Em primeira mão, permitam-me realçar que, volvidos alguns dias após a realização do “Simpósio Internacional Amílcar Cabral – Património Nacional e Universal”, que se assinalou nos dias (9, 10, 11 e 12 de setembro de 2024), entre as cidades de Bissau e da Praia, onde se debateram variadíssimos temas da atualidade, quer do ponto de vista científico, quer do ponto de vista social e/ou político.
Um pouco por todo canto do Planeta Terra ecoaram vozes em apologia as contribuições cabralistas no Século XX, fazendo jus ao perfil do Homem – Amílcar Cabral – que “quis viver a sua época e saldar a sua dívida para com o seu povo, um simples cidadão africano”, um insubmisso nato que ainda com a tenra idade, em Cabo Verde, vivenciou os efeitos da fome que ceifou a vida de milhares de Cabo-verdianos, talvez fosse esse fenómeno que tivesse contribuído e precipitado a escolha do curso e da profissão que viria a fazer mais tarde, já na década de 1950.
Nos últimos 44 anos, na Guiné-Bissau, raras vezes houve temas com os quais tivéssemos os “mínimos consensos”, entretanto, parece-me que Cabral conseguiu a proeza de “unir e juntar” pessoas e instituições outrora desavindas, medidas certas proporções, penso que ele continua sendo Universal efetivamente.
Contudo, voltando ao tema principal deste artigo, creio que quando o assunto acessório vai prevalecendo, em detrimento do assunto coletivo (ki ku nô djunta) revela, em grande medida, que algo está mal.
Desde logo, porque reza a história que o ambiente pós-guerra (1939-1945), em que o crescimento económico constituía a preocupação central da política económica dos países industrializados e se tinha transformado num projeto de estudo central da teoria económica. A preocupação principal passou a ser a procura de encontrar caminhos para uma mais rápida aproximação entre os padrões de vida de sociedades tão diferentes, i.e., desenvolvidos e/ou não desenvolvidos.
As mudanças estruturais estão associadas ao processo de industrialização, de que resulta a transformação estrutural e tecnológica da produção e progressiva transferência de recursos do sector primário para o secundário.
Assumindo a industrialização como o motor da modernização e considerando todos os problemas associados à imperfeição e insuficiência dos mercados, o problema para o processo de desenvolvimento económico passou a ser a formação de capital, em outros termos, tem que ver com a infraestruturação dos países. É exatamente a formação de capital, um dos centros do problema do desenvolvimento nos países economicamente atrasados, i.e., Guiné-Bissau.
As teorias de modernização surgem nos anos 50, período em que os Estados Unidos emergem como potência mundial ao assumir o comando do Plano Marshall de reconstrução da Europa fragilizada e saída da Segunda Guerra mundial.
Nos anos 50/60 surge o conceito de “institution building” que focava a criação ou expansão de instituições públicas e as habilidades técnicas necessárias para operacionalizar nos países em desenvolvimento.
Nos anos 70/80, o conceito do desenvolvimentosurge associado às pessoas (Capital Humano) dando importância a outras dimensões sociais a par das dimensões económicas, como saúde, educação, população e ambiente à jusante e à montante.
Nos finais dos anos 80, com base em experiências práticas de ajuda ao desenvolvimento, surge um novo conceito de capacidade de desenvolvimento “development capacity” visto como complementar nas últimas quatro décadas.
Em África e na Guiné-Bissau em concreto, o processo do desenvolvimento (estradas, energia, comida, escola, saúde, locomoção, água, entre outros) devia ser motivo de debate permanente para que os nossos decisores possam delinear e encontrar caminhos de desenvolvimento.
Infelizmente, os nossos decisores políticos ainda teimam em debates relacionados à agenda meramente pessoal e de grupos de interesses desavindos, em detrimento da economia real e do desenvolvimento, relacionados com aquilo que Cabral chamava de aposta em “Forças Produtivas” marxianas, na justa medida em que me parece a mim, que, teimosamente, continuamos a debater e a privilegiar debates sobre futilidades e de cultos de personalidades, “ad eternum”.
Segundo (JAU, 2018), a par da esmagadora maioria de países, a Guiné-Bissau instituiu, ainda na segunda metade dos anos 1970, uma matriz económica “socialista”, na qual havia enorme intervenção do Estado na economia, pois era o Estado o único agente económico propriamente digno deste nome.
Durante a década de 1970, a Guiné-Bissau dispunha de uma estrutura económica planificada e centralizada à figura do Estado, ou seja, uma economia desprovida de uma classe empresarial forte à altura dos desafios empreendedorismo privado e que pudesse dar corpo e impulsionar a economia nacional.
No ano 1980, houve uma mudança de regime político, em que se verificou a alteração da liderança no Estado-partido, através do golpe de Estado. Contudo, essa mudança não produziu efeitos significativos, a curto prazo. Também, a mesma década ficou marcada por algumas reformas estruturais, tanto a nível (política), (legislativa) e bem como (económica), culminando com uma série de negociações com as instituições de Bretton Woods – FMI e Banco Mundial – no âmbito do Programa de Ajustamento Estrutural, destinado a países recém-independentes e que apresentavam significativos défices orçamentais e desequilíbrios em relação às dívidas públicas, por estas apresentarem fora das suas capacidades de gestão e de arrecadação de receitas fiscais (Fernandes, 2013).
Na segunda metade da década de 80, as negociações entre o Estado com e o FMI e Banco Mundial culminaram com a institucionalização da liberalização da atividade económica, consagrada na Constituição da República de 1996 em seu artigo 11º, em que se instituiu a economia do mercado, atendendo aos desafios que o país havia de enfrentar.
Deste modo, era expectável que o setor privado guineense contribuísse para o crescimento económico e o aumento do consumo privado das famílias e das empresas/PIB.
A partir da década 2000, a castanha de caju consolidou-se como o produto estratégico de exportação, atingindo volumes de 200 mil Ton/ano, sendo a Índia o principal mercado, que chega a absorver aproximadamente 90% desse produto.
Portanto, penso que os nossos decisores públicos faziam-nos enorme favor se se concentrassem suas energias no debate e implementação de políticas públicas baseadas na promoção do desenvolvimento, em todas as suas vertentes. Por conseguinte, este debate sim – é necessário.
Apenas uma opinião!
Santos Fernandes
Lisboa, 30 de maio de 2021 atualizado em setembro de 2024