Editorial: QUE FIGURA A GUINÉ-BISSAU PRECISA NO ATUAL CONTEXTO POLÍTICO?

A Guiné-Bissau tem vivido, desde a abertura democrática, um ciclo de instabilidade política que tem comprometido o desenvolvimento socioeconómico do país. A luta pelo poder entre os atores políticos não tem como ponto de partida a discussão de ideias ou projetos de desenvolvimento, mas sim pelo controle de recursos públicos e pela manutenção de privilégios de um grupo de políticos que têm prosperado à custa das constantes instabilidades político-governativas. É urgente que os cidadãos eleitores pensem em alternativas que possam romper o ciclo vicioso institucionalizado no país. Um ciclo que premeia a corrupção, o nepotismo e o clientelismo político.

Não é menos verdade que, de 2000 a essa parte, a Guiné-Bissau tornou-se refém de uma governação centrada no benefício de um grupo de políticos e empresários disfarçados em políticos, que se mostra cada vez mais distante dos reais interesses da população guineense. Os factos irrefutáveis estão a olhos nus: os setores da educação e da saúde, infraestruturas e agricultura estão abandonados e sem políticas públicas sustentáveis que os impulsionem.

A permanência dos atuais protagonistas, sejam eles do poder ou da oposição, representa o endurecer das disputas políticas e manobras dos bastidores, nos próximos cinco anos, porque, muitos dos chamados “novos- ricos”, que as constantes instabilidades ajudaram a criar, não têm qualquer interesse nas mudanças reais. E estes, certamente, vão continuar a alimentar conflitos, seja ao lado de um futuro presidente da República, seja buscando o apoio dentro da classe castrense, porque o seu único objetivo é perpetuar um sistema que lhes garanta riqueza e influência.

Na minha opinião, é imperativo que surja uma figura isenta de querelas político- partidárias, uma personalidade independente e respeitada acadêmica e cientificamente, que possa assumir o papel de árbitro institucional e garante da Constituição da República da Guiné-Bissau, com a missão de promover a estabilidade política necessária para que o próximo governo saído das eleições legislativas possa cumprir o seu mandato de quatro anos, sem interrupções forçadas ou golpes palacianos.

As figuras intelectuais da Guiné-Bissau, homens e mulheres de reconhecida idoneidade, com experiência em governação, desenvolvimento e uma visão pan-africanista sólida devem equacionar seriamente as suas entradas na vida política ativa, não como representantes de partidos, mas como alternativas credíveis e independentes. O país precisa de líderes académicos, com competências comprovadas, que não estejam comprometidos com os arranjos partidários que, historicamente, apenas serviram para minar qualquer tentativa de reconciliação nacional e de implementação de uma agenda fundada em horizontes de desenvolvimento sustentável.

Dir-me-ão que não é possível encontrar essas figuras. Existem sim, em diferentes instituições internacionais e nas Universidades nacionais e mundiais, talvez não queiram ainda fazer a política partidária, porque entendem que os eleitores não vão votar no projeto deles. Quem diria que Marcelo Rebelo de Sousa iria ser o Presidente de Portugal? Bassirou Diomaye Diakhar Faye iria ser Presidente do Senegal? Responde quem lê!

As próximas eleições legislativas e presidenciais só serão válidas se o país for capaz de apresentar uma candidatura extra-partidária, que rompa com o ciclo de promessas vazias e de acordos políticos nocivos à nação. É tempo de os eleitores darem oportunidade a novas figuras, porque o povo merece respirar e renovar a esperança num futuro melhor.

Outrossim, é urgente que os eleitores sigam os exemplos inspiradores, como os de Cabo Verde, Senegal ou mesmo Portugal, onde o mérito, o conhecimento técnico e a ética pública têm guiado boas práticas de governação.

Chegou o momento de os cidadãos eleitores ousarem mudar. E essa mudança só será possível com a coragem, visão e compromisso verdadeiro com o povo, não com os jogos de poder e de manobras de bastidores para perpetuar a instabilidade político- governativa na Guiné-Bissau.

Por: Tiago Seide

Professor e Jornalista

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