Os eleitores senegaleses foram às urnas ontem para, num universo de quatro dezenas de listas de partidos e coligações, escolher os deputados. As primeiras tendências dos resultados indicavam, ontem a noite, para uma folgada vitória dos Patriotas Africanos do Senegal para Trabalho, Ética e Fraternidade (PASTEF), assegurando a barra de uma maioria qualificada no hemiciclo composto por 165 deputados!
Enquanto o escrutínio de 17 de novembro era vital para o futuro do sistema democrático senegalês, o ato era sobretudo um real teste para o partido no poder desde Abril último com a vitória retumbante na primeira volta do Baciro Diomaye Faye. A taxa de participação que rondou pouco acima de 50%, confirmou o entusiasmo do povo senegalês no ato eleitoral que habitualmente atrai menos do que os pleitos presidenciais.
Dessas eleições, eis algumas ilações possíveis:
(1) – A larga vitória dos PASTEF liderados por Ousmane Sonko confirma o vínculo indefetível do povo senegalês para com este partido que desde a sua criação em janeiro de 2014 defendeu a rutura com o sistema instalado há décadas sob tutela do antigo “patrão” colonial, França. Apesar do deserto de obstáculos, repressões, prisões arbitrárias, dissolução ilegal em 2023, os PASTEF não mudaram a sua visão ideológica e política, a rutura com o status quo. O plebiscito de ontem é uma carta branca para enterrar o sistema que foi atingido mortalmente nas presidenciais de março último. A vitória esmagadora dos PASTEF é sobretudo uma mensagem clara sobre a urgência de mudança profunda no modo de fazer e de estar na política. O povo quer mudança de verdade, o povo quer soberania económica e demonstrou novamente a sua determinação.
(2 )- Ao decidir concorrer sozinhos nestas eleições , descartando os esquemas de coligação, PASTEF tinham a noção do apoio popular de que beneficiam neste momento e não podiam dar margem para jogos (negociatas) que num futuro muito próximo teriam uma fatura a pagar. Confiantes nos compromissos e leais aos ideais de servir o Senegal, os PASTEF receberam as chaves para governar, reformar e transformar o Senegal. É este o contrato social celebrado nas eleições presidenciais e selado nas legislativas antecipadas de ontem. Os desafios são enormes, difíceis mas não são impossíveis!
(3) – A pesada derrota das coligações lideradas pelas figuras dos antigos regimes, nomeadamente a coligação Takku Walludirigida pelo antigo Presidente da República, Macky Sall, em sinergia com Karim Wade, a coligação Jam Ak Njarin de Amadou Bâ, antigo primeiro-ministro, Salmm Sá Kaddu de Barthélémy Dias, atual presidente da Câmara de Dakar, Barthélémy Dias é, sem sombra de dúvidas, um cartão vermelho, o fim de uma era! Barthélémy, Amadou perderam nas mesas onde votaram! Na política isso tem um nome: desaprovação!
Os resultados indicam claramente que essas coligações sancionadas não poderão separadamente constituir grupos parlamentares que, em conformidade com a lei, são precisos 13 deputados. Os PASTEF arrebataram os 15 deputados da diáspora, asseguram a vitória quase em todas as 42 circunscrições departamentais que elegem 112 mandatos em votação maioritária simples. Os restantes mandatos (53 assentos), serão validados numa repartição proporcional, isto é os votos recolhidos por cada coligação serão divididos por um coeficiente eleitoral, e com isso, os 53 serão repartidos para PASTEF de Ousmane Sonko, Takku Wallu de Macky Sall, Samm Sá Kaddu de Barthélémy Dias e Jam aí Njarin de Amadou Bâ.
Na impossibilidade de se constituir bancadas parlamentares, todo o xadrez político legislativo será sob domínio dos PASTEF durante 5 anos!
(4) – O voto do povo senegalês é sobretudo o fim da carreira política de uma geração de políticos de que fazem parte Khalifa Sall, Macky Sall, Idrissa Seck e até Barthélémy Dias (embora ainda jovem) cujo posicionamento nos últimos tempos foram considerados de oportunistas despidos de lealdade política. Com essa tremenda derrota, Dias está em maus lençóis, o seu mandato na Câmara de Dakar em leilão e o grande dilema é como poderá continuar a dirigir uma cidade que já o desaprovou!?
A carreira política de Barthélémy Dias, filho de Jean Paul Dias, uma conhecida figura política no Senegal de origens Cabo verdianas, terá ventos complicados nos próximos tempos. Os resultados da eleição de ontem vão ditar a obrigatória renovação da classe política no Senegal.
(5) – A escolha dos eleitores senegaleses ontem confirmou claramente que as contestações que sacudiram este país vizinho nos últimos 4 anos são sinais de um processo revolucionário que só uma abordagem objetiva e honesta permite reconhecer, estudar e compreender. Essa ebulição popular não é aleatória, é sim parte de aspirações profundas dos povos senegalês e africano em provocar mudanças substanciais nas condições de vida.
Ousmane Sonko e seus companheiros não são extra terrestres nem são perfeitos, são simples cidadãos africanos que tomaram o tempo de escutar o povo e saldar o seu kinhon com o povo!
É preciso ouvir para compreender e não ouvir para responder, como dizia alguém! É preciso sobretudo tomar tempo para ouvir os ventos!
Por: Armando Lona N’nhinda
Jornalista/Docente