A luta armada na Guiné ficou registada como um caso de estudo, por quatro motivos. Primeiro, o insignificante número da população que habitava o pequeno território. Segundo, o analfabetismo quase na barra de 100%. Terceiro, a complexidade do mosaico cultural deste povo com cerca de duas dezenas de grupos étnicos. Quarto, o projeto binacional (Guiné e Cabo Verde). A via armada, tida como mais assertiva e adequada resposta à intransigência cega do regime colonial português, não fora uma opção gratuita dentro da realidade do território e da sua população. Era imperativa uma visão prumada da realidade local e um conhecimento profundo das relações internacionais num contexto da plena guerra fria entre o Ocidente liderado pelos EUA (de que Portugal fazia parte) e o bloco do Oeste sob o comando da URSS.
Cabral reunia os dois requisitos. O homem tinha a preparação. Agrónomo com caderneta de antropólogo e barkafon de Lantedan. Mas também um perito de calibre em relações internacionais. Um diplomata cuja habilidade suscitava admiração e curiosidades nos prestigiosos palcos de encontros internacionais conforme a imprensa internacional não para de fazer manchetes. Falava várias línguas internacionais. Tinha cabeça dura. Tinha sonhos, tinha um horizonte.
Em face dessa realidade, Cabral sabia motivar homens, sabia fazer sorrir as belas e pretas mulheres da nossa terra, sabia incentivar a juventude e sabia cativar os Homis Garandis das verdes tabancas da Guiné. Ele era um vendedor de Sonhos, talvez por isso o escritor angolano Antonio Tomás não hesitou em o apelidar de fazedor das utopias! O título da sua obra. Onde estaria a fronteira entre utopias e ilusões?
Não. Cabral não era um ilusionista. Era sim um afirmado vendedor de sonhos.
Aliás, pegar em armas contra a feroz dominação colonial só podia ser a obra de um homem de ação um homem pragmático, que acreditava igualmente no poder das ideias. “Pensar para melhor agir, agir para melhor pensar”, afirmava com insistência..
A luta armada que o próprio Cabral definia como um ato da cultura, tinha como objectivo principal derrotar e expulsar os ocupantes imperialistas portugueses dos territórios da Guiné e Cabo Verde e tinha como missão última, a independência total! Cabral e seus companheiros não eram ingénuos para acreditava na facilidade do processo. Eram homens e mulheres que acreditavam na causa da total independência numa África livre do jugo colonial, como profetizava igualmente o seu tutor e vizinho Kwame Nkrumah.
A dependência do presente é o fruto do desvio ideológico ao qual se sucumbiu a tripulação do navio. Sim, a finalidade era a independência total. A soberania popular!
Bissau, 3 de setembro de 2024
Por: Armando Lona