais exigente.

Os especialistas em história económica, que trabalham em África e noutras regiões do mundo não desenvolvido (terceiro mundo) são fortemente influenciados pelas tendências da literatura sobre o (desenvolvimento), inclusive eu, pessoalmente, sou crente desta corrente, embora esta não seja, e de longe, a sua única fonte de inspiração. 

Nos anos 60, quando a história económica da África começou a impor-se como assunto de investigação, prestou-se uma grande atenção ao tema da iniciativa africana, vista como um meio para escapar do (jugo colonial), e colocou-se a tónica sobre os estudos do Comércio e no período pré-colonial.

O interesse por este assunto esbateu-se durante os anos (1970): sob a influência de Nova Esquerda (New Left), no momento em que os historiadores eram menos propensos a incentivar ou mesmo a estudar a subida de uma burguesia, e preferiam descobrir as origens de uma classe operária. 

Entretanto, nos últimos anos, há certos sinais que demonstram um renascimento da história da empresa: o interesse de escrever a história “pela parte inferior” estendeu-se para além da “classe operária” e passou a englobar as – PME – Pequenas e Médias Empresas “l’histoire de genres” a favor dos estudos sobre (mulheres) chefes de empresa.

Além disso, a reação contra o estudo da história colonial que, por razões compreensíveis, dominou os anos 1960, agora pertence ao passado, de modo que os trabalhos mais recentes têm recomeçado a investir em pleno século XXI. 

Desta feita, com destaque para o papel da (mulher) ao dinamismo económico do continente africano, no geral, e em países pequenos como a Guiné-Bissau.

O breve período de colonização direta, no último quartel do século XIX aos anos 60 do século XX, é objeto de uma síntese vigorosa e esclarecedora que enquadra a experiência das independências que se segue a partir de 1960. 

Estas independências assinalam, por sua vez, a passagem de um contexto de relações bilaterais (colónia-metrópole) a um outro período, mais alargado, de ralações multilaterais no qual os nacionalismos africanos procuram – com algum romantismo – construir e consolidar espaços próprios.

Todavia, o peso do capital estrangeiro manteve-se dominante, e se a administração colonial cedeu lugar ao Estado pós-colonial, a passagem de uma economia de (subsistência) a uma economia (moderna) revelou-se uma realização difícil e contraditória, na justa medida em que refletia tensões e ruturas próprias de sociedades economicamente (pouco diversificadas), na confluência de heterogeneidades (política, social, linguística ou étnica) cuja força centrífuga dificultava dramaticamente a adoção de um figurino de Estado que se ajustasse às necessidades dos nossos países. 

A adoção do modelo de partido-único pela quase totalidade dos países africanos, que procurou dar resposta a tais contradições, revelou-se infrutífera. Deste modo, o modelo pós-colonial esgotou-se progressivamente. 

E se a (economia do endividamento) dos anos 70 retardou a crise, foi apenas para acentuá-la ainda mais no longo prazo. Desde então, a economia africana tem vindo a ser submetida a profundas transformações institucionais, caraterizadas pela erosão ou mutação dos poderes das (estruturas), dos órgãos centrais de decisão e das instâncias de negociação e compromisso.

A privatização, que implica a retirada do Estado da esfera produtiva, é acompanhada por transferências de soberania, tanto ao nível infranacional (descentralização) como supranacional (papel crescente das instituições de Bretton Woods – i.e., FMI e Banco Mundial). 

As associações, as ONG, as cooperativas, a economia popular (lumos e feras) bem como outros intervenientes da “sociedade civil”, desempenham um papel crescente como produtores de bens e serviços coletivos. Não obstante, daí resultar menos a constituição de uma economia de mercado stricto sensu do que uma recomposição de economias que permanecem “rendeiras” tanto nas suas relações externas, como no seu funcionamento interno.

Para o compreender, é necessário efetuar cortes transversais num processo de crescimento que, tendo em conta heranças históricas, é revelador dos bloqueios na acumulação. Outro fator de bloqueio relaciona-se com as sucessivas disfunções financeiras: financiamento de empresas públicas deficitárias em detrimento de iniciativas privadas empreendedoras, banca “exclusivamente” virada para o setor (moderno) e (urbano) numa lógica de curto prazo, créditos malparados, excessivas despesas militares, défices no orçamento de Estado. 

Acrescentam-se ainda os constantes desequilíbrios setoriais: agricultura alimentar tradicional onde predomina o autoconsumo; culturas de exportações submetidas a fortes flutuações dos preços internacionais, mal-enquadradas institucionalmente e estranguladas pelas margens de comercialização ou pela fiscalidade, fazem com que a fraca produtividade da agricultura tenha repercussões diretas sobre toda a economia.

Por conseguinte, para lá dos modismos do nosso tempo (atual) o empreendedorismo (nosso) deve ser baseada e inspirada nas nossas endógenas (fatores internos) tendo em conta as especificidades das nossas economias, ainda estruturalmente dependentes e pouca diversificada.

Apenas uma opinião! 

Por: Santos Fernandes 

Fonte: Créditos, empreendedorismo & desenvolvimento: uma equação possível (2013). INACEP, Bissau.

Bissau, 1 de Setembro de 2024.

Author: O DEMOCRATA

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